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terça-feira, 30 de maio de 2023

Convite - Chat GPT - O que muda na atividade de Ensino, Pesquisa e Extensão

Caros Leitores,


Os programas de Inteligência Artificial - como é o caso do Chat GPT - podem ser analisados sob diferentes perspectivas. Se por um lado podem representar economia de tempo e facilitação na realização de tarefas mais extensas, por outro lado, podem resultar em maior grau de dependência deste instrumento, suscitando eventual redução de autonomia e maior 

grau de dependência na elaboração de conteúdos.


Nesse sentido, para debater tal tema, convidamos a todos para o evento organizado pela  Associação dos Professores das Universidades Federais de Santa Catarina (APUFSC) intitulado: “Chat GPT - O que muda na atividade de Ensino, Pesquisa e Extensão?” que será realizado no dia 31 de Maio de 2023 às 18:30 pelo Youtube.


Esse debate busca avaliar os impactos dessa tecnologia no processo de produção científica, para melhor compreensão de seus desdobramentos no âmbito acadêmico contemporâneo. 


Assista aqui

terça-feira, 23 de maio de 2023

Globalização e Forças Armadas

Caros Leitores,


A intensidade da difusão e perpetuação da globalização em diversos setores da sociedade destaca a relevância da discussão sobre como esse fenômeno afeta a soberania bem como a defesa dos interesses nacionais.


Neste contexto, trazemos nesta semana uma notícia que aborda as implicações nas esferas econômica, política, e internacional,  refletindo sobre as modalidades de internacionalização da produção e do comércio, e como esse processo se reflete inclusive nas Forças Armadas.


Esperamos que gostem e compartilhem! 


Fernanda Lima é membro do Grupo de Pesquisa em Estado, Instituições e Análise Econômica do Direito.


Na área militar a globalização também possui uma história que é assentada no movimento dos exércitos em vários recantos do mundo. Na pré-modernidade aconteceu a subjugação do Chipre à Assíria, a invasão da Grécia pela Pérsia, o avanço chinês sobre os países da Ásia Central e a inclusão da Eurásia no reino mongol. Na modernidade ocorreu a conquista do império inca pelos espanhóis, a anexação das Filipinas pelos Estados Unidos, as duas guerras mundiais e a manifestação do colonialismo com os britânicos na Índia e a França na África, sustentado por grandes exércitos comandados por oficiais ingleses e franceses. No suposto e alcunhado período pós-moderno, a partir do fim da guerra fria, exércitos das grandes potências têm perambulado por vários países onde ocorrem combates e os das potências subalternas se encontram em missões de conciliação comandadas pela ONU em locais dominados pelo conflito.

Tal histórico é consoante ao significado da globalização nas Forças Armadas o qual diz respeito ao processo que envolve uma progressiva extensão e uma gradual intensidade do intercâmbio militar entre as unidades políticas do planeta. A expressão essencial desse significado aponta para a centralização do poder estratégico decorrente da concretização de alianças. Como exemplos podem ser citados o Pacto de Varsóvia criado em 1955 e composto pelas repúblicas socialistas da Europa Central e Oriental e a Organização do Tratado do Atlântico Norte que emergiu em 1949 integrado pelos Estados Unidos e algumas dezenas de países europeus a qual se empoderou bastante por causa da guerra na Ucrânia. Com relevância menor cabe incluir o Diálogo de Segurança Quadrilateral composto por Estados Unidos, Japão, Austrália e Índia. Também é ilustrativo as denominadas operações conjuntas e combinadas de Forças Multinacionais como a realizada pela França e Mali em 2021 a qual foi suspensa devido a aplicação de um golpe de Estado, a concretizada pela Índia, China e Rússia atualmente.

Outrossim, tem surgido diversas implicações para as Forças Armadas estatais. Uma das mais sérias relaciona-se à corrosão da sua importância, pois como é sabido existe uma significativa quantidade de grupos privados de segurança que oferecem os mesmos serviços que elas prestam. Apenas para ilustrar, citem-se o Dyn Corp norte americano que concedeu suporte aéreo e treinamento às forças iraquianas, o sul africano Executive Outcomes que atuou a serviço do Movimento Popular de Libertação de Angola e o russo Wagner que combateu terroristas em Burkina Fasso e se encontra em ação na Ucrânia. Vale destacar que muitos governantes favoráveis ao neoliberalismo, caracterizador da globalização atual, preferem contratar tais grupos porque eles são menos numerosos, mais ágeis, menos dispendiosas e mais eficientes que as Forças Armadas convencionais.

Esta assolação da relevância se mostra também naqueles Estados independentes que preferiram abrir mão de instituições bélicas próprias. Tais são os casos de Mônaco, Ilhas Marshall e Nauru dentre outros, que por acordos firmados recebem proteção militar de outros países, respectivamente da França, Estados Unidos e Austrália.  Há, também aqueles que preferem possuir apenas um aparato policial ou estabelecimentos castrenses bastante reduzidos cujos exemplos são a Islândia que é amparada pela Noruega e Dinamarca e Andorra que é dependente da Espanha.

As Forças de Manutenção de Paz das Nações Unidas, os alcunhados capacetes azuis, existentes desde há muito tempo, são aparatos militares multinacionais a serviço deste órgão mundial. Elas foram criadas para atuar em zonas internacionais de conflito sem o emprego de armas, principalmente na manutenção do cessar fogo e retirada de tropas. Aproximadamente cento e trinta países contribuem com milhares de voluntários e quase setenta operações ao redor do mundo já foram realizadas ou continuam em andamento. Apesar do relevante serviço por elas prestado e do prestígio que desfrutam em todas as nações do planeta, tais forças contribuem para o deperecimento do comando dos países participantes sobre uma significativa parcela de seus militares. Isto também se manifesta nos casos onde ocorre a centralização do poder estratégico anteriormente mencionada. Ademais seus integrantes são instados a praticar ações conciliatórias contrárias ao comportamento guerreiro desenvolvido em suas nações de origem.

Em relação aos equipamentos bélicos, sabe-se que desde fins do século dezenove a produção de material de combate era considerada um ativo nacional apoiado pelos governos nacionais. Entretanto, no período atual, a indústria de segurança sofreu sérias modificações.  Os elevados custos associados ao processo produtivo consolidaram a presença de comunidades colaborativas de segurança internacional, inclusive para minimizar os riscos associados às ações de compra. Ocorreu então uma concentração em determinados países, tais como Estados Unidos, França, Alemanha e Rússia, da capacidade de forjar armamentos. Além disso, passou a vigorar o estabelecimento de parcerias nestas áreas. É o caso dos Estados Unidos e Índia que possuem um acordo para a fabricação de caças de combate. É o caso também da Aliança Aukus integrada pelos Estados Unidos, Austrália e Reino Unido voltada para os armamentos hipersônicos e tecnologia cibernética. É o caso ainda dos países europeus cuja Agência Europeia de Defesa, criada em 2004 tem se dedicado a ajudar os seus membros a desenvolver os respectivos recursos militares bem como os auxiliarem no desenvolvimento das capacidades conjuntas de defesa.

Para os países que não possuem fabricação nacional se instaurou uma situação de enorme dependência não só para a compra de material bélico, mas para a aquisição de peças de reposição, transferência de tecnologia e licenciamento da atividade de coprodução. Assim sendo acontece um evidente comprometimento da capacidade das Forças Armadas autóctones em relação às suas ações de defesa.

Talvez a área mais relevante das Forças Armadas impactada pela globalização seja a da cultura de seus integrantes. O afeto patriótico, isto é, o sentimento de orgulho, de amor e de devoção ao país, que é importantíssimo numa situação de combate, tem se mostrado bastante afetado principalmente por causa da presença de majoritários contingentes multirraciais em detrimento de cidadãos locais. Não é difícil perceber que é muito áspera a tarefa de cultivá-lo num agrupamento composto por pessoas originárias de inúmeras terras natais. Na França se encontra a Légion Étrangère composta por soldados oriundos de dezenas de países, em Israel há nas fileiras drusos, circassianos, beduínos e etíopes e na Nigéria se encontram os povos Hausa, Yoruba, Igbo, Fulani, Ijaw, Kanuri, Ibibio, Tiv e Edo.

O traço neoliberal, ainda marcante da globalização, contribuiu para a troca da conscrição pelo voluntariado atualmente adotado por inúmeros países. Através dela o recrutamento dos interessados passou a levar em conta as peculiaridades do mercado ocupacional civil para conseguir atrair o contingente necessário. Por sua vez, as pessoas passaram a encarar as Forças Armadas apenas como uma opção de trabalho entre as demais, e vista pelo ângulo do individualismo, da auto-realização, dos interesses e aspirações pessoais que são dissonantes do esprit de corps próprios das Forças Armadas. Assim sendo os princípios básicos e tradicionais das instituições castrenses, isto é, a hierarquia ou as relações estáveis de subordinação e ascendência e a disciplina ou a imediata obediência às ordens oriundas dos escalões superiores mais o acatamento irrestrito às leis, entraram em processo de esmorecimento possibilitando a emergência do uso de métodos participativos de gestão e de liderança da tropa. Tal síncope tem sido agravada pela forte presença da sociedade do conhecimento que permite às pessoas receberem múltiplas informações diárias advindas de vários recantos do mundo, as quais colaboram muito para o questionamento dos valores convencionais, inclusive nas organizações bélicas que insistem em mantê-los inalterados.



quinta-feira, 18 de maio de 2023

Iuan supera euro como segunda principal moeda das reservas internacionais do Brasil

Caros Leitores,


No início de 2023, de acordo com relatório recente do Banco Central, o iuan tornou-se a segunda moeda com maior importância nas reservas internacionais brasileiras, ultrapassando, assim, o euro em termos de relevância comercial para o país.


Nesta conjuntura, enquanto se discute a criação de uma moeda comum aos países BRICS, trazemos nesta semana uma notícia que apresenta os principais aspectos do aumento da participação da moeda chinesa nas relações comerciais com o Brasil.


Esperamos que gostem e compartilhem! 


Fernanda Lima é membro do Grupo de Pesquisa em Estado, Instituições e Análise Econômica do Direito.


No início deste ano, a China e o Brasil se moveram para reduzir o domínio do dólar, com um acordo sobre o estabelecimento de medidas de compensação de iuanes para facilitar o comércio e o investimento bilaterais. 

A China é o principal comprador de minério de ferro, soja em grão, carne, açúcar e celulose exportada pelo Brasil.

Em seu relatório anual sobre reservas, o BC informou que não houve variações significativas na composição da carteira em relação ao ano anterior, quando buscou diversificar suas alocações estratégicas, que incluem o aumento da exposição em iuan e também em ouro.

As reservas internacionais totais do Brasil caíram para 324,70 bilhões de dólares em 2022, de 362,2 bilhões de dólares no ano anterior, devido a uma perda de 7,45% nos retornos do portfólio causada pelo aumento da taxa de juros nos Estados Unidos e pela valorização do dólar em relação a outras moedas no período.

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terça-feira, 16 de maio de 2023

Privatização de água e saneamento traz 'sérios riscos de violação de direitos', diz pesquisador

Caros Leitores,


O debate em relação à garantia de direitos fundamentais da população brasileira em face da privatização de setores estatais - como o de saneamento básico e da água - tem levantado questionamentos quanto ao modo pelo qual o Estado pode resguardar as necessidades básicas da população frente ao controle da prestação destes serviços de utilidade pública por companhias privadas.


Diante disso, trazemos uma notícia que expõe as contradições desta transferência de controle nesta esfera e como tal cenário vulnerabiliza a proteção dos direitos fundamentais de grande parte da população.


Esperamos que gostem e compartilhem! 


Fernanda Lima é membro do Grupo de Pesquisa em Estado, Instituições e Análise Econômica do Direito.


Pesquisador do Instituto René Rachou (Fiocruz Minas), o engenheiro Léo Heller é ex-relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para Água e Saneamento e autor de publicações que discutem a água sob diversas perspectivas: saúde coletiva, políticas públicas e direitos humanos.

Nesta entrevista, o estudioso defende que a água e o saneamento são direitos fundamentais que têm sido violados em regiões vulnerabilizadas no país. Ele também aponta as contradições que se descortinam a partir da privatização do abastecimento de água e coleta de esgoto em diferentes estados brasileiros. Segundo ele, governos têm usado a falsa justificativa de universalizar o serviço mais rapidamente e captar recursos para o Estado para entregar o controle da água para investidores internacionais – atrelando esse recurso essencial a interesses do mercado.

"Não há evidências de que a universalização ocorra mais efetivamente em modelos privados do que em modelos públicos de prestação de serviços. Ao contrário, como muitas vezes as empresas privadas buscam maximizar seus lucros, há uma tendência em serem relutantes em colocar serviços em locais onde vivem populações com mais baixa capacidade de pagamento, como em zonas rurais e cidades de menor porte, mas sobretudo em vilas e favelas, onde há também complexidades urbanísticas para a implementação dos serviços", afirma o pesquisador.

Leia a íntegra da entrevista:

Como o acesso à água potável e limpa como direito humano essencial pode ser comprometido quando o Estado perde o controle do serviço de saneamento e distribuição?

Léo Heller: É importante destacar que tanto o acesso à água quanto o aceso ao saneamento (ou esgotamento sanitário) são considerados direitos humanos. Resolução das Nações Unidas de 2010 reconheceu esses direitos, com amplo apoio dos países-membros, inclusive do Brasil.

O marco dos direitos humanos define que são os governos os responsáveis por cumprirem suas obrigações de direitos humanos, sob o risco de violar essas obrigações. Portanto, no campo da água e do saneamento, a presença do Estado é essencial. Esses serviços, por serem monopolizados (há somente um prestador em cada localidade) requerem forte atuação do Estado para regular, fiscalizar e controlar a realização dos direitos humanos. Quando esses serviços são deixados inteiramente sob responsabilidade dos mercados, há sérios riscos de violação de direitos.

O que a legislação brasileira garante à população no que diz respeito ao acesso à água potável?

A legislação brasileira ainda não reconhece água e saneamento como direitos humanos. Existem duas PECs tramitando, ainda sem decisão final. A legislação federal relativa ao saneamento básico tem alguns alinhamentos com o marco dos direitos humanos, mas não é explícita em relação a eles e tampouco abarca esse marco de forma abrangente, apenas em alguns tópicos selecionados. Alguns avanços da legislação dizem respeito à meta de universalização do acesso e alguma atenção a populações que vivem em situação de vulnerabilidade. No entanto, é ambígua sobre as formas para se atingir isto.

Quais são os principais modelos de privatização da água que têm sido operados no Brasil?

Têm sido principalmente modelos de concessão, nos quais os municípios aceitam delegar a prestação de serviços para empresas privadas por longos períodos, entre 30 e 35 anos. Tem havido também discussões acerca da "venda" de companhias estaduais, mas, ainda assim, os novos proprietários atuariam nos municípios, que são os titulares de serviços, herdando as concessões já operadas por essas companhias estaduais.

Alguns dos defensores da privatização de companhias de tratamento de distribuição da água alegam que essa é uma forma de universalizar o serviço mais rapidamente. Nos casos de empresas já privatizadas essa lógica foi comprovada?

Não há evidências de que a universalização ocorra mais efetivamente em modelos privados do que em modelos públicos de prestação de serviços. Ao contrário, como muitas vezes as empresas privadas buscam maximizar seus lucros, há uma tendência em serem relutantes em colocar serviços em locais onde vivem populações com mais baixa capacidade de pagamento, como em zonas rurais e cidades de menor porte, mas sobretudo em vilas e favelas, onde há também complexidades urbanísticas para a implementação dos serviços.

Quais os interesses em jogo com o marco legal aprovado no Senado em 2020, sobre a contratação de empresas de saneamento?

Nitidamente, é uma lei privatista, que modela o setor para uma ampliação da privatização em larga escala. A concepção da lei é de regionalizar os estados, formando grupos de municípios, e transferir a prestação dos serviços em cada região para empresas privadas, colocando de lado as companhias estaduais e substituindo serviços municipais. A aprovação da lei foi precedida pela ação de poderosos lobbies das empresas privadas, influenciando o governo federal e parlamentares e contando com toda a imprensa dominante como seu braço midiático. Os grandes veículos tradicionais de imprensa propalaram a reforma promovida pela lei como a única saída para superação dos déficits em saneamento, sem dar  voz a opiniões dissonantes.

Quais foram as principais consequências do processo de concessão da gestão da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) para os municípios e a população que eram atendidos pela empresa no Rio de Janeiro?

Esse é um processo ainda em andamento e difícil de avaliar como se desenvolverá até o final. De qualquer forma, examinando todo o processo de licitação dos lotes no estado, existem preocupações quanto a, por exemplo, aumentos desproporcionais de tarifas, baixa aplicação da tarifa social, insuficientes investimentos em vilas e favelas, não reconhecimento do direito de acesso aos serviços em assentamentos informais, baixa atenção a cidades de menor porte e menos rentáveis, além da regulação de baixa qualidade e capturada pelos prestadores de serviços.

Existe algum estudo que indica a porcentagem de aumento de tarifas nos casos de privatização das companhias de distribuição?

É muito variável, mas nossos estudos vêm constatando tarifas maiores quando a prestação de serviços é privada. De qualquer forma, existem muitos fatores que influenciam as tarifas após início da prestação privada, como as estruturas de tarifas anteriores, os reajustes e revisões de tarifas previstos em contrato e o papel das agências reguladoras.

Como os tratados estabelecidos pela ONU têm contribuído para o desenvolvimento progressivo dos direitos humanos no que diz respeito ao acesso à água? Quais os desafios para o desenvolvimento de pactos mais efetivos?

A influência dos tratados internacionais sobre as políticas nacionais muitas vezes leva algum tempo para se fazer sentir. Existe uma influência no plano simbólico: a partir do reconhecimento da água e saneamento como direitos humanos, mais e mais países e atores sociais começam a utilizar a terminologia, se apropriar de seu conteúdo e alinhar suas ações a esse marco. Outra influência é mais concreta: muitos países alteraram suas constituições para reconhecer esses direitos. As mudanças constitucionais têm efeito importante, porque vinculam o Judiciário em suas decisões e pautam políticas públicas. Ainda precisaremos de mais tempo para ver os direitos humanos à água e ao saneamento se concretizarem plenamente e dependerá de que todos os atores da sociedade, com capacidade de influência sobre o setor, tenham esse marco como a principal orientação de suas ações.

Como o Brasil tem se posicionado no movimento internacional de defesa do direito humano à água?

Depende do governo federal da época e da sua política de relações exteriores. Os governos Lula e Dilma foram proativos e apoiaram esses direitos, sem nenhuma ambiguidade. As políticas no governo Temer foram menos assertivas. E, como sabemos, direitos humanos foram um conceito rejeitado no governo Bolsonaro, cuja política internacional foi absolutamente desastrosa, sobretudo nos primeiros anos, com o ministro Ernesto Araújo.

Na sua opinião, quais os principais caminhos para se democratizar e universalizar o direito à água potável no Brasil, se levarmos em consideração as grandes dimensões do país e a quantidade de destinos ainda sem estrutura básica de canalização e saneamento?

Essa complexidade, que você aponta com muita precisão, realmente é um desafio para se assegurar a universalização em todos os contextos. Outro fator que torna desafiantes esses caminhos é a estrutura federativa brasileira, em que o município é o titular dos serviços, os estados não têm em geral papel muito claro e a União tem a responsabilidade de formular e coordenar a política nacional e de alocar recursos financeiros. Devido a essa complexidade, uma política nacional clara, que parta de um diagnóstico preciso das carências e dos gargalos do setor, é essencial. Essa política necessita ter como pano de fundo um planejamento estratégico, que está dado com o Plansab, mas que não tem sido observado.

É necessário ainda haver muita clareza sobre como e para quem alocar fundos públicos, fugindo da lógica imediatista e pontual das emendas parlamentares. É importante ainda o fortalecimento dos prestadores locais e garantir independência aos reguladores. Em síntese, é necessário um conjunto articulado de medidas, que foram muito bem apontadas pelo Plansab. Sabemos da receita, mas ainda não temos quem as implemente de forma completa e integrada. Existe grande expectativa de que a nova Secretaria Nacional de Saneamento, no âmbito do Ministério das Cidades, cumpra um papel central nesses aspectos.

Qual o papel das organizações da sociedade civil e movimentos populares nesse cenário?

A sociedade civil tem papel central. Não há política de saneamento básico efetiva sem participação social. A sociedade é quem deve pautar as decisões de políticas públicas em suas várias escalas, da local à internacional, pois ela é quem sente os efeitos das carências em água e saneamento. É a sociedade civil também que tem cumprido um papel de resistência contra políticas regressivas, como a ampla privatização dos serviços promovida e estimulada pelo governo anterior.

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terça-feira, 9 de maio de 2023

O desafio de distribuir a renda no Brasil

(Gráfico 1)

A distribuição funcional da renda refere-se à repartição da renda gerada na economia pelos fatores utilizados na produção. O termo funcional indica que a repartição da renda é determinada de acordo com a função desempenhada pelos agentes no processo produtivo, se proprietários de capital, da força de trabalho ou responsável pela arrecadação e alocação dos impostos. Tais relações contribuem para a avaliação dos padrões distributivos nas sociedades.

Considerando que as remunerações incluem os salários e as contribuições sociais recebidas pelos assalariados e o excedente operacional é o rendimento das empresas (financeiras e não financeiras), dos proprietários de imóveis, de terras e de outros ativos; e que a renda gerada na economia também inclui o montante destinado aos impostos sobre a produção, as condições econômicas e sociais são determinantes para o resultado da distribuição funcional. Fatores como a organização produtiva, o peso e a forma de tributação, o valor do salário mínimo e o grau de organização sindical, bem como os efeitos de políticas econômicas, têm impactos sobre como a renda é distribuída entre os distintos agentes institucionais.

O estudo da distribuição funcional é importante sobretudo para países que historicamente apresentam renda desigual, como o caso do Brasil. Internacionalmente, este tema está no âmbito da Agenda 2030 para o acompanhamento de indicadores sociais, econômicos e ambientais dos países membros da ONU. O indicador “participação das remunerações do trabalho no PIB” faz parte do Objetivo 10: “Reduzir a desigualdade dentro dos países e entre eles”.

Como evoluiu a distribuição funcional no Brasil nos últimos anos? A política de valorização do salário mínimo contribuiu, de fato, para uma melhor distribuição funcional da renda? Como foi sua trajetória depois do fim do ciclo de crescimento econômico do país, após 2014? E, em seguida, durante o aprofundamento da crise econômica e da estagnação que o Brasil viveu nos anos seguintes? Utilizando a nomenclatura apresentada por Pochmann (2022), em que o período recente da história política brasileira é classificado em mandatos presidenciais denominados Neoliberal (1994-2002), Trabalhista (2003-2015) e Ultraliberal (2016 em diante), a pergunta adicional é se as distintas tendências políticas que governaram o país entregaram resultados diferenciados para a participação da remuneração do trabalho no PIB brasileiro.

Os resultados, obtidos a partir da base de dados do Sistema de Contas Nacionais do IBGE, indicam que houve queda da participação da remuneração do trabalho até 2004, sendo que após esse ano, ao contrário, houve permanente tendência de crescimento que vigorou até 2015. De 2016 em diante, entretanto, a remuneração do trabalho sobre o PIB assumiu tendência inversa, com estagnação e posterior redução até 2020, último ano disponível.

O comportamento favorável aos trabalhadores, entre 2004 e 2015, pode ser atribuído a fatores externos e internos. Em um primeiro momento, prevaleceu o crescimento da economia mundial e o aumento das exportações brasileiras, o que beneficiou a economia dos países emergentes. Entretanto, após a crise internacional de 2008 e a retração dos mercados mundiais, foram os aumentos reais do salário mínimo, a consolidação de programas sociais reconhecidos e a expansão do investimento público que estimularam a demanda doméstica e propiciaram o aquecimento da economia que, por sua vez, sustentou a criação de vagas formais no mercado de trabalho. Embora tenha beneficiado o trabalhador, este aquecimento do mercado interno foi também positivo para empresas, pois as vendas de bens e serviços cresceram, assim como o excedente operacional em termos absolutos.

A comparação internacional mostra que, em um ranking de 50 países da base de dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil avançou da 38ª para a 28ª posição na participação da renda do trabalho, entre 2004 e 2015. Entretanto, com a drástica reversão nos anos seguintes, entre 2016 e 2020, o Brasil perdeu o que foi conquistado e voltou para a 38ª posição no ranking. Nacionalmente, a participação da remuneração do trabalho retornou ao nível de 2010, revelando uma década perdida nesse indicador (Gráfico 1).

Após o final da gestão da presidenta Dilma, no início de 2016, uma série de políticas econômicas contra os trabalhadores foram rapidamente implementadas. Dentre elas, destaca-se a reforma trabalhista, que tornou os trabalhadores mais vulneráveis com a possibilidade de terceirização irrestrita e a adoção dos contratos intermitentes de trabalho. O fim da regra de reajuste real do salário mínimo, referência para a maioria dos empregados formais e até mesmo informais, e a aprovação da Emenda Constitucional do Teto dos Gastos Públicos, que inibe o investimento e a geração de empregos fomentada pelo Estado, foram duas outras medidas que prejudicaram a destinação da renda gerada aos trabalhadores.

O conjunto dessa obra, compilada sob o nome de “Ponte para o Futuro”, apresentada no governo Temer e continuada no governo Bolsonaro, trouxe nítido desaquecimento da economia, deterioração do mercado de trabalho e – talvez o pior dos efeitos – rigidez para que as rendas geradas pela atividade econômica sejam repartidas com mais equilíbrio entre capital e trabalho. A aprovação, já em 2021, da autonomia (em relação ao governo eleito) do Banco Central, órgão que define a taxa básica de juros vigente no país, foi mais uma medida que proporciona aos detentores de capital margens maiores na distribuição da renda.

Dessa forma, além de intensos, os efeitos contrários a uma melhor distribuição poderão ser duradouros, independentemente do governo que esteja no comando do Poder Executivo Federal. A indução do crescimento via gastos públicos é importante instrumento para qualquer país, sobretudo para os menos desenvolvidos e com alto grau de carências sociais, como o Brasil. A coordenação de políticas monetária e fiscal com o Banco Central e a efetiva distribuição de renda com programas sociais e com aumentos reais dos salários, bem como o fortalecimento da ação sindical são fundamentais para a retomada da melhoria da distribuição funcional da renda no Brasil.

Para tanto é necessário que se adotem medidas que favoreçam a remuneração do fator trabalho, responsável por cerca de 75% da renda total das famílias brasileiras. Dentre elas destacamos:

  • Aumentar gastos de investimento e custeio dos equipamentos públicos;

  • Rever a regra de reajuste do salário mínimo, passando a conceder novamente aumentos acima da inflação;

  • Reduzir juros em uma ação coordenada entre o governo e o Banco Central;

  • Fortalecer os sindicatos e proteger os trabalhadores, sobretudo os mais vulneráveis;

  • Implantar uma reforma tributária progressiva com o objetivo de desonerar o consumo e aumentar a tributação da renda e do patrimônio.

O governo Lula, marcado por ter conquistado, no passado, resultados favoráveis à classe trabalhadora, crescimento econômico e melhor distribuição da renda, será capaz de enfrentar tal desafio. Mas, dadas as dificuldades estabelecidas após anos de retrocesso político, será necessário um amplo apoio das forças progressistas para sua realização.

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terça-feira, 2 de maio de 2023

Brasil, China, Rússia e Índia devem lançar moeda própria em agosto

Caros Leitores,


O agrupamento dos países que configuram o BRICS, composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, deve apresentar em agosto uma proposta de emissão de uma moeda comum entre as nações, visando diminuir a dependência econômica do bloco em relação ao dólar americano.


Para compreender melhor esse processo, trazemos essa semana uma notícia debatendo os principais impactos e quais as perspectivas que se abrem diante dessa nova modalidade a ser implementada nas transações entre os países BRICS.


Esperamos que gostem e compartilhem! 


Fernanda Lima é membro do Grupo de Pesquisa em Estado, Instituições e Análise Econômica do Direito.


A união dos países formados pelo BRICS, composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, deve apresentar em agosto uma proposta de emissão de uma moeda comum entre as nações, diminuir a dependência econômica do dólar americano.

O grupo argumenta que a dependência do dólar deixa os países a merce das políticas americanas e isso tem prejudicado relações comerciais entre as nações. Além disso, argumentam que o uso de CBDCs entre os participantes dos BRICS pode reduzir custos e aumentar a eficiência dos pagamentos cross border.

Os BRICs tem ganhado cada vez mais espaço e influência na economia global. De acordo com a empresa de pesquisa macroeconômica Acorn Macro Consulting, o bloco BRICS atualmente responde por 31,5% do Produto Interno Bruto (PIB) global, ultrapassando as economias do G7, que representam 30,7%.

Dólar perdendo força

Este crescimento constante é atribuído ao avanço da economia chinesa, que superou o PIB dos Estados Unidos segundo a paridade do poder de compra (PPP) em 2014. A previsão é que a diferença entre os dois grupos só aumente nos próximos anos, tendo em vista que cada vez mais países estão interessados em se unir ao BRICS.

Além disso, economias importantes como Arábia Saudita, Egito e Bangladesh já adquiriram participação no Novo Banco de Desenvolvimento, financiador do BRICS, e outros países como Irã, Argélia, Argentina e Turquia também têm expressado interesse em se juntar ao grupo.

A proposta de emissão de uma moeda própria entre os membros dos BRICs remonta a julho de 2022, quando o tema ganhou corpo pela primeira vez e foi bem recebido pelas nações integrantes do bloco.

Recentemente, o presidente Xi da China e o presidente Putin da Rússia decidiram promover o yuan chinês como moeda de liquidação entre a Rússia e as economias emergentes da América Latina, Ásia e África.

O Brasil seguiu um exemplo parecido e fechou nesta semana um acordo comercial com a China que prevê que os pagamentos entre as nações sejam realizados com Real e Yuan, sem a necessidade do dólar.

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