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sábado, 27 de janeiro de 2018

O Brasil está experimentando uma das maiores desindustrializações da história da economia

Ha-Joon Chang economista da Universidade de Cambridge
Olá alunos.
A notícia de hoje consiste numa interessante entrevista com o prof. sul-coreano Ha-Joon Chang, autor do best-seller "Chutando a Escada".

Esperamos que gostem e participem,
Lauro HCMSJr é monitor da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.
Você se considera de esquerda? Mesmo acostumado a dar entrevistas, essa pergunta ainda faz gaguejar Ha-Joon Chang, professor de economia da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, que se tornou conhecido por expor os problemas do capitalismo. “Bem...eu possivelmente sou”, respondeu um pouco reticente o acadêmico, como quem confessasse um pecado. Para ele, no mundo polarizado de hoje, admitir-se de qualquer tendência ideológica pode significar uma sentença de morte para um potencial diálogo. Além disso, em diferentes países, a percepção de direita e esquerda é diferente. “Na Coreia do Sul e Japão, por exemplo, o tipo de política industrial que defendo é considerada de direita. Já na Inglaterra, onde vivo hoje em dia, é uma política de esquerda”, afirmou o autor sul-coreano do best-seller Chutando a Escada: A Estratégia do Desenvolvimento em Perspectiva Histórica (Editora Unesp), que veio ao Brasil participar do Fórum de Desenvolvimento, em Belo Horizonte. Ha-Joon Chang conversou com o El PAÍS sobre polarização política, história econômica e o futuro do sistema econômico mundial, que, para ele, não é nem capitalista, nem socialista.
Pergunta. Como a polarização política afeta o desenvolvimento econômico?
Resposta. A polarização é a pior coisa que pode acontecer para a economia. Tudo se torna simbólico. Você começa a se opor a determinada política simplesmente porque ela está associada a um partido de esquerda ou direita. Os debates estão se tornando cada vez mais difíceis. Ambos os lados, ao invés de debater, gritam uns com os outros. Eu gosto de me descrever como um pragmatista. Não importa de onde vem determinada política para o desenvolvimento econômico, contanto que ela funcione.
P. Desde o Consenso de Washington, no final da década de 1980, muitos países pobres abraçaram as recomendações internacionais para propagar o livre comércio como uma das formas de combater a miséria e se desenvolver. Como você avalia o resultado dessa medida?
R: Hoje, quando olhamos para os países ricos, em sua maioria, eles praticam o livre comércio. Por isso, é comum pensarmos que foi com esta receita que eles se desenvolveram. Mas, na realidade, eles se tornaram ricos usando o protecionismo e as empresas estatais. Foi só quando eles enriqueceram é que adotaram o livre comércio para si e também como uma imposição a outros Estados. O nome do meu livro, Chutando a escada, faz referência a um livro de um economista alemão do século XIX, Friedrich List, que foi exilado político nos Estados Unidos em 1820. Ele critica a Inglaterra por querer impor aos EUA e à Alemanha o livre comércio. Afinal, quando você olha para a história inglesa, eles usaram todo o tipo de protecionismo para se tornar uma nação rica. A Inglaterra dizendo que países não podem usar o protecionismo é como alguém que após subir no topo de uma escada, chuta a escada para que outros não possam usá-la novamente.
P: Como se deu o desenvolvimento dos países ricos na prática?
R:Estes países cresceram com base no que Alexander Hamilton [1789-1795], primeiro secretário do Tesouro dos Estados Unidos [que estabeleceu os alicerces do capitalismo norte-americano], defendeu como o argumento da indústria nascente. Do mesmo jeito que mandamos nossas crianças para a escola ao invés do trabalho quando são pequenas, e as protegemos elas crescerem, os Governos de economias emergentes têm que proteger suas indústrias até que elas cresçam e possam competir com as indústrias de países ricos. Praticamente todos os países ricos, começando pela Inglaterra no século XVIII, Estados Unidos e Alemanha, no século XIX, Suécia no começo do século XX, além de Japão, Coreia do Sul e Taiwan...todos estes países se desenvolveram usando protecionismo, subsídios estatais, controle do investimento direto estrangeiro, e em alguns casos, até mesmo empresas estatais.
P: Como esse passado dialoga com as medidas atuais de austeridade, que se tornaram fetiche em todo mundo como promessa de crescimento?
R: A receita de austeridade usada na Grécia é a mesma tentada na América Latina, na África e em alguns países da Ásia nas décadas de 1980 e 1990, e que criou desastrosos resultados econômicos. Investir em política de austeridade é contraproducente. As pessoas que defendem esse tipo de política entendem que, quando você tem uma grande dívida pública, um jeito de reduzir essa dívida é cortar os gastos do Governo a fim de reduzir o déficit fiscal. Mas um jeito melhor de reduzir o déficit é fazer a economia crescer mais rápido. Depois da Segunda Guerra Mundial, a Grã-Bretanha tinha uma dívida mais de 200% de seu PIB [Produto Interno Bruto], mas sua economia estava crescendo rápido. E depois de algumas décadas, isso deixou de ser um problema. Hoje, a Inglaterra tem tentado uma política de austeridade, mais amena que a da Grécia, é verdade, mas também sem sucesso em reduzir o déficit público proporcionalmente a renda nacional. Isso porque o PIB está crescendo muito lentamente. Se você corta os gastos, seu endividamento pode ficar um pouco menor, mas a renda precisa crescer.
P: O país corre o risco de ficar estagnado?
R: Exatamente. O que é incrível é que essa política vem sendo usada várias vezes, como no Brasil nas décadas de 1980 e 1990, e nunca funcionou. Albert Einsteinfalava que a definição de loucura é fazer a mesma coisa várias vezes e esperar resultados diferentes. O problema é que muitos economistas que defendem essas medidas, quando sua teoria não funciona, culpam a realidade. Como se a teoria nunca estivesse errada.
P: Você é bastante crítico da desindustrialização dos países emergentes. Por que é tão ruim ser dependente das commodities?
R: As pessoas têm que entender como é séria a redução da indústria de transformação no Brasil. Nos anos 80 e 90, no ponto mais alto da industrialização, esse setor representou 35% da produção nacional. Hoje não é nem 12% e está caindo. O Brasil está experimentando uma das maiores desindustrializações da história, em um período muito curto. O país tem que se preocupar. E eu não estou dizendo nada novo. Muitos economistas latino-americanos já levantavam o problema da dependência de commodities primárias na década de 1950 e 1960. Quando você é dependente de commodities primárias há uma tendência de que o preço dos produtos caia no longo prazo em comparação com os produtos manufaturados. Além disso, os países dependentes de commodities não conseguem controlar seu destino.
P: Por exemplo?
R: Quando alguém inventa uma alternativa para o seu produto, isso pode devastar o valor de sua economia. A indústria brasileira de borracha foi um grande hit até que os americanos e russos inventaram a borracha sintética nos anos 1930 e 1940. Quando os alemães inventaram a chamada síntese de Haber-Bosch para a produção de amônia, a ser usado na fabricação de fertilizantes, Chile e Peru, que costumavam ganhar muito dinheiro exportando o fertilizante natural guano, que foi o mais valioso fertilizante nos século XIX, tiveram anos de estagnação econômica. Isso sem contar o potencial lento de crescimento das commodities e relação a outras indústrias, como a de tecnologia.
P: Mas o caso do Brasil não seria diferente, já que o país investe em tecnologia na área agrícola, e não só extração de commodity?
R: Para ser justo, eu sei que o Brasil tem tido algum sucesso na área agrícola, como produzir soja no Cerrado, que é uma região muito árida, onde tradicionalmente esta espécie não cresceria. É realmente impressionante. Mas quando você se especializa em soja você não pode aumentar sua produtividade da mesma forma que um país especializado em alta tecnologia, que pode aumentar sua produtividade em 20%, 30% ao ano. Sinceramente, o Brasil é um dos países que parece estar voltando no tempo no seu desenvolvimento econômico.
P: Como você avalia o papel do Estado neste cenário?
R: Ao contrário de outros países em desenvolvido, o Brasil tem a habilidade de fazer as coisas acontecerem por meio da intervenção governamental. A Embraer, por exemplo, é uma empresa de economia mista. A agricultura no Cerrado é subsidiada com recursos do governo. Em vários setores, o país já mostrou que quando quer fazer uma coisa, ele consegue. Infelizmente, os responsáveis por fazerem as políticas públicas parecem que perderam o rumo. Eles basicamente desistiram do modelo de desenvolvimento econômico por meio de um upgradena economia, com investimento em indústrias de alta tecnologia.
P: Onde você acha que a política pública falhou?
R: Eu conheci vários empresários irritados em São Paulo pois as pessoas no Governo não parecem estar preocupadas com o declínio da indústria manufatureira no país. Sei que muitos economistas defendem que não importa se você está exportando soja ou aviões, desde que esteja fazendo dinheiro. E, no curto prazo, isso pode até ser verdade. Mas no longo prazo, é muito ruim para a economia. Além disso, as políticas macroeconômicas têm sido muito ruins para o setor industrial, especialmente a alta taxa de juros, uma das maiores do mundo.
P: No Governo Dilma, vários setores receberam subsídio e mesmo assim, os empresários não pareciam estar satisfeitos. O que faltou?
R: O Governo de Dilma canalizou vários subsídios em alguns setores em particular. Mas isso só foi necessário por conta da política de alta taxa de juros, uma vez que as companhias brasileiras não conseguem competir no mercado global de outra forma. Não sei todos os detalhes. Mas sei que houve erros, corrupção. As metas governamentais também foram determinadas de forma equivocada...sempre privilegiando a estabilidade macroeconômica. Já o declínio da indústria não foi considerado um problema. Focou em ações como Bolsa Família, mas sem prestar atenção em dar um upgrade na economia.
P: A Coreia do Sul pode ser considerada um exemplo de economia que conseguiu dar esse upgrade?
R: Depende de qual Coreia do Sul que estamos falando. A Coreia do Sul depois da crise asiática de 1997 abraçou o neoliberalismo, não tanto como os países da América Latina, mas desregulamentou o mercado financeiro e alavancou políticas industriais. O resultado é que uma economia que costumava crescer 6%, 7%, 8% até 1990, agora está sofrendo para crescer 3%. Isso porque as mudanças que criaram líderes globais na área industrial, automotiva e eletrônica, também produziram baixo crescimento, falta de trabalho e não impediram que estas indústrias migrassem para outros países. E mesmo assim, não tivemos o colapso industrial que se vê no Brasil.
P: Qual foi o papel da educação no crescimento da Coreia do Sul?
R: No começo, a educação teve um papel muito importante. Até os anos 80, era possível alguém de uma família pobre se tornar juiz, governador ou cirurgião. Infelizmente, a partir dos anos 90, tivemos um sobreinvestimento em educação, com o crescimento dos negócios privados. Tínhamos o maior investimento em educação do mundo. Mas hoje, considerando o valor que estamos investindo, e o tempo que os estudantes estão gastando para conseguir suas qualificações...o sistema se tornou bem ineficiente. A mobilidade social caiu muito nos últimos anos, porque as políticas educacionais deixaram de ser coordenadas com políticas industriais.
P: Você comenta que estamos entrando no fim da abordagem neoliberal ao desenvolvimento. O Brexit seria um exemplo desse começo do fim?
R: Poderia ser. Mas temos que considerar que há três tipos de pessoas que  votaram pelo Brexit. Um deles são os liberais que votaram para se livrar das regulamentações impostas pela União Europeia. Há ainda o grupo anti-estrangeiros e anti-imigração. E um terceiro grupo, os trabalhadores no Norte da Inglaterra, que já foi o centro produtor do país, e que experimentou uma desindustrialização massiva. Estas pessoas perderam seus trabalhos, e agora culpam trabalhadores da PolôniaRomênia e Hungria pela sua sorte. Podemos dizer que é o começo do fim no sentido em que isso aconteceu com a insatisfação que muitas pessoas têm com a globalização e o livre comércio.
P: Há algum lugar onde estaria sendo gestada uma solução para o modelo de desenvolvimento econômico dos países?
R: Cingapura é hoje o exemplo mais bem sucedido de um país com desenvolvimento pragmático e não ideológico. Quando lemos sobre Cingapura nos jornais The Wall Street Journal e na revista The Economist sempre ouvimos falar da política de livre comércio e o acolhimento positivo que o país tem com o investidor estrangeiro. O que é verdade. Mas não se fala que 90% das terras do país são de propriedade do Governo; 85% das casas são de propriedade do governo; e 22% do PIB é produzido por empresas públicas. Eles têm um modelo pragmático de economia, que mistura elementos do capitalismo de livre mercado e do socialismo. Eles não são capitalistas, nem socialistas. São pragmatistas. Uma de minhas frases favoritas é de Deng Xiaoping, o ex-líder Chinês: “Eu não ligo se o gato é preto ou branco, contanto que seja bom em pegar ratos”. Isso é o pragmatismo.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Países dos BRICS estão entre os 10 mais otimistas com 2018

Dos 5 países dos BRICS, chineses são os mais otimistas com 2018

Olá alunos.

A notícia de hoje destaca que os países emergentes são os mais otimistas quanto ao cenário econômico do ano de 2018.

Esperamos que gostem e participem,

Lauro HCMSJr, monitor da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.

Pesquisa realizada pelo Instituto Ipsos em 28 países revela que os integrantes dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) figuram na lista dos 10 mais otimistas com as perspectivas para 2018, seja na economia, na geopolítica e mesmo quanto aos planos pessoais.
O levantamento mostra que a China ficou em quarto lugar, à frente de Índia (6º), Rússia (7º), África do Sul (8º) e Brasil (9º). Para 76% dos entrevistados, 2018 será um ano melhor do que 2017. Na outra ponta, os menos confiantes são Itália (43%), Japão (39%) e França (36%). Seis em cada 10 pessoas ouvidas na enquete acreditam que a economia global estará mais forte no ano que se inicia, e essa grau de confiança é justamente maior entre os países emergentes, os quais, segundo o Banco Mundial (Bird), deverão puxar o crescimento mundial neste ano. Nesse quesito, o Brasil é o quinto melhor colocado do ranking.
Em entrevista à Sputnik Brasil, Roberto Dumas, mestre em Economia pela Universidade de Fundam, em Xangai, e professor do Insper, diz que as conclusões da pesquisa já eram mais ou menos esperadas, uma vez que 2017 foi um ano de dificuldades, mais no âmbito da geopolítica do que na economia em todo o mundo. A pesquisa do Ipsos mostra que 47% dos entrevistados consideram que 2017 foi um ano ruim.
"É uma notícia positiva. Agora vai ser melhor para alguns países. A China vai ter um crescimento menor do que aqueles 6,8%, porque o Xi Jinping tomou a liderança e as reformas vão seguir mais draconiamente para que seja voltado para o consumo, o que fará a produção ter que parar de receber subsídios", explica o especialista.
No caso da Rússia, Dumas prevê também um bom desempenho, graças à recuperação do preço do petróleo, agora de volta à casa dos US$ 70 o barril. No caso da Índia, cuja economia também está voltada para o consumo, o economista vê o país seguindo em uma velocidade de cruzeiro, crescendo até 7,5%. Já para o Brasil ele acredita que a estimativa de crescimento de 3,5% do Produto In terno Bruto (PIB) para este ano é positiva, embora a grande incógnita é como se dará essa expansão em 2019 e 2020, para que o país não volte a retomar o chamado voo de galinha, ou seja, crescimento sem sustentabilidade. "Precisamos fazer alguma coisa muito errada para o país não crescer este ano", frisa Dumas.
Na avaliação do professor, o fato de que 47% dos entrevistados terem avaliado negativamente 2017 se deve mais a fatores geopolíticos do que econômicos. Ele aponta os retrocessos na política externa americana, a instabilidade política na União Europeia, a saída da Grã-Bretanha do bloco, atentados terroristas e o deslocamento das tensões internacionais para a Ásia, devido à queda-de-braço entre Estados Unidos e Coreia do Norte devido ao programa nuclear e aos testes promovidos pelo líder Kim Jong-Un.
"Você tinha uma ordem econômica do pós-guerra que de certa maneira foi rejeitada por Trump e a globalização também foi rejeitada por ele. O dissabor ocorreu pelo fato de como Trump respondeu e que não deveria responder pela posição que tem. Nunca estivemos tão próximo de uma hecatombe nuclear. Eu nunca esperei que um dia um presidente dos EUA falasse assim: 'O meu botão é maior que o seu.', analisa o professor do Insper.

quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

O economista bufunfeiro

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Olá alunos.

A notícia de hoje é, na realidade, uma interessante coluna do economista Paulo Nogueira Jr. à CartaCapital.

Esperamos que gostem e participem,

Lauro HCMSJr é monitor da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.

Começo hoje uma coluna quinzenal em CartaCapital. Vou começar light, falando sobre a “turma da bufunfa”. O leitor já ouviu falar? Trata-se da minha principal, talvez única, contribuição à literatura econômica. Ainda não ganhou, entretanto, reconhecimento universal. Ofereço uma definição sintética: a turma da bufunfa é um agrupamento, razoavelmente estruturado, que se dedica a fomentar, proteger e cultuar o vil metal. O seu núcleo duro é composto de banqueiros, financistas e rentistas. Na periferia figuram os economistas, jornalistas e outros profissionais. 

Os economistas são os sacerdotes do culto, encarregados de suprir a fundamentação metafísica para as atividades da turma. O fenômeno é antigo. John Kenneth Galbraith explicava que a teoria econômica moderna, ensinada como ciência, tinha também o que ele chamou de “função instrumental”, isto é, a de confirmar e reforçar os pressupostos dos círculos dominantes da sociedade. Muito antes dele, os marxistas denunciavam o caráter ideológico e “de classe” da economia política. 

Nas décadas recentes, o fenômeno adquiriu, porém, dimensão estarrecedora. A turma da bufunfa inchou de maneira medonha. As instituições financeiras tornaram-se o centro do poder e da apropriação de riqueza. Em outras palavras, estabeleceu-se a hegemonia avassaladora do capital financeiro. 

Antes de prosseguir, faço uma pequena pausa. Gosto de descrever física e espiritualmente os meus personagens. Os “bufunfeiros”, leitor, se parecem muito uns com os outros. São, eu diria, intercambiáveis. Primeiro traço geral: são gordos, no mínimo balofos, e não raro obesos. Mas são gordos de um tipo muito singular. É que, normalmente, as banhas predispõem aos aconchegos, ao carinho, à conciliação e ao bom humor. No caso em tela, as banhas não têm esses efeitos salutares. Os bufunfeiros são quase sempre sisudos, cinzentos, intolerantes. Não se lhes ouve uma piada ou mesmo um simples gracejo. 

O maior elogio que se pode fazer a um economista bufunfeiro é dizer que ele é “sério” e “bem treinado”. Para merecer esses qualificativos o economista se esmera em repetir fórmulas áridas e teses respeitáveis. Frases prontas substituem a necessidade de pensar. O mesmo encadeamento de palavras, sempre o mesmo, e em tom sentencioso produz na opinião pública um efeito quase hipnótico. 

Paro e releio o que escrevi até agora. Está ficando um pouco vago e abstrato. Hesito. Devo dar nome aos bois? Ou deixá-los tranquilos no pasto? Na última vez em que nomeei bois a boiada estourou para cima de mim. Cortaram a minha coluna no Globo. Em CartaCapital, sinto-me mais protegido. E toda exposição teórica, convenhamos, precisa de exemplificação. 

Vejamos. Um bom exemplo seria o atual presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn. Para começar, o seu visual obedece ao figurino e a boca mole balbucia, monotonamente, os chavões que o mercado espera. Recentemente, tive a curiosidade de tentar descobrir o que pensa e o que diz o chefe do nosso BC. Terá publicado algo interessante? Nada encontrei de substancial. O seu discurso e seus textos intercalam homenagens ao Conselheiro Acácio com a repetição mecânica da vulgata ortodoxa. 

Antigamente, valia a pena ler economistas conservadores, como Eugênio Gudin, Otávio Gouveia de Bulhões, Mário Henrique Simonsen, Roberto Campos. Sempre se aprendia algo. Encontravam-se capacidade analítica, ironia, cultura, polêmica inteligente e, pasmem, até espírito público. Os economistas bufunfeiros atuais não oferecem nada disso. Um deles, outro dia, seguia distraído, quando de repente tropeçou numa ideia. Recompôs-se rapidamente, olhou para o lado temendo testemunhas e retomou o seu caminho, imperturbável. 

Conto, para encerrar, um pequeno episódio. Há alguns anos, fui almoçar no Itaú, a convite do então presidente do banco, Olavo Setubal. Estava presente um economista, chefe do departamento econômico. A certa altura, baixou a falta de assunto. Perguntei então o que ele sabia de dois economistas nomeados havia pouco para a diretoria do Banco Central. O economista explicou, sem qualquer ironia, que um deles era economista sério, treinado nos EUA. O outro também, só que tinha “umas ideias” de vez em quando... 

Para a turma da bufunfa, ideias são fonte de inquietação, sintomas de rebeldia.

A coluna do sr. Paulo Nogueira Jr. encontra-se na revista CartaCapital, Edição 985, de 10 de janeiro de 2018.

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Quem são os 41 milhões de pobres do país mais rico do mundo

Homem puxando carrinho de compras
Olá alunos.
A notícia de hoje procura descrever o perfil dos aproximadamente 15% mais pobres dos Estados Unidos.
Esperamos que gostem e participem,
Lauro HCMSJr, monitor da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.
A despeito da criação de milhões de postos de trabalho nos Estados Unidos, muitos cidadãos do país ainda vivem na pobreza.
Por quase seis anos, a economia norte-americana tem gerado uma quantidade grande de empregos - são quase 2 milhões por ano.
A recuperação econômica não só restabeleceu o número total de postos de trabalho perdidos durante a recessão causada pela crise financeira internacional de 2007, como também criou empregos suficientes para dar conta do crescimento populacional.
A taxa de desemprego nos EUA é de apenas 4,1%, a menor desde 2000. Mas várias famílias não viram seus recursos aumentarem.
Em 2016, quase 41 milhões de pessoas, ou 13% da população, viviam na pobreza - em comparação com os 15% verificados no auge da recessão, em 2010.

Quem são essas pessoas?

Nos Estados Unidos, a renda média de uma família de quatro pessoas é de US$ 91 mil (R$ 299,5 mil) por ano.
De acordo com a medição oficial dos EUA, baseada em renda e necessidades nutricionais, uma casa com quatro pessoas é considerada em estado de pobreza quando a renda familiar é inferior a US$ 24,3 mil (cerca de R$ 80 mil) por ano.
Pode parecer muito se comparado com países classificados como de baixa renda pelo Banco Mundial - com PIB per capita entre US$ 1 mil (R$ 3,2 mil) e US$ 4 mil (R$ 13 mil). No Brasil, por exemplo, medição de 2015 do banco estimou que 4,9% da população brasileira estava abaixo da linha de pobreza por viver com até US$ 1,90 por dia.
Mas o custo de vida mais alto nos Estados Unidos e o crescente abismo entre os pobres e a classe média podem resultar em dificuldades para famílias americanas de baixa renda.
Entre os que vivem na pobreza, dados de 2016 mostram que há cerca de 13,3 milhões de crianças - 18% têm menos de 18 anos.
À medida que a população envelheceu, o número de pessoas pobres com mais de 65 anos aumentou para 4,6 milhões - 9% do total.
Mas é o grupo de pessoas com idade para trabalhar (de 18 a 64 anos) que apresenta os dados mais dramáticos: quase 23 milhões deles, ou 12% do total, vivem na pobreza.
O Projeto Hamilton, do Instituto Brookings, tem analisado essa questão.
No grupo de pessoas com idade para trabalhar:
- 4 a cada 10 estavam empregados
- 1 a cada 10 tinha trabalho em período integral, durante o ano todo, mas não ganhava o suficiente
- 1 a cada 4 estava empregado, mas não tinha contrato para o ano inteiro
- 1 a cada 25 estava à procura de trabalho
- Dos que não tinham trabalho em período integral, 1 em 3 estava nessa circunstância involuntariamente
O fato de quatro entre 10 adultos pobres estarem empregados revela que apenas suprir a lacuna de postos de trabalho - retornando às taxas pré-recessão - não significa que todos estejam vivendo bem e prosperando.
Também não quer dizer que todos estejam encontrando emprego. Cerca de metade dos adultos pobres em idade para trabalhar não está inserida no mercado de trabalho.
Dos postos criados, muitos são no setor de hotelaria, administração, saúde e tecnologia da informação, embora algumas áreas muito afetadas pela recessão - como construção civil e manufatura - ainda não tenham se recuperado completamente da crise.
Uma fotografia da mão de obra dos EUA revela uma série de diferenças na sociedade:.
- A taxa de emprego para mulheres retornou aos níveis pré-recessão (55%)
- Americanos negros foram mais afetados pela recessão, se recuperaram mais rapidamente, mas ainda têm mais chances de ficarem desempregados que os brancos
- Mulheres que completaram até o ensino médio ou com escolaridade menor têm mais chances de ficar fora da força produtiva
- Homens foram mais afetados pela recessão e seu retorno ao trabalho tem sido mais lento
O número de homens entre 25 e 54 anos que estão empregados vem caindo há mais de 50 anos - e o de mulheres, desde 2000.
Em parte, isso pode ser uma consequência da queda dos salários entre os que ganham menos, com uma renda individual média de US$ 31.100 (R$ 102.369) por ano.
É possível que muitos daqueles que não fazem parte da força produtiva tenham dificuldade de encontrar emprego sem uma significativa intervenção governamental.
Mais de um quinto dos que têm idade para trabalhar e estão vivendo na pobreza são classificados como deficientes e 15% são "cuidadores"- responsáveis por cuidar de outra pessoa, como crianças e idosos.
Para incluir essas pessoas no mercado de trabalho, seria preciso melhorar a oferta de creches e financiamentos, enquanto adultos com deficiência precisam de mais apoio e tratamento.
O retrato que construímos de trabalho e pobreza nos Estados Unidos revela que os mais pobres são um grupo diverso, com variados tipos de experiências.
Ainda assim, a distribuição desigual da pobreza é chocante:
-Há duas vezes mais famílias afro-americanas (22%) na pobreza do que famílias brancas
-19% dos hispânicos vivem na pobreza
-Mulheres (14%) têm mais chances de serem pobres que os homens (11%)
-Taxas de pobreza variam de 11% a 14% entre as regiões
-Muitos municípios - principalmente do Sudeste e Sudoeste - têm taxas de pobreza superiores a 25%
Nos últimos anos, o aumento do emprego e das rendas, juntamente com a queda na pobreza, tem sido encorajador.
Mas a economia ainda vai precisar manter esse crescimento para ajudar aqueles que vivem em dificuldade.

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

É chegada a hora de pressionar por uma política de economia solidária

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Olá alunos.

A notícia de hoje propõe pressionar as forças políticas nacionais em torno de políticas pró-"economia solidária", reconhecendo-as como importantes paradigmas para a justiça social e para o desenvolvimento equilibrado.

Esperamos que gostem e participem,

Lauro HCMSJr, monitor da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.

Estima-se que a Economia Solidária no Brasil, incluindo cooperativas e empreendimentos solidários, formalizados ou não, seja responsável por cerca de 3% do PIB nacional, envolvendo mais de três milhões de pessoas.

Apesar desse número ser nada desprezível, quem gira essa economia tem muitas dificuldades em seu dia a dia, seja porque a Economia Solidária não é reconhecida e respaldada por uma política pública que defina princípios e parâmetros para seu exercício, seja pelas dificuldades que isso gera em relação a obtenção de crédito e de incentivos governamentais.

O termo Economia Solidária foi usado de modo pioneiro por Paul Singer em 1996, em artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo, intitulado “Economia Solidária contra o desemprego”. No atual momento de crise política, econômica e social enfrentado pelo Brasil, mais do que nunca a Economia Solidária mostra-se necessária.

Um amplo processo de mobilização envolvendo o movimento de Economia Solidária no país, incluindo conferências, discussões no Fórum Brasileiro de Ecosol, mobilizações das centrais de cooperativas e audiências públicas definiu, desde então, a necessidade de criação de uma política pública, que começou a ser desenhada com a criação da Secretaria Nacional da Economia Solidária (SENAES) em 2003, que por quase toda sua existência foi conduzida por Paul Singer.

Nesse caminho de fortalecimento e conquistas foi criado o Cadsol (Cadastro Nacional de Empreendimentos Econômicos Solidários), “com o objetivo de permitir aos empreendedores solidários o acesso às políticas públicas nacionais de ES e demais políticas e programas públicos de financiamento, crédito, aquisição e comercialização de produtos e serviços”.

Destacam-se também nesse movimento estratégias de expansão das políticas públicas, com a criação de legislação e conselhos de Economia Solidária, com ações em cerca de 17 governos estaduais, homologação de leis estaduais e municipais, celebração de convênios da SENAES com municípios e estados, editais e apoio a centenas de projetos.

Esse processo também incluiu a implantação da rede de Centros de Formação em Economia Solidária em todo o país e a parceria da SENAES com a Agência de Desenvolvimento Solidário garantiu condições para desenvolver o Projeto Integração de Redes Solidárias, com objetivo de fortalecer a organização de redes de cooperação por meio da valorização de protagonismos, buscando ampliação da sustentabilidade e articulação em torno do desenvolvimento territorial e alternativas de inclusão produtiva.

Faltava aqui um marco legal, capaz de proporcionar mais segurança jurídica às ações e políticas de Economia Solidária, e assim, em meio a toda essa movimentação. O Projeto de Lei (PL) nº 4.685, de 2012, de iniciativa coletiva dos deputados Paulo Teixeira, Eudes Xavier, Padre João, Luiza Erundina, Miriquinho Batista, Paulo Rubem Santiago, Elvino Bohn Gass e Fátima Bezerra, dispõe sobre a Política Nacional de Economia Solidária e os empreendimentos solidários, estabelecendo definições, princípios, diretrizes, objetivos e composição da Política Nacional de Economia Solidária. Cria ainda o Sistema Nacional de Ecosol e qualifica os empreendimentos econômicos solidários como sujeitos de direito, visando fomentar essa economia e assegurar o direito ao trabalho associado e cooperativado.

O PL nº 4.685, de 2012 está pronto para ser apreciado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara, e é o momento de pressionarmos os deputados a apreciarem a matéria. Esse PL é resultado de todo o amplo processo de mobilização de entidades e pessoas da Economia Solidária no país, e é fundamental apoiarmos esse movimento de avanço, apesar dos retrocessos, visando garantir um marco regulatório para essa economia, dando segurança jurídica às políticas públicas.

A Economia Solidária é também uma atividade que estimula a cidadania ao fomentar valores como solidariedade, cooperação, diálogo e democracia, define o parecer à CCJ de autoria da deputada Maria do Rosário. Destaca ainda o parecer da deputada: “por meio do reconhecimento da economia solidária como importante política pública, a presente proposição prevê vários estímulos aos diferentes aspectos que englobam esta atividade, tais como em relação à educação, profissionalização, cidadania e preservação do meio ambiente, o que vai ao encontro dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, tais como a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, previstos no Art. 1º da Constituição Federal. Trata-se, em verdade, de uma proposição que honra esta casa e todos aqueles preocupados com a melhoria da qualidade de vida do povo brasileiro”.

O PL prevê a criação do Fundo Nacional de Economia Solidária (FNAES), com objetivo de centralizar e potencializar os recursos a serem investidos no desenvolvimento dessa economia, buscando soluções para as dificuldades de natureza financeira dos empreendimentos. Outros empecilhos apontados ao desenvolvimento da Economia Solidária, como carência de treinamento e reconhecimento social, serão também contemplados pela implantação da lei, que por si só implicará maior aceitação social dos empreendimentos solidários e uma maior criação de empregos.

Diante do atual quadro de supressão de direitos dos trabalhadores e trabalhadoras com as reformas trabalhista e da previdência, encaminhada a toque de caixa sem a promoção do devido debate junto à sociedade brasileira, a aprovação desse PL é fundamental para garantir mais oportunidades de forma equânime, socialmente justa e ambientalmente equilibrada.

A SENAES também padece nesse quadro e tem passado por retrocessos desde 2015, com a mudança da conjuntura nacional, tendo sido reduzida a uma subsecretaria dentro do Ministério do Trabalho, incluindo aqui também a demissão de Paul Singer.

Depois de um movimento de muita conquista, não é possível arrefecer frente a esses retrocessos.

É preciso pressionar deputados e deputadas a apreciarem essa matéria na CCJ o mais rapidamente possível! A manutenção das políticas públicas de Economia Solidária e de tudo o que foi construído ao longo dos anos é fundamental para redução da exclusão e da precarização do trabalho.