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sábado, 31 de janeiro de 2015

Em dez anos, Brasil perde 217 bilhões de dólares em fuga de capital ilícito




Olá alunos,

Novecentos e noventa e um bilhões de dólares saíram de países em desenvolvimento somente no ano de 2012 por meio de crimes envolvendo corrupção. A postagem de hoje analisa os fatores que permitem a ocorrencia desse tipo de crime e possíveis artifícios para impedi-los.

Esperamos que gostem e participem.

Fellype Fagundes e Carlos Araújo
Monitores da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense


Entre 2003 e 2012, expatriação de divisas oriundas de corrupção, fraude e outros crimes equivale a 10% do PIB nacional. Leis são rígidas, mas execução é dificultada pela morosidade da Justiça, dizem especialistas.

Um relatório divulgado nesta segunda-feira (15/12) pelo instituto Global Financial Integrity (GFI) afirma que 217 bilhões de dólares saíram do Brasil, oriundos de crimes como corrupção, fraude, lavagem de dinheiro e evasão de divisas no período entre 2003 e 2012. O valor corresponde a cerca de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) anual do país.

O resultado coloca o Brasil na sétima posição se for considerado o total de capital ilegal expatriado entre 2003 e 2012. China (1,25 trilhões de dólares), Rússia (973 bilhões), México (514 bilhões) e Índia (439 bilhões) são os primeiros colocados no ranking elaborado pelo instituto sediado em Washington, nos EUA. Em 2012, o Brasil ficou na oitava posição, com cerca de 34 bilhões de dólares.

"Os fluxos ilícitos são, em parte, relacionados com o valor do PIB. Como o país é a sétima economia mundial, quanto maior for ela, maior será a capacidade de gerar fundos ilícitos", comenta Dev Kar, economista-chefe do GFI. "O tamanho da economia informal do país, estimada entre 2010 e 2012 em 21,79% do PIB, também influencia. Quanto maior a economia paralela, maior é a capacidade de financiar fluxos ilícitos."

Para Gilberto Braga, professor de finanças do Ibmec/RJ, a má posição do Brasil é explicada por uma combinação de dois fatores. O primeiro é a alta carga tributária interna, que faz com que muitos empresários busquem a evasão fiscal e a retirada de recursos do Brasil para países de menor tributação. O segundo é a corrupção e a consequente necessidade de esconder recursos em paraísos fiscais, que normalmente oferecerem anonimato e tributação mais baixa.

"Existem mecanismo legais e fiscalizatórios, como, por exemplo, que as transações acima de 10 mil reais sejam justificadas e passíveis de monitoramento pelas autoridades. Há também a exigência de que qualquer transação considerada suspeita seja alertada à fiscalização pelos bancos", afirma Braga. "Mesmo com essas ferramentas, a capacidade de impedir a fuga de recursos é considerada baixa."

Lentidão da Justiça brasileira

O estudo mostra ainda que 991,2 bilhões de dólares saíram de países em desenvolvimento somente no ano de 2012 por meio de crimes envolvendo corrupção. No período entre 2003 e 2012, 6,6 trilhões de dólares que foram expatriados.

O relatório mostra bons exemplos do Reino Unido e da Dinamarca, com a criação de um registro público com os beneficiários de contas e depósitos bancários.

De acordo com o promotor Silvio Marques, do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP), as leis brasileiras são rígidas e contemplam vários crimes cometidos contra os cofres públicos. As leis de natureza civil podem levar à recuperação de ativos, como a Lei de Improbidade Administrativa (8.429/1992).

"Essa lei é uma referência no mundo. Todavia, a execução dela é dificultada pela morosidade da Justiça, que não consegue julgar rapidamente todos os processos. Isso se deve aos procedimentos, que são complexos e permitem todo o tipo de manobra jurídica", explica Marques. "Infelizmente não vejo nenhuma iniciativa do governo ou do Congresso para resolver o problema. O resultado desse quadro é a impunidade."

O promotor – cuja promotoria fechou neste ano um acordo com o Deutsche Bank para pagar uma indenização pela movimentação de dinheiro desviado de obras públicas durante a gestão do ex-prefeito Paulo Maluf, entre 1993 e 1996, num paraíso fiscal – cita que deveria haver uma total reformulação do processo penal e civil para que o Poder Judiciário possa julgar rapidamente os crimes praticados contra o patrimônio público.

"Deveria haver também modificações na cooperação jurídica internacional para que os pedidos dos países signatários das convenções possam ser cumpridos rapidamente", explica Marques. "Atualmente, apenas o sistema de assistência judiciária da União Europeia pode ser considerado moderno e eficaz."

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sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Por que seus custos parecem ter subido mais que a inflação oficial?




Olá alunos,

A alta da inflação acumulada nos últimos 12 meses é de 6,56%, o que preocupa, segundo economistas, porque ultrapassa o teto da meta de inflação definida pelo Banco Central - de 6,5%, porém o Brasil ainda está longe do descontrole vivido nos anos 80 e 90, quando se chegou a uma inflação de três dígitos. A postagem de hoje analisa os motivos da alta na inflação e seu impacto no cotidiano brasileiro.

Esperamos que gostem e participem.

Fellype Fagundes e Carlos Araújo
Monitores da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense




O restaurante por quilo da esquina aumentou seu preço de R$ 30 para R$ 36 - ou seja: alta de 20%. A escola das crianças já enviou um e-mail informando que a mensalidade será 12% maior em 2015. E nos mercados, o preço da carne faz você repensar os planos para um churrasco com os amigos no fim do ano.
Já teve a impressão de que a inflação no seu cotidiano parece ainda maior do que indicam os índices oficiais?

Segundo dados do IBGE divulgados nesta sexta-feira, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) - principal indicador da inflação no país - subiu 0,51% em novembro. O índice representa uma aceleração em relação a inflação de outubro, de 0,42%, mas surpreende positivamente muitos analistas (na média eles esperavam variação de 0,55%, segundo a Agência Bloomberg).

A alta acumulada nos últimos 12 meses é de 6,56%, o que preocupa, segundo economistas, porque ultrapassa o teto da meta de inflação definida pelo Banco Central - de 6,5%. "Mas esperamos um desaquecimento do IPCA em dezembro, o que garantiria uma alta de 6,4%", diz Étore Sanchez, da LCA consultores.

Evidentemente, o Brasil ainda está a anos luz do descontrole vivido nos anos 80 e 90, quando se chegou a uma inflação de três dígitos. Mas, nas ruas, não é difícil notar que a inflação voltou a incomodar - e, para muitos, a alta de preços parece ser até maior do que mostram os índices oficiais.

"De fato há um descompasso (entre a percepção da inflação cotidiana e o índice oficial) que pode ser atribuído tanto à forma como gravamos a variação de preços na memória quanto a limites esperados no cálculo desses índices, que fazem com que a inflação experimentada por alguns indivíduos seja de fato mais alta", explica Paulo Picchetti, economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV)

Memória seletiva

Segundo Picchetti, parte da explicação para tal descompasso estaria ligada a um fenômeno econômico descrito pelo psicólogo Daniel Kahneman, ganhador do prêmio Nobel de Economia.

"As pessoas tendem a registrar mais e reter por mais tempo na memória os preços que subiram, mas não prestam muita atenção nos que caíram", diz o economista.

"Todo mundo ainda lembra que o quilo do tomate chegou a R$ 15 reais no ano passado, mas agora que baixou para R$ 5 ninguém nota", concorda André Chagas, coordenador do IPC, índice de inflação calculado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Fipe).

No caso do IPCA divulgado nesta sexta-feira, por exemplo, a aceleração foi puxada pelos alimentos e moradias, que subiram 0,77% e 0,69%, respectivamente - ou seja, são esses os preços que devem ter "revoltado" os consumidores no mês passado.

Só a carne teve alta de 3,46% em novembro - talvez seja uma sábia decisão adiar mesmo aquele churrasco. E esquecer o filé com fritas: a batata ficou quase 40% mais cara em novembro (embora acumule baixa no ano).

A gasolina teve um aumento de 1,99% e a energia elétrica ficou 1,67% mais cara. Por outro lado, os preços dos artigos de residência ficaram 0,04% mais baratos, possivelmente como uma consequência dos descontos da Black Friday, segundo explica Sanchez, fazendo a ressalva de que é possível que haja outras explicações para a queda.

"Provavelmente as altas de produtos como batata e limão, impulsionados pela estiagem, vão ser bastante lembrados pelos consumidores", acredita, Chagas, da Fipe.

"Mas será mais difícil ver alguém conversando sobre o impacto positivo da falta de chuvas no orçamento. Aqui em São Paulo, por exemplo, quem atingiu as metas de economia de água, está recebendo desconto."

Outro exemplo seria o item educação, que não aumentou muito nos índices do último mês (teve alta de 0,21% segundo o IPCA). "Os aumentos de mensalidade só entram no cálculo no início do ano", diz Chagas. "Mas como a maioria dos pais já foi comunicada sobre o aumento, ele já causa preocupação."

Inflação individual

O segundo fator que explica a diferença entre a inflação percebida no cotidiano e a dos índices é que, para muitos, as duas podem ser mesmo significativamente diferentes, segundo Picchetti e Chagas.

Acontece que os índices inflacionários são calculados com base em uma cesta de produtos montada pelos pesquisadores. Eles acompanham algumas famílias selecionadas durante um ano para entender sua composição de gastos e ponderam o peso de cada produto na cesta com base nessa avaliação.

No caso do IBGE, a pesquisa de preços é feita em regiões metropolitanas e as famílias pesquisadas têm uma renda de até 40 salários mínimos A ideia é que elas sejam "representativas" dos gastos dos brasileiros no geral, mas basta notar a diferença entre seu carrinho e a dos outros clientes de um supermecado para se entender que o método tem seus limites.

"É claro que o seu perfil de gastos pode ser bem diferente dos gastos desse conjunto de 'famílias representativas' usado para se fazer o índice", diz Picchetti.

Ou seja, é possível que sua percepção seja a de que os preços estão subindo mais por que, de fato, a sua "inflação individual" - ou os preços que mais interessam para você - estão subindo mais.

Uma alta muito grande do açúcar, por exemplo, pode ter um impacto pequeno na vida de uma família média, mas será um desastre para uma doceira. Famílias com casa própria evidentemente não são atingidas por aumentos do aluguel, embora eles tenham um impacto no índice oficial - só para mencionar alguns exemplos.

Picchetti explica que a "inflação de cada um" pode variar de acordo com uma série de fatores, que vão de classe social e idade até a região ou cidade em que cada um vive. Segundo o IPCA, por exemplo, a inflação de novembro foi de 0,03% em Vitória e 1,21% em Goiânia.

"Se você vive fora das regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE, a sua inflação pode ser diferente. É possível, por exemplo, que a tarifa de ônibus tenha aumentado mais em sua cidade ou que ela seja abastecida por um centro produtor de alimentos que sofreu mais com a seca", diz o economista da FGV.

Sanchez, da LCA consultores, acrescenta um terceiro fator que pode aumentar a diferença entre a inflação percebida por alguns indivíduos e a dos índices oficiais. "A cesta do IPCA tem algo entre 300 e 400 produtos, mas há uma defasagem na sua seleção", diz o economista.

"Até 2011, por exemplo, a cesta incluía o item fralda de pano, que ninguém mais usava, porque se baseava em uma pesquisa de orçamento familiar feita anos antes. Hoje, muitas famílias de classe média podem ter um tablet, mas o produto não está no índice."

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segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

"Insegurança jurídica afugenta investidores privados"


Olá alunos,

Na tentativa de reduzir os gargalos de infraestrutura que limitam o crescimento do pais o investimento do capital privado representa uma saída. A postagem de hoje analisa as barreiras enfrentadas pelos investidores privados.

Esperamos que gostem e participem.

Fellype Fagundes e Carlos Araújo
Monitores da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense

Para reduzir os gargalos de infraestrutura que limitam o crescimento nacional, não resta alternativa à presidenta Dilma Rousseff senão criar possibilidades para atrair o capital privado, destravar as concessões e aumentar os aportes públicos no setor. A tarefa é complexa. A falta de clareza no marco regulatório e o retorno financeiro dos projetos aquém do desejado pelas empresas têm afugentado os investidores. Não por acaso, a necessidade de garantir um ambiente de maior segurança jurídica e o equilíbrio dos contratos entre o poder público e o setor privado dominaram os debates do II Fórum Nacional de Direito e Infraestrutura, realizado nos dias 18 e 19 de novembro, em Brasília. O evento foi promovido pelo Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos da Infraestrutura (Ibeji), com o apoio do Conselho Federal da OAB e de CartaCapital.

“De um lado, temos um marco regulatório frágil, com leis pouco claras. De outro, na aplicação propriamente dita dessas leis, há diferentes atores envolvidos na fiscalização dos contratos, cada um deles com uma interpretação diferente da regra do jogo”, resume Rafael Valim, presidente do Ibeji e organizador do fórum. Na entrevista a seguir, o especialista fala sobre os principais desafios que o Brasil terá de superar para tornar os projetos de infraestrutura mais atrativos e seguros para o setor privado.

CartaCapital: O que motiva tanta insegurança nos investidores?Rafael Valim: O Brasil tem uma necessidade inadiável de investimentos em infraestrutura, mas há um ambiente de insegurança jurídica que têm afugentado os investidores privados. De um lado, temos um marco regulatório frágil, com leis pouco claras. De outro, na aplicação propriamente dita dessas leis, vemos diferentes atores envolvidos na fiscalização dos contratos, cada um deles com uma interpretação diferente da regra do jogo.

CC: O senhor se refere à atuação das diferentes instâncias de controle, como os Tribunais de Contas, órgãos de controle interno, Ministério Público e o próprio Judiciário?RV: Exatamente. Cada um vai ter uma interpretação distinta dessas leis. Em vez da crescente complexificação, devemos buscar mais coerência e eficiência do sistema de controle, cujo correto funcionamento é decisivo para a manutenção do nosso Estado Social de Direito. É praticamente impossível tocar um projeto de infraestrutura no Brasil sem ter alguma complicação com um desses órgãos. Esse, ao meu juízo, é o cerne do problema. Particularmente, nunca vi um projeto sair ileso desse perverso sistema de controle. É até arriscado eu dizer isso, porque vivemos em um momento bastante maniqueísta. Qualquer crítica que se faça, hoje, a esse sistema de controle é vista como uma defesa da corrupção ou uma tentativa de afrouxar a fiscalização.

CC: Após o escândalo da Petrobras, imagino que a tendência é aumentar ainda mais o rigor sobre os contratos públicos, não?RV: Sim, mas não podemos inviabilizá-los. Para completar esse quadro, ainda temos um Judiciário que não responde as demandas de forma satisfatória, no que tange ao conteúdo, mas também pela morosidade. Não por acaso, as empresas envolvidas em projetos de infraestrutura buscam cada vez mais a arbitragem para a resolução das controvérsias. É a garantia de resolver os impasses com celeridade e ter julgadores com conhecimento especializado.

CC: Desde 1993, a Lei de Licitações sofreu modificações por meio de 80 normas, das quais 61 medidas provisórias e 19 leis. Essa inflação normativa chega a ser um problema?RV: A Lei de Licitações até que não sofreu tantas alterações assim. Mas sobrevieram leis específicas, como a que instituiu o Pregão em 2002 e o Regime Diferenciado de Contratações Públicas em 2011. Sem falar de leis especiais para certos setores, como serviços de publicidade, para os quais surgiram regimes próprios de licitação. Essa proliferação de normas nunca é boa. Cada conjunto normativo gera uma ampla discussão jurídica, que demora muito a ser pacificada nos tribunais. Algumas, por sinal, nunca serão. Isso gera um estado de litigiosidade que não é bom para os negócios. Mas acredito que os maiores problemas não estão na fase de licitação, do procedimento em si. Eles residem na execução dos contratos. E, sobretudo, na fase de planejamento.

CC: O próprio TCU destaca que projetos básicos e executivos deficientes ou desatualizados estão entre os principais problemas encontrados nos contratos públicos auditados.RV: Sim. O Estado gasta pouco tempo com planejamento e isso redunda em contratações mal feitas, que geram desperdício de recursos públicos, sobrepreço das obras e muitos aditamentos. Agora, com a contratação integrada, mecanismo previsto no Regime Diferenciado de Contratações, vemos o reconhecimento da incapacidade do Estado de planejar. O governo prepara um anteprojeto e deixa para a inciativa privada a responsabilidade de elaborar o projeto básico, transfere o planejamento ao particular.

CC: Não é confiar demais na iniciativa privada?RV: A questão é de simples desate. Se o projeto é elaborado pela empresa, como o poder público irá fiscalizar a execução? A isonomia na aferição da melhor proposta também fica comprometida. Se cada particular pode apresentar seu próprio projeto, não estamos comparando coisas iguais, que é o pressuposto da licitação.

CC: E o Procedimento de Manifestação de Interesse?RV: O PMI pode ser um excelente instrumento, desde que ele não configure o abandono da função de planejamento do Estado. Se servir como um instrumento para melhorar o diálogo entre o governo e os particulares, de forma a auxiliar o poder público a tomar decisões mais clarividentes e acertadas, pode ser um bom caminho. O Estado só não pode abrir mão de planejar. Hoje, oficiosamente, muitos projetos são introduzidos na administração pública por particulares. Com o PMI, há competição. Todos podem analisar os projetos apresentados e criticá-los. É bem mais transparente. No atual ambiente, é melhor o Estado optar pelo PMI do que montar um projeto deficiente, que acarretará em problemas no futuro. Ou ainda lançar uma proposta claramente moldada por alguma empresa interessada, porque o governo não tem recursos humanos para elaborar projetos complexos. No PMI, ao menos há disputa na fase de planejamento, no projeto.

CC: Mas quais são os limites do PMI? As empresas podem elaborar os projetos e os editais de licitação? Não é necessária uma melhor regulamentação desse instrumento?RV: O PMI está previsto em dispositivos isolados das leis 8.987, de 1995, e 11.922, de 2009, e tem todo o seu procedimento regulamentado por meio de decretos. De fato, falta uma lei que discipline devidamente o procedimento a ser seguido. Hoje, permite-se até, em alguns casos, que a empresa vitoriosa faça o edital da licitação.

CC: O setor privado também se queixa muito de uma alocação de riscos inadequada nos projetos de concessões e PPPs.RV: Esse é um típico problema de projeto mal elaborado. Não adianta tentar disciplinar a questão pela via legislativa, porque a repartição de riscos é sempre casuística. Cada projeto se reveste de riscos próprios, particulares. Reformar uma rodovia é diferente de erguer uma hidrelétrica, de construir um estádio. Cada projeto demanda uma criteriosa análise técnica para avaliar os riscos dele decorrentes. Somente então é possível distribuir os riscos entre o poder público e o setor privado. Há uma tendência de tentar repassar todos os riscos aos particulares, mas é evidente que as empresas vão repassar isso para o preço da obra. O particular vai precificar o risco assumido, e é natural que assim o faça.

CC: O que fazer para tornar os projetos de concessão e PPPs mais atrativos para os investidores privados?RV: As vacilações do Estado decorrem de projetos mal feitos, da falta de diálogo transparente com a iniciativa privada e da baixa especialização dos servidores públicos. Hoje, o governo não tem condições de colocar de pé um projeto de PPP sem ajuda, porque são modelos complexos, exigem uma equipe qualificada de economistas, engenheiros, advogados. O Estado tem enorme dificuldade para capturar esses especialistas.

CC: Em uma concessão ou PPP, a empresa parceira tem todo o interesse de concluir a obra no prazo e com qualidade, porque ela vai lucrar com a exploração econômica e deve zelar pela manutenção do equipamento. Por outro lado, muitas vezes o lucro mostra-se exorbitante diante do investimento privado no projeto. Como equilibrar melhor esses contratos?RV: De fato, pode haver uma remuneração indevida do particular. Por outro lado, segundo me parece, a lógica que deve presidir estes projetos é simples: o particular, com seu dinamismo, explora as potencialidades econômicas do empreendimento e, em contrapartida, obriga-se a oferecer aos cidadãos excelentes serviços públicos. Em São Paulo, por exemplo, um dos estudos apresentados no bojo de um PMI, destinado à concessão da iluminação pública do município, previu a autorização para particulares utilizarem os postes de luz para passar cabeamento de fibra ótica. A empresa exploraria esse serviço de outros particulares e, num dado momento da concessão, seria possível até eliminar a contribuição de iluminação pública paga por cada cidadão. As concessões e PPPs podem ser excelentes para a garantia de bons serviços públicos, assim como podem configurar o mais perverso instrumento de dilapidação do patrimônio público. Tudo vai depender de um projeto bem feito e bem intencionado.

CC: Não seria o caso de o governo pensar na criação de um núcleo de excelência para a elaboração de projetos, uma agência capaz de assessorar os diferentes ministérios nessa tarefa?RV: Sim, isso me parece bastante adequado. E poderia existir um núcleo desses em cada esfera de governo: União, estados e municípios. Precisamos de quadros específicos para planejar, quadros bastante qualificados. Também me parece fundamental repensar os mecanismos de controle. Hoje, temos um sistema incoerente. O Tribunal de Contas pode ter avaliado a execução de uma obra e dito que ela está perfeita. Aí vem o Ministério Público e tem uma interpretação diferente, acha que tudo está um horror. O processo passa diferentes instâncias do Judiciário e, no fim das contas, chega-se à conclusão de que não há nenhuma irregularidade. Mas, até acontecer isso, passaram-se meses ou anos. Houve retenções de pagamento. Isso vai matando o empreendimento.

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domingo, 25 de janeiro de 2015

Thomas Piketty: 'Temos de taxar mais a renda e menos o consumo e os salários'




Olá alunos,

Ao contrário do que era esperado a desigualdade econômica, após a Segunda Guerra, aumentou ainda mais. A postagem de hoje expõe os fatores que levaram a esse aumento de desigualdade pelo globo e artifícios para combate-la.

Esperamos que gostem e participem.

Fellype Fagundes e Carlos Araújo
Monitores da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense


Um dos maiores trunfos do capitalismo é seu dinamismo e sua capacidade de se reinventar a cada crise que sofre. No século 19, Karl Marx havia desvendado esse mistério em O Capital, obra máxima que explicou o funcionamento do sistema que recém havia tomado corpo.

Desde então, já foram muitas as reinvenções do capitalismo. Os acordos de Breton Woods, assinados em 1944, foi uma das maiores delas, visto a urgência de ditar uma nova ordem econômica após a grande depressão de 1929 e a Segunda Guerra Mundial. Para não entregar os dedos, alguns anéis tiveram de ser cedidos pelos capitalistas.

Após a grande depressão, os países desenvolvidos se atentaram para a necessidade de uma presença maior do Estado na vida econômica do cidadão. Emergiu daí o Keynesianismo, corrente que visava reformar o capitalismo como ele existia até a década de 1930. Seu mentor era John Maynard Keynes e defendia que o Estado havia de agir para manter os níveis de emprego altos para que a população tivesse certo grau de bem-estar econômico.

Mas, como o dinamismo marca a trajetória da nossa sociedade capitalista, após o fim da URSS e da ordem bipolar do mundo, novamente se colocou sobre a mesa a necessidade de deixar o mercado e sua mão invisível agir. A modernidade estava nas privatizações de estatais para que o governo pudesse “gastar dinheiro onde a população precisasse”. Hoje, nós sabemos que a investida neoliberal não deixou boas recordações pelo mundo.

Após a crise financeira de 2008, que levou muitos países à recessão e cobra seu preço com números de desempregados ainda recordes em diversos países da Europa, pairava no ar alguma ideia nova que viria para discutir velhos problemas do nosso sistema como o rentismo e a distribuição de renda.

O nome da vez é o francês Thomas Piketty, autor do livro O Capital no Século XXI. Para alguns, um estudioso que consegue analisar os dados e dar um novo panorama sobre a desigualdade pelo mundo. Para outros, alguém que só está querendo, mais uma vez, reformar para manter o capitalismo vivo.

Em uma palestra ministrada dia 28 de novembro no campus de São Bernardo da Universidade Federal do ABC (UFABC), Piketty acredita que sua obra consegue, com um número de dados muito maior, jogar uma nova luz sobre o debate da desigualdade de renda.

“Hoje, existe um número de dados muito maior dos países. Resolvi me debruçar sobre eles pois muitos economistas achavam que era um problema muito histórico pra eles; já os historiadores acreditavam que o problema era muito econômico”, resumiu.

Para ele, também é muito difícil saber qual a tendência da desigualdade nos próximos anos, mas vê a desregulamentação financeira como algo a se preocupar.

Aumento da desigualdade

A obra de Piketty analisa dados de 20 países desde quando começaram a cobrar taxas sobre a renda. A conclusão que se chega é que a parcela mais rica da população concentrou ainda mais renda nas últimas décadas.

“Ao contrário do que todos achavam que iria acontecer com a desigualdade após a Segunda Guerra, ela aumentou ainda mais”, explicou.

O caso estadunidense chama atenção. O país sempre ficou no patamar de 33% da renda total entregue aos 10% mais ricos entre as décadas de 50 e 80. A partir daí, então, ela disparou até chegar aos 50% em 2012, descolando-se das taxas europeias e se aproximando da brasileira.

Piketty elenca alguns fatores que fizeram a renda ficar ainda mais concentrada: a globalização e a falta de educação de qualidade para a maioria da população do Estados Unidos.

“Esse crescimento da desigualdade é muito maior nos EUA do que na Alemanha e no Japão. A falta de acesso à educação de qualidade explica essa diferença. São poucos os que chegam a faculdades de ponta como Harvard. Mas isso só não vai acabar com o problema, é importante uma reforma na tributação”, analisou.

Pelo que passaria essas transformações? Para ele, acontece no mundo todo uma prática em comum que, somente se corrigida, poderia inverter a lógica dessa centralização: a maior taxação dos ricos.

“Deveriam existir impostos mais progressivos entre renda e capital. Maior taxação na renda e menos taxação no consumo e nos salários. Se os mais ricos estão ganhando mais por ano, eles pagam mais naquele ano. Se no seguinte eles ganharem menos, paguem menos”, simplificou.

Piketty ainda reforça que a renda familiar ganhou muita importância em um capitalismo que gera mais renda para quem tem mais dinheiro. Ele exemplifica seu ponto apontando a dificuldade de conseguir comprar imóveis nas principais cidades do mundo.

“Quem é da classe trabalhadora e quer comprar um imóvel em São Paulo, Londres ou Pequim somente com o salário não consegue. Na maioria das vezes depende de outras rendas”, disse.

Governos precisam investir mais

Outra conclusão a que o estudo dos dados chega é que o capital privado nos países é cada vez maior do que o público. Ou seja, o investimento estatal é cada vez menor em tempos de baixo crescimento econômico, ao contrário do que defendia Keynes.

Thomas dá o exemplo da Itália, que tem o capital público negativo, ou seja, se vender todos os seus ativos, ainda assim o país não consegue pagar a dívida pública. Para ele, a saída tem de ser pela via oposta, fortalecer os gastos públicos em detrimento do pagamento de juros.

“Os programas de transferência de renda custam muito menos do que o pagamento de juros e ainda colocam mais dinheiro dentro do país. Há uma diferença gritante do capital público dos países nos anos de 1970 e hoje. Enquanto antigamente ele era de 50% a 60% do capital total, hoje ele não passa de 30% e, muitas vezes, chega a zero”, criticou.

Porém, o economista deixa claro que o investimento em política de distribuição de renda não pode ser a única preocupação dos governos, que não devem abrir mão de oferecer serviços públicos de qualidade como educação, transporte e saúde. “Há um limite no dinheiro”, esclarece.

Desigualdade no Brasil

Desde o início do governo Lula em 2002, o Brasil se orgulha de ser um dos países que mais teve sucesso no combate à pobreza e à concentração de renda. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), a riqueza concentrada na mão dos 10% mais ricos no país caiu de 50% para 45% entre 2007 e 2013.

No último ano do primeiro mandato de Dilma, porém, a noticia não foi boa. De acordo com o índice de Gini, divulgado no último mês de setembro e que mede a desigualdade de renda, ela se manteve estável entre 2012 e 2013 pela primeira vez desde 2001.

O IPEA também confirmou, pela primeira vez desde 2003, que o número de miseráveis cresceu no país. Em 2012 eram de 10,08 milhões enquanto que no ano passado ele subiu para 10,42 milhões.

O Brasil não está na lista dos 20 países em que há dados confiáveis, de acordo com o livro de Piketty. Ele criticou a falta de transparência da Receita Federal nos dados sobre o Imposto de Renda e o método de fazer pesquisas domiciliares, como faz a PNAD, para chegar a conclusões sobre a concentração de renda.

“Se pegarmos as informações fiscais a que tivemos acesso, os números são bem maiores. Falta transparência da Receita Federal. Se você for levar em conta só as informações da PNAD, acaba olhando só para a renda do trabalho, virando as costas para a renda dos mais ricos, que estão concentradas em imóveis e ações”, explicou.

Piketty reforça o que foi feito no Brasil nos últimos anos, como a valorização real do salário mínimo e o Bolsa Família como positivo, mas analisa que a diminuição da pobreza não significa automaticamente que a renda está menos desigual.

As soluções que o professor vê para o Brasil não são diferentes do que para o resto do mundo. A taxação de renda na França, por exemplo, pode chegar a 75% para quem recebe mais de 1 milhão de euros por ano. No Brasil, a maior faixa do IR cobra 27,5%.

Isso significaria que o país poderia aumentar a arrecadação mesmo reduzindo impostos dos mais pobres, se criasse faixas superiores de cobrança. O problema da progressividade nos impostos também está na taxa cobrada sobre as heranças, segundo Piketty.

“A maior alíquota do Imposto de Renda no Brasil está em um patamar considerado baixo para os padrões mundiais, muito próxima da menor nos Estados Unidos. Precisa se criar uma faixa para quem ganha R$ 500 mil, R$ 600 mil, R$ 1 milhão por ano. Também tem o imposto sobre herança no Brasil, que é ridiculamente baixo. Na Alemanha, cobra-se 40%; nos Estados Unidos, cobra-se 40% e aqui, não passa de 4%. É preciso se discutir isso urgentemente”, finalizou.

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