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quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Por que a China não quer que suas grandes empresas invistam no exterior



Olá Alunos,

A notícia de hoje tem como objetivo mostrar um pouco do protecionismo Chinês e como isso influencia no mercado externo. 

Espero que gostem e participem,.
Ramon Reis, monitor da matéria "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.

A China anunciou neste ano que destinará US$ 124 bilhões (cerca de R$ 400 milhões) para investir globalmente em uma iniciativa chamada de Nova Rota da Seda. Mas por que o país está limitando os investimentos de suas grandes empresas no exterior?
Parte da resposta se encontra no centro de Madri, na Espanha, num arranha-céu que simboliza uma das maiores preocupações do gigante asiático.
O edifício Espanha foi adquirido em 2014 pelo grupo empresarial chinês Wanda, um conglomerado com investimentos em imóveis, turismo e lazer que pertence ao segundo homem mais rico do país, Wang Jianlin.

Na época, Wang provavelmente pensou que tinha feito um bom negócio: ele pagara 265 milhões de euros (cerca de R$ 990 milhões, em valores atuais) no imóvel - um terço menos do que o valor pago pelo proprietário anterior. Mas às vezes o barato sai caro. Quando Wanda comprou o prédio, ele estava abandonado há quase uma década e precisava de uma reforma integral.
Os técnicos então avaliaram que o melhor a ser feito era demolir o edifício e reconstruí-lo. A prefeitura de Madri, por sua vez, reagiu firmemente: se tratava de um dos edifícios mais emblemáticos da cidade e estava protegido pela legislação como patrimônio histórico.
A Wanda prometeu que a reconstrução respeitaria o projeto original. Mesmo assim, o governo local insistiu que a fachada do prédio fosse preservada, embora isso nunca tenha sido feito antes, e especialistas não pudessem garantir que a obra fosse ser bem sucedida, diante do tamanho do edifício.
Três anos depois, Wanda entregou os pontos e pôs o imóvel à venda. Segundo a imprensa chinesa, a aventura espanhola custou ao empresário cerca de US$ 30 milhões (cerca de R$ 100 milhões).

Compras compulsivas


Nos últimos anos, empresas chinesas protagonizaram uma onda de compras ao redor do mundo.
A China - que tenta ser uma economia de mercado, mas sem renunciar aos rígidos controles governamentais- reduziu restrições para investimentos de empresas chinesas no exterior na última década.
O objetivo era evitar que as reservas de divisas estrangeiras no país chegassem a um volume incontrolável e também facilitar a aquisição de recursos e tecnologia que permitissem às empresas crescer.
Mas essa etapa parece estar chegando ao fim, já que o governo de Xi Jinping começou, no ano passado, a impor limites que foram ainda mais reforçados na última semana.
"Ele pediu ao setor bancário para ficar alerta para o bem de todos os chineses", disse à BBC Kent Deng, professor de História da Economia da London School of Economics.
O organismo responsável pelo setor bancário determinou que os bancos avaliassem como estão expostos às grandes empresas, ou seja, que consequências sofreriam, caso essas companhias entrassem em crise.
As autoridades não informaram exatamente de que empresas se tratavam, mas as ações da Wanda e dos grupos Fosun e HNA começaram a cair dias depois.
"O dinheiro deve permanecer na economia nacional. Qualquer quantia grande que saia das fronteiras está sujeita ao controle do regulador financeiro desde o último dia 1º de julho", disse Deng.

Investimentos irracionais



Somente em 2016, os investimentos chineses no exterior cresceram para mais de US$ 169 bilhões (cerca de R$ 550 bilhões) no ano, segundo dados do centro de estudos American Enterprise Insitute (AEI).
Neste ano, a quantidade de investimentos anunciados foi ainda maior. Mas quantidade e qualidade são coisas diferentes, e o padrão qualitativo desses aportes não convenceu as autoridades asiáticas.
Segundo o jornal Washington Post, o ministro chinês do Comércio, Zhong Shan, qualificou os investimentos feitos no ano passado como "cegos e irracionais".
Embora tenha admitido que poucas empresas tivessem cometido esses "erros", ele foi contundente: "Algumas já pagaram o preço."
O ministro ainda lamentou que diversas empresas "tiveram impacto negativo na nossa imagem nacional".
O presidente do Banco Popular Chinês foi mais explícito, e afirmou que essas empresas não cumpriam exigências e políticas para investimentos no exterior, já que visavam a setores "que não trazem muito benefício à China", como esportes e entretenimento.
"Projetos de investimento como estes são vistos como um vazio legal para lavagem de dinheiro e saída de capitais", disse Deng.

Uma moeda internacional


A China quer evitar em seu território situações como as que viveu o Japão ou os Estados Unidos.
Por exemplo, empresas americanas acumulam cerca de US$ 2,6 trilhões no exterior (cerca de R$ 8,5 trilhões), segundo a consultoria Capital Economics. Trata-se de dinheiro obtido pelos lucros de suas operações no exterior e que não foi repatriado para evitar a cobrança de impostos por autoridades fiscais americanas.
"As reservas de divisas estrangeiras na China caíram muito rapidamente e são necessárias para dar apoio ao yuan na tentativa de torná-lo uma moeda internacional", afirma Deng.
Apesar das advertências e medidas chinesas, algumas empresas continuaram anunciando investimentos. Algo que, segundo Deng, acabaram tendo que cancelar.
"Os investimentos recentes serão cancelados pelo Estado de forma unilateral", disse.
"Empresas chinesas pararam com essa onda de compras descontroladas. Na verdade, aquelas firmas bem informadas e conectadas completaram antes do fim de 2016 todas as compras que interessavam", garantiu.
Para ele, as restrições anunciadas pelo governo são "muito pequenas e chegam tarde demais".
Então por que a China impulsiona uma campanha de investimentos globais para a qual destina milhões de dólares?
Porque o país asiático quer ter operações no exterior, mas em setores que lhe interessam. A Nova Rota da Seda está dedicada a investimentos em infraestrutura.
"A maioria desses projetos ajudam a China a exportar o seu excedente de aço, cimento, locomotivas, navios, barcos e contêineres. Estes são os projetos que se promovem nas mais altas esferas", concluiu Deng.



segunda-feira, 28 de agosto de 2017

É chegada a hora de pressionar por uma política de economia solidária





Olá Alunos,

A notícia de hoje traz uma visão panorâmica do que consiste a economia solidária e como ela pode ser desenvolvida. A Economia Solidária é também uma atividade que estimula a cidadania ao fomentar valores como solidariedade, cooperação, diálogo e democracia, define o parecer à CCJ (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara) de autoria da deputada Maria do Rosário.

Espero que gostem e participem.
Ramon Reis, monitor da matéria de "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.


Estima-se que a Economia Solidária no Brasil, incluindo cooperativas e empreendimentos solidários, formalizados ou não, seja responsável por cerca de 3% do PIB nacional, envolvendo mais de três milhões de pessoas¹
Apesar desse número ser nada desprezível, quem gira essa economia tem muitas dificuldades em seu dia a dia, seja porque a Economia Solidária não é reconhecida e respaldada por uma política pública que defina princípios e parâmetros para seu exercício, seja pelas dificuldades que isso gera em relação a obtenção de crédito e de incentivos governamentais.
O termo Economia Solidária foi usado de modo pioneiro por Paul Singer em 1996, em artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo, intitulado “Economia Solidária contra o desemprego”. No atual momento de crise política, econômica e social enfrentado pelo Brasil, mais do que nunca a Economia Solidária mostra-se necessária.
Um amplo processo de mobilização envolvendo o movimento de Economia Solidária no país, incluindo conferências, discussões no Fórum Brasileiro de Ecosol, mobilizações das centrais de cooperativas e audiências públicas definiu, desde então, a necessidade de criação de uma política pública, que começou a ser desenhada com a criação da Secretaria Nacional da Economia Solidária (SENAES) em 2003, que por quase toda sua existência foi conduzida por Paul Singer.
Nesse caminho de fortalecimento e conquistas foi criado o Cadsol (Cadastro Nacional de Empreendimentos Econômicos Solidários), “com o objetivo de permitir aos empreendedores solidários o acesso às políticas públicas nacionais de ES e demais políticas e programas públicos de financiamento, crédito, aquisição e comercialização de produtos e serviços”.²
Destacam-se também nesse movimento estratégias de expansão das políticas públicas, com a criação de legislação e conselhos de Economia Solidária, com ações em cerca de 17 governos estaduais, homologação de leis estaduais e municipais, celebração de convênios da SENAES com municípios e estados, editais e apoio a centenas de projetos.
Esse processo também incluiu a implantação da rede de Centros de Formação em Economia Solidária em todo o país e a parceria da SENAES com a Agência de Desenvolvimento Solidário garantiu condições para desenvolver o Projeto Integração de Redes Solidárias, com objetivo de fortalecer a organização de redes de cooperação por meio da valorização de protagonismos, buscando ampliação da sustentabilidade e articulação em torno do desenvolvimento territorial e alternativas de inclusão produtiva.
Faltava aqui um marco legal, capaz de proporcionar mais segurança jurídica às ações e políticas de Economia Solidária, e assim, em meio a toda essa movimentação. O Projeto de Lei (PL) nº 4.685, de 2012, de iniciativa coletiva dos deputados Paulo Teixeira, Eudes Xavier, Padre JoãoLuiza Erundina, Miriquinho Batista, Paulo Rubem Santiago, Elvino Bohn Gass e Fátima Bezerra, dispõe sobre a Política Nacional de Economia Solidária e os empreendimentos solidários, estabelecendo definições, princípios, diretrizes, objetivos e composição da Política Nacional de Economia Solidária. Cria ainda o Sistema Nacional de Ecosol e qualifica os empreendimentos econômicos solidários como sujeitos de direito, visando fomentar essa economia e assegurar o direito ao trabalho associado e cooperativado.
O PL nº 4.685, de 2012 está pronto para ser apreciado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara, e é o momento de pressionarmos os deputados a apreciarem a matéria. Esse PL é resultado de todo o amplo processo de mobilização de entidades e pessoas da Economia Solidária no país, e é fundamental apoiarmos esse movimento de avanço, apesar dos retrocessos, visando garantir um marco regulatório para essa economia, dando segurança jurídica às políticas públicas.
A Economia Solidária é também uma atividade que estimula a cidadania ao fomentar valores como solidariedade, cooperação, diálogo e democracia, define o parecer à CCJ de autoria da deputada Maria do Rosário. Destaca ainda o parecer da deputada: “por meio do reconhecimento da economia solidária como importante política pública, a presente proposição prevê vários estímulos aos diferentes aspectos que englobam esta atividade, tais como em relação à educação, profissionalização, cidadania e preservação do meio ambiente, o que vai ao encontro dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, tais como a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, previstos no Art. 1º da Constituição Federal. Trata-se, em verdade, de uma proposição que honra esta casa e todos aqueles preocupados com a melhoria da qualidade de vida do povo brasileiro”.
O PL prevê a criação do Fundo Nacional de Economia Solidária (FNAES), com objetivo de centralizar e potencializar os recursos a serem investidos no desenvolvimento dessa economia, buscando soluções para as dificuldades de natureza financeira dos empreendimentos. Outros empecilhos apontados ao desenvolvimento da Economia Solidária, como carência de treinamento e reconhecimento social, serão também contemplados pela implantação da lei, que por si só implicará maior aceitação social dos empreendimentos solidários e uma maior criação de empregos.
Diante do atual quadro de supressão de direitos dos trabalhadores e trabalhadoras com as reformas trabalhista e da previdência, encaminhada a toque de caixa sem a promoção do devido debate junto à sociedade brasileira, a aprovação desse PL é fundamental para garantir mais oportunidades de forma equânime, socialmente justa e ambientalmente equilibrada.
A SENAES também padece nesse quadro e tem passado por retrocessos desde 2015, com a mudança da conjuntura nacional, tendo sido reduzida a uma subsecretaria dentro do Ministério do Trabalho, incluindo aqui também a demissão de Paul Singer.
Depois de um movimento de muita conquista, não é possível arrefecer frente a esses retrocessos.
É preciso pressionar deputados e deputadas a apreciarem essa matéria na CCJ o mais rapidamente possível! A manutenção das políticas públicas de Economia Solidária e de tudo o que foi construído ao longo dos anos é fundamental para redução da exclusão e da precarização do trabalho.
Para conhecer o inteiro teor do projeto: https://goo.gl/3np4DF
Para contatar deputados e deputadas e solicitar a aprovação do PL: https://goo.gl/9sKhy2
Para enviar um e-mail pedindo que se coloque em pauta e aprove o PROJETO DE LEI N.º 4.685-C, DE 2012, para garantir segurança jurídica e criação do Sistema Nacional de Economia Solidária: https://goo.gl/5PrRgm

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Por que Portugal é elogiado ao mesmo tempo pela esquerda e pelo FMI por sua recuperação econômica



Olá Alunos,

A matéria de hoje traz como Portugal vem se reconstruindo após uma grave crise e o porquê do país chamar de especialistas.

Espero que gostem e participem,
Ramon Reis, monitor da matéria "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.

Após anos de uma grave crise econômica que fez o desemprego e o deficit público dispararem, Portugal vem chamando a atenção de especialistas ao redor do mundo por sua surpreendente recuperação e pela forma como ela se tornou possível.
Liderado por uma coalizão de partidos de esquerda, o governo português rejeitou a receita de austeridade imposta por credores internacionais. E, mesmo assim, ganhou o endosso de órgãos ortodoxos como o Fundo Monetário Internacional (FMI).
Portugal conseguiu "um progresso louvável ao enfrentar os riscos de curto prazo", escreveu a organização em um comunicado divulgado no dia 30 de junho.

Perto da falência

Diante de uma precária situação econômica, Portugal pediu em 2011 um resgate de € 78 bilhões (R$ 285 bilhões) ao trio de credores composto por FMI, Comissão Europeia e Banco Central Europeu.
Em contrapartida, foram impostas duras condições fiscais, que o então governo conservador buscou cumprir. Milhares de trabalhadores acabaram demitidos, salários foram reduzidos e até datas festivas foram canceladas para tentar evitar a falência do país.
Mas o desemprego seguia crescendo, atingindo o pico de 16,2% em 2013 - maior do que o atual índice brasileiro, de 13,7%. E a economia viu uma queda de 3,6% em 2012, a maior da década.
Os portugueses rejeitaram as medidas de austeridade em 2015, quando elegeram uma coalizão de partidos de esquerda, um resultado eleitoral que despertou apreensão nos mercados internacionais e de parte da população.
Críticos previam que a aliança não se sustentaria até o final do mandato, ou que a situação econômica pudesse piorar.
"Era uma novidade política em Portugal", afirmou à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, André Freire, especialista do Instituto Universitário de Lisboa.
"As políticas que o governo de Antonio Costa (primeiro-ministro do país) implementou iam contra a receita tradicional. Elas reverteram os cortes salariais do governo anterior", explica Freire. "Não é que houve aumento dos salários. Simplesmente foram recuperados os cortes que ocorreram durante o período do resgate."
O governo restaurou a jornada de trabalho de 35 horas semanais para empregados públicos, que tinha sido elevada para 40 horas em 2013. Além disso, recuperou os valores da aposentadoria e do salário mínimo - reduzidos pela gestão anterior.
Ainda assim, os programas sociais foram implementados de maneira "fiscalmente responsável", avalia Freire. Eles foram combinados a outros cortes no gasto público, permitindo que Portugal mantivesse os objetivos de redução do deficit impostos pelos credores.
Em 2016, as receitas turísticas avançaram 10,7%, atingindo € 12,6 bilhões - o maior crescimento absoluto dos últimos dez anos, segundo o governo.
O FMI menciona ainda o aumento das exportações, estimulado pela recuperação do euro.
Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), Portugal vem estabilizando sua balança comercial com o aumento das exportações de bens e serviços desde 2009, em especial para Angola e Espanha.

Índices mais estáveis

O governo Costa celebra o crescimento econômico de 2,8% no primeiro trimestre e o índice de desemprego de 9,5% registrado em abril, o menor desde dezembro de 2008, segundo o INE.
Com esse novo panorama, o ministro alemão da Fazenda Wolfgang Schauble, conhecido por defender fortes medidas austeras na Europa, inesperadamente deu o título de "Cristiano Ronaldo dos ministros da Fazenda europeus" a Mario Centeno, que ocupa o cargo em Portugal.
Não está claro até agora, no entanto, se esse desempenho econômico será duradouro. "As tendências recentes são boas, mas existem problemas, sem dúvida", avalia Freire.
"Em 40 anos de vida democrática de Portugal, é a primeira vez que uma aliança entre a esquerda moderada e radical forma um governo nacional, o que surgiu como reação às medidas extremas de austeridade que a direita quis impor", acrescenta o especialista.

Enquanto isso, a dívida pública ainda segue elevada, chegando em 2016 a € 240 bilhões, o equivalente a 130% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.
Também é difícil garantir que sua fórmula serviria a outra nação.
Freire é cauteloso ao estabelecer paralelos entre Portugal e, por exemplo, a Grécia, país ao qual foi comparado no auge da crise.
"A situação grega era mais grave que a portuguesa, para começar. O deficit fiscal era mais alto", lembra o especialista. "E os gregos também vinham alterando a contabilidade. Havia um problema de confiança."
Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o deficit grego teve pico de 15,9% do PIB em 2009, período em que Portugal registrou 10%. Um ano depois, foi descoberta uma manipulação das estatísticas econômicas da Grécia para esconder o rombo.

domingo, 20 de agosto de 2017

As grandes empresas e a corrupção




Olá Alunos,

A notícia de hoje vem nos dizer qual é o papel das grandes empresas neste turbilhão de escândalos ao qual vemos diariamente nos meios de comunicação. O foco das notícias, propositalmente, é nos servidores públicos e políticos que praticaram os ilícitos. Apenas recentemente, em razão de vários escândalos e denúncias, é que começa a surgir o papel das grandes empresas nesse processo todo.

Espero que gostem e participem.
Ramon Reis, monitor da matéria "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.

Todos os dias, os jornais impressos e os noticiários de televisão apontam mais alguém como corrupto graças às delações estimuladas pela Lava Jato e outras investigações. A rigor, todos os partidos estão envolvidos e as figuras mais proeminentes entre os políticos, a começar pelos presidentes da República, do Senado e da Câmara dos Deputados, são acusadas de receber propina para influir, de maneira ilícita, em decisões que favorecem interesses empresariais.
O foco das notícias, propositalmente, é nos servidores públicos e políticos que praticaram os ilícitos. Apenas recentemente, em razão de vários escândalos e denúncias, é que começa a surgir o papel das grandes empresas nesse processo todo. Hoje, sabe-se que a corrupção é uma prática generalizada entre as grandes empresas, que não conhecem limites para maximizar seus ganhos.
A corrupção é um fenômeno internacional. Nada menos que 25% do PIB mundial estão escondidos em paraísos fiscais por empresas que dessa forma sonegam impostos. No Brasil não é diferente. A Global Finance Integrity, uma instituição internacional de controle do fluxo internacional de capitais, estimou em R$ 660 bilhões a evasão fiscal no Brasil entre 2003 e 2012, para não pagar impostos.1
Alguns escândalos recentes tiveram grande visibilidade. Em 2012 foi denunciada a manipulação da taxa Libor por vinte dos maiores bancos internacionais. A taxa Libor determina a remuneração dos empréstimos a bancos, que precifica os juros pagos pelo setor produtivo e pelos consumidores. Sua manipulação assegura elevados ganhos para esses grandes bancos. Outro exemplo recente, denunciado em 2015, é o da Volkswagen, que fraudou os resultados do controle de emissão de poluentes em motores a diesel em 11 milhões de veículos. Os casos são inúmeros, mas o importante é reconhecer que a corrupção é um expediente ilegal das grandes empresas para aumentar seus ganhos. Os limites para coibi-la são dados por leis e pelo exercício por parte do Estado da fiscalização e do controle para fazer cumprir as leis. Quanto mais democracia, maior o controle político sobre as grandes empresas e menor a corrupção.
A mudança nos últimos anos está na força crescente desses grandes grupos econômicos, muitos dos quais com faturamentos anuais maiores que o PIB de muitos países. Tendo à frente os grandes bancos, essas corporações multinacionais controlam hoje instituições multilaterais, como o FMI, o Banco Mundial, o Banco Central Europeu e, inclusive, a ONU. E passam também a controlar governos. Vários dos principais quadros de governo nos países que sofreram ajustes estruturais recentes, como Grécia, Portugal e Itália, vêm do mundo das finanças e tiveram passagem pelo Goldman Sachs, um dos mais importantes bancos internacionais de investimentos.
Se temos como paradigma o controle pela democracia da voracidade das grandes empresas, o que vemos hoje é uma inversão dos termos. As grandes empresas passaram a controlar a democracia.
No Brasil isso fica claro nas eleições de 2014. Investindo cerca de R$ 5 bilhões, dez grandes grupos econômicos elegeram 70% do Congresso Nacional. O financiamento foi direto aos candidatos, e os partidos políticos se tornaram irrelevantes. Esses grupos passaram a controlar o Legislativo. Some-se a isso o fato de que os atuais ministro da Fazenda e presidente do Banco Central são seus representantes no governo.
Assim, temos os interesses dessas grandes empresas e desses grandes bancos dos dois lados do balcão. Explica-se assim a maioria parlamentar conservadora que consegue quórum para fazer mudanças em nossa Constituição, como a PEC que congela os gastos públicos por vinte anos. Não são os parlamentares os proponentes, eles apenas cumprem ordens.
O fato é que a democracia que temos e suas instituições foram capturadas pelo poder econômico e deixaram de defender o interesse público. Resgatar a democracia e recuperar o controle político e democrático sobre a economia torna-se o grande desafio do presente.
Curiosamente, essa proposição de os Estados readquirirem o poder de controlar o grande capital não é uma proposta somente das esquerdas. A revista conservadora The Economist, algumas edições passadas, propôs em editorial denominado “True progressivism” que a situação atual só se resolve com uma legislação internacional que controle e taxe o fluxo de capitais, com o fim dos paraísos fiscais e com o fracionamento das grandes corporações transnacionais em empresas menores, capazes de serem controladas pelo poder público. Sem isso o poder das empresas continua sem limites e a corrupção continuará sendo um instrumento desses atores para influir no poder público segundo seus interesses.
Ainda que essa seja a realidade atual, os sentidos da democracia continuam em disputa e as mobilizações sociais contra a destituição de direitos são cada vez mais importantes. Democracia e direitos sociais são irmãos gêmeos. Para garantir os direitos é preciso garantir a democracia – uma democracia de novo tipo, capaz de colocar no centro das preocupações o bem-estar da população e de controlar os grandes grupos econômicos e financeiros em defesa do interesse público.

terça-feira, 15 de agosto de 2017

Terceiro poder ou Poder Moderador da República? O papel do Poder Judiciário no pensamento de Rui Barbosa e na atualidade brasileira





Olá Alunos,

Segue um convite muito especial e bastante relevante para vocês como graduandos em Direito. 

Esperamos que gostem e não percam essa oportunidade.
Ramon Reis, monitor da matéria "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.


A Fundação Casa de Rui Barbosa (FCRB) realiza o seminário “Terceiro poder ou Poder Moderador da República? O papel do Poder Judiciário no pensamento de Rui Barbosa e na atualidade brasileira”. Com participação gratuita e organizado pelos pesquisadores José Almino Alencar (FCRB) e Christian Lynch (FCRB), o evento acontece no auditório da FCRB. 

O seminário tem como proposta estabelecer uma ponte entre o debate da Primeira República e o atual, reunindo especialistas ao longo de duas mesas. Tradicionalmente considerado um poder profissional e puramente jurídico, a quem incumbiria apenas aplicar as leis elaboradas pelos outros dois poderes, o Poder Judiciário adquiriu dramática centralidade nos últimos quinze anos da vida política brasileira. Esse movimento de ascensão do terceiro poder, aplaudido por alguns e condenado por outros, remete ao debate travado ao longo da Primeira República entre judiciaristas como Rui Barbosa, para quem o terceiro poder deveria atuar como o poder moderador do regime, na defesa da Constituição, e antijudiciaristas como Felisbelo Freire, para quem ele deveria se conformar politicamente aos demais. 


10h30 - Mesa 1: Papel político-constitucional do Supremo Tribunal
Joaquim Falcão (FGV-Rio) 
Cláudio Pereira de Souza Neto (UFF)



14h - Mesa 2: Primeira República, fazendo a ponte com o presente.
Christian Lynch (FCRB)
Carlos Guilherme Frederico Lugones (PUC-Rio)



:: Organização: 
José Almino Alencar (FCRB)
Christian Lynch (FCRB)

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

A quem interessa a redução de direitos proposta pela reforma trabalhista?





Olá Alunos,

A notícia de hoje irá abordar como as mudanças da reforma trabalhista podem afetar a maior parte da população e quais as evidentes consequências dessa manobra político-jurídica em âmbito nacional.

Espero que gostem e participem.
Ramon Reis, monitor da matéria de "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.

E as máscaras da “reforma” trabalhista não param de cair.

Primeiro, foi o relator da “reforma” trabalhista na Câmara, deputado Rogério Marinho que, no dia 17 de maio, em audiência pública no Senado Federal, confessou que a “reforma” é fruto de uma “ruptura do processo democrático“.

Depois, foi o próprio chefe do Executivo em exercício, em mais uma das tantas reuniões que fez com representantes do capital, no dia 24/05, que deixou claro que a “reforma” trabalhista seria uma forma de contornar a crise política.

Na sequência, em 30/05, em novo discurso feito para empresários, desta feita no Fórum de Investimentos Brasil 2017, apontando que não há plano “B” para o Brasil no que tange ao cenário político, o primeiro Presidente do Brasil denunciado por corrupção, reiterou que o governo continuaria comprometido com as reformas trabalhista e previdenciária.

No mesmo evento, acompanhando o chefe do Executivo, compareceram o Presidente do Senado Federal Eunício de Oliveira e o Presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, e deixou bastante claro que a Câmara dos Deputados está comprometida com a agenda do mercado financeiro.

E qual é a agenda do poder econômico?

É a de se valer da instabilidade política para impor uma “reforma” trabalhista que, fragilizando os sindicatos e permitindo a redução de direitos, impulsione os seus negócios particulares, sem qualquer perspectiva de projeto de país.

Um dos pilares da reforma é o negociado sobre o legislado e, como o próprio nome diz, o que se propõe é um rebaixamento da proteção jurídica legal, ou seja, redução de direitos, sendo que a preconizada compensação com outros direitos não garante nada, ainda mais quando a reforma não traça parâmetros para essa comparação e quando, nos termos da própria proposta da “reforma”, a inexistência de compensação não gera a nulidade da negociação.

O negociado sem o parâmetro legal, com pulverização sindical e sem garantia de emprego, favorece o “dumping social”, isto é, a possibilidade do grande capital – que pode sair de uma localidade para outra – colocar os sindicatos em competição pelo menor custo como fator de preservação de empregos (ou, mais propriamente, de subemprego), por meio da ameaça de se retirar da cidade caso o sindicato não aceite a condição que outros já aceitaram em localidades diversas.

Esse negócio, ou seja, essa fórmula para aumentar lucros por meio da redução de custos, que se reforça com a “reforma” trabalhista, é, ademais, a postura natural das grandes empresas, conforme confessado, expressamente, pelo Diretor Titular do Centro das Indústria do Estado de São Paulo – CIESP, em São José dos Campos, Almir Fernandes. 

O conjunto dessas falas revela ao quê e a quem a “reforma” interessa.

O problema para os “negócios” é que essa “reforma” não respeita preceitos jurídicos mínimos fixados no processo legislativo específico da legislação do trabalho, estabelecido internacionalmente desde a criação da OIT, que é o diálogo social (tripartite), e que fere os princípios constitucionais da prevalência dos Direitos Humanos, da progressividade (melhoria da condição social dos trabalhadores) e da função social da livre iniciativa, da propriedade e da economia, com vistas à construção da justiça social, não é capaz de gerar segurança jurídica alguma às empresas que pretendam melhorar seu desempenho por meio da precarização do trabalho.

Diante da ilegitimidade e das inconstitucionalidades do PLC 38/17, que também afrontam a democracia, a Justiça do Trabalho certamente vai resistir, pois possui o dever funcional de preservar os valores jurídicos que a “reforma” ataca.

E o problema para a sociedade em geral é o risco de que, querendo-se levar adiante a tal “reforma” a qualquer custo, sejam perdidos todos os limites institucionais e se aprofunde o Estado de exceção, assumindo-se o regime autoritário, ao ponto de, inclusive se eliminarem as garantias da magistratura ou até mesmo de se extinguir a Justiça do Trabalho, uma instituição que demonstra sua seriedade e utilidade precisamente em razão dos ataques que vem sofrendo daqueles que conspiram contra a democracia e contra os interesses sociais, culturais e econômicos do país. 

E o que dirá a respeito a Comissão de Constituição e Justiça do Senado?

Jorge Luiz Souto Maior é Juiz do Trabalho e Professor de Direito do Trabalho na Faculdade de Direito do Largo São Francisco (USP).

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

Os riscos das mudanças na previdência rural



Olá alunos,

A notícia de hoje vai mostrar quais são as possíveis consequências das novas regras da providência no âmbito rural. O debate gira em torno da incidência destas novas normas na agricultura familiar, que ainda é abundante no Brasil.  

Espero que gostem e participem.
Ramon Reis, monitor da matéria de "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense. 

Uma das consequências das novas regras é o desincentivo ao trabalho do agricultor familiar, que deverá buscar emprego no agronegócio ou deixar o campo.
Um dos pontos pouco discutidos da reforma da previdência são as mudanças na aposentadoria dos trabalhadores e das trabalhadoras rurais e seus impactos. A proposta em trâmite atualmente no Congresso Nacional propõe que a aposentadoria rural se dê mediante a contribuição previdenciária destes por pelo menos quinze anos e com a idade mínima de 57 anos para as mulheres e 60 anos para os homens, o que mantém a atual previsão constitucional de redução de cinco anos em relação ao trabalhador urbano.
Montada sobre a falácia de que o trabalhador rural não contribuiria para um regime do qual seria beneficiário, há uma armadilha perigosa ao instituir a contribuição previdenciária formal para este segmento.
Para compreender estas questões é preciso, preliminarmente, distinguir os três tipos de trabalhadores rurais segurados pelo regime de previdência: o empregado rural, o contribuinte individual e os segurados especiais. O artigo 7º da Constituição de 1988 igualou os direitos de trabalhadores urbanos e rurais, inclusive os previdenciários. Ademais, a contribuição para a previdência do empregado rural se dá nos mesmos termos do trabalhador urbano.
Do ponto de vista previdenciário, o trabalho rural eventual que presta serviços a um ou mais contratantes (diaristas, boias-frias etc.) é enquadrado como contribuinte individual. A contribuição deste, de acordo com a Lei  8.212/91, é de 20% sobre o salário de contribuição. A Lei Complementar 123/2006 incluiu um dispositivo que faculta a esse segurado a redução da alíquota de contribuição para 11% sobre o salário mínimo desde que renuncie ao direito à aposentadoria por tempo de contribuição.
Por fim, quando a Lei 11.718/2008 instituiu um mecanismo simplificado para a contratação de trabalhadores rurais para o trabalho de curta duração por empregador pessoa física, acrescentou que o segurado trabalhador rural contratado para esse tipo de serviço deve contribuir com a alíquota de 8% sobre o respectivo salário de contribuição.
“O produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado que exerçam essas atividades individualmente ou em regime de economia familiar” foram incluídos pela Lei 8.213/91 como segurados especiais da previdência social. Neste caso, sua contribuição se dá sobre o resultado da comercialização de sua produção. Pela Lei 8.212/91, a contribuição destinada à Seguridade Social do segurado especial é de 2% sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção e mais 0,1% dessa receita para financiamento das prestações por acidente do trabalho. Desta forma, fica claro ser falsa a argumentação de que o trabalhador rural não contribui com a previdência.
Ainda assim, é preciso admitir que algumas estimativas apontam que a arrecadação advinda da comercialização da produção rural corresponde a algo em torno de 13% dos benefícios dos segurados especiais, caracterizando um forte subsídio que leva à segunda parte da falácia mencionada no início: a ideia da contribuição para um regime do qual seria beneficiário. Isto poderia ser válido se o sistema pensado no Brasil fosse um regime apenas de previdência social. A visão dos constituintes foi, entretanto, de um sistema de Seguridade Social integrando o “conjunto de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade destinados a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”.
São objetivos da seguridade social estabelecidos no texto constitucional: a universalidade da cobertura e do atendimento, a uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, a seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços, a irredutibilidade do valor dos benefícios, equidade na forma de participação no custeio, a diversidade da base de financiamento e o caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, empregadores, aposentados e governo nos órgãos colegiados.
A previdência rural, portanto, não deveria ser entendida como parte de um regime de previdência, mas como uma política de assistência social com múltiplos impactos. Dos 16 milhões de habitantes apontados em 2011 pelo governo como em situação de pobreza extrema, 47%, ou 7,52 milhões, estavam no campo. Levando-se em conta os dados da contagem da população do Censo Demográfico de 2010 do IBGE, teríamos um percentual de 8,39% da população em situação de miséria.
Quando se desagrega os dados do urbano e do rural, encontramos 5,27% da população urbana em situação de pobreza extrema, enquanto o mesmo índice na população rural atinge 25,27%. Sem a previdência rural, este contraste seria ainda maior, dado que as evidências indicam que o regime instituído pela Constituição de 1988 permitiu que muitos trabalhadores rurais escapassem da linha de pobreza. Ademais, a previdência rural tem efeito sobre a contenção do êxodo rural e efeitos multiplicadores significativos na economia de pequenos municípios,  maioria no Brasil.
É justamente neste benefício ao “produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam essas atividades individualmente ou em regime de economia familiar” que o governo pretende mexer. Os impactos podem ser bem maiores do que se anuncia. A necessidade de contribuição formal à previdência na prática levará estes trabalhadores à situação em que se encontravam pré-constituinte. As alternativas imediatas ao trabalhador que não pretende trabalhar até morrer será buscar emprego no agronegócio, que não será capaz de absorver a todos, ou abandonar o campo, o que poderá gerar um aumento no êxodo rural.
Deste modo, o agricultor familiar e o assentado da reforma agrária terão desincentivos a trabalhar em suas propriedades de forma a garantir algum tipo de aposentadoria. É importante destacar que este setor ocupa 24,3% da área agricultável, produz 70% dos alimentos consumidos e emprega 74,4% dos trabalhadores rurais. De forma cruel, a reforma da previdência poderá promover a desestruturação das cadeias ligadas à reforma agrária e à agricultura familiar em favor do agronegócio empresarial.
Deste cenário, deverá ocorrer dois desdobramentos, o mais evidente é o empobrecimento e a perda de autonomia dos trabalhadores rurais e dos municípios onde está inserida a agricultura familiar. Por um lado, os trabalhadores rurais abandonarão sua própria produção e perderão renda, por outro, aqueles que optarem por seguir com a produção própria acabarão por abrir mão da aposentadoria.
Ademais, com o êxodo rural e a diminuição da população no campo e, num médio prazo, dos beneficiários de aposentadoria rural deve impactar na renda dos pequenos municípios cuja economia depende fortemente do consumo dos aposentados rurais e seus subsequentes efeitos multiplicadores. Para além disso, a renda gerada pelas cadeias produtivas da agricultura familiar e da reforma agrária deverá diminuir nos locais onde estas têm importante peso econômico. A tendência, portanto, é de um cenário que aponta para um possível colapso econômico de diversos municípios pelo Brasil.
O outro desdobramento será o impacto na oferta de alimentos. Como foi dito, são estas cadeias produtivas que garantem boa parte da alimentação básica consumida pela população brasileira. Sua desarticulação no médio prazo em decorrência da reforma da previdência provocará uma quebra estrutural na oferta de alimentos afetando a segurança alimentar do povo brasileiro e provocando uma inflação de alimentos.
Deste modo, cumpre resgatar a ideia de que, para além dos resultados fiscais, um governo soberano, emissor de sua própria moeda e num país de dimensões continentais como o Brasil, deve priorizar a responsabilidade econômica e social sobre a malfadada responsabilidade fiscal: emprego, inflação e bem-estar.
As mudanças na previdência rural não afetam apenas o trabalhador rural. Neste sentido, é do nosso entendimento que a reforma da previdência, para além dos seus efeitos na população urbana, promove alterações na aposentadoria rural que somente irresponsáveis e sem compromisso com o povo são capazes de defender.

terça-feira, 8 de agosto de 2017

Água e agronegócio: uma relação a ser mais bem examinada






Olá alunos,

A notícia de hoje traz a relação do consumo de água e a produção do agronegócio. Sabe-se que o Brasil é um dos maiores exportadores de commodities. Portanto. conclui-se que é necessário pensar sobre os possíveis impactos ambientais que a exportação de produtos primários e semimanufaturados pode estar tendo sobre nossos recursos hídricos.

Esperamos que gostem e participem,
Ramon Reis, monitor da matéria "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.

As cadeias produtivas da agricultura e das agroindústrias têm cada vez mais impactado os recursos naturais em nosso país. Recentemente a água tem se tornado objeto de atenção por conta de diferentes impactos e disputas (muitas vezes não explícitas) relacionadas com a mercantilização das águas doces, que envolve a manutenção dos ecossistemas, a agricultura de alimentos e de exportação, o setor urbano e industrial e a necessidade de garantir a segurança hídrica da população.
Pelo menos quatro fatores merecem ser destacados por terem contribuído para esse quadro atual de avanço do agronegócio1 sobre a água superficial e subterrânea: (i) a crise da produção de proteína animal, em razão da doença da vaca louca na Europa e nos Estados Unidos; (ii) a urbanização e a mudança de hábitos alimentares em países do Oriente Médio e da Ásia (com destaque para a China); (iii) a elevação da demanda mundial de soja e etanol; (iv) a necessidade de o Brasil obter moedas internacionais para fazer frente aos custos das importações e pagamento da conta serviços.
A doença da vaca louca, no final dos anos 1990, que dizimou boa parte do rebanho bovino principalmente na Europa, foi resultado da adição, na ração, de uma farinha composta por sangue e ossos de animais abatidos. A proibição dessa prática, somada à falta de áreas para a criação em pasto, elevou a importação de soja, com o consequente aumento dos custos de produção, o que desencadeou a transferência da produção de bovinos para fora do continente. Essas foram as principais causas do aumento da produção de soja e bovinos no Brasil.
Para que se tenha uma ideia do peso desse setor em nossa balança comercial, em 2016 a exportação de proteínas animais (carne bovina, suína e aves) representou 20% do total das exportações brasileiras (mais de US$ 14 bilhões), ficando a soja com 5,8% (US$ 4,04 bilhões) do total das exportações.
A Revolução Verde,2 dispondo de vultosos financiamentos internacionais, vendeu a ideia de que o problema da segurança alimentar seria resolvido pela simples adoção de um pacote de tecnologias. Ela permitiu a intensificação da produção para atender à demanda do abastecimento do mercado interno e permitiu exportar commodities da agropecuária. Contudo, em vários países isso trouxe consequências ambientais trágicas, esgotando e contaminando os recursos hídricos com agrotóxicos.
O caso da Arábia Saudita é emblemático. No intento de se tornar um grande exportador de trigo, o país esgotou um importante aquífero que proveu segurança hídrica para sua população durante milênios. Entre 1987 e 2015, o país entrou numa viagem sem retorno, chegou a ser o sexto maior exportador mundial de trigo e em 2016 não plantou um pé de trigo. Como resultado, elevou ainda mais sua dependência da importação de alimentos e iniciou a dessalinização da água do mar para garantir o consumo humano. Outro caso é o sistema de irrigação da amêndoa e do pistache adotado na Califórnia, com níveis de desperdício sem precedentes, levando ao afundamento (subsidência) dos terrenos.
A indústria alimentar vem promovendo erosão genética e uniformização do padrão alimentar mundial com um custo energético, hídrico e ambiental elevado. A base desse sistema, a montante, é a indústria petrolífera, que controla o setor produtor de agrotóxicos, adubos e sementes, e, a jusante, a indústria alimentar, que tenta impor um padrão alimentar de tipo europeu e norte-americano para todo o globo. Cada vez mais o que se come nas grandes cidades ao redor do mundo é a mesma base alimentar. Esse sistema produtivo é responsável pela perda de 30% de todos os alimentos que se produz, conforme dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).
Essa uniformização da alimentação e da produção em países tropicais desloca, marginaliza e mina a base alimentar local. Um bom exemplo vem da China, com a introdução da carne bovina na dieta. Esse país também deslocou parte de sua produção e abastecimento de proteínas animal (frango, suínos e bovinos) e vegetal (soja) para a África e a América do Sul. O mesmo ocorreu com a carne de frango nos países árabes. Mais recentemente, na Ásia, os recorrentes surtos de gripe aviária aumentaram a importação de carne de frango.
Esses sistemas de alta produtividade, intensivos no consumo de recursos naturais, são grandes demandadores de recursos hídricos, sejam eles superficiais ou subterrâneos. Essa forma de fazer agricultura, juntamente com o processo de urbanização3 da população, aumenta as batalhas pelo acesso, controle e consumo de água, gerando disputas inexistentes até então.
Para ter uma ideia, enquanto desde 1950 a população mundial triplicou, a demanda por água cresceu seis vezes. No Canadá, entre 1972 e 1991, a população cresceu 3%, e o consumo de água, 80%, segundo a ONU. Na Alemanha, um cidadão consome nove vezes mais água que um da Índia, ou seja, o bem-estar nas sociedades de consumo desenvolvidas está associado à elevação do consumo de água e à disputa pela água entre os usos tradicionais e os novos usos.
No Brasil, esse avanço da produção e da exportação de produtos primários ou semimanufaturados promoveu o deslocamento e a substituição de antigas lavouras e de pastagens pela soja, o milho, a cana-de-açúcar e o algodão, avançando sobre as áreas do cerrado e empurrando o gado em direção à floresta amazônica, juntamente com o cultivo de soja.
Nessa conjuntura de aumento da demanda internacional por commodities agrícolas e obtenção de moeda internacional, no segundo governo FHC foi retomado um conjunto de políticas para elevar os volumes de produção por meio do fomento à produção, da modernização de parte do setor da agricultura familiar via crédito subsidiado, da renovação do parque de máquinas e implementos, da assistência técnica e do apoio à comercialização e à exportação. Essa política teve sua continuidade nos governos Lula e Dilma.
Assim, nos últimos dezenove anos, tivemos o fortalecimento econômico e político do setor ruralista de tal forma que se convenceram diferentes segmentos da sociedade de que a finalidade do agronegócio é o bem de todos. Com isso, conseguiu-se o apoio de parte da esquerda na mudança promovida no Código Florestal. Esse setor, após o golpe de 2016, apresentou um conjunto de propostas regressivas, como mudar a legislação trabalhista no meio rural, afrouxar o licenciamento ambiental, travar a definição de trabalho escravo, suspender a demarcação dos territórios indígenas e quilombolas, retomar a exploração de minérios na região amazônica, entre outras.
A postura revela que os ganhos do agronegócio têm forte dependência da dilapidação dos recursos humanos e naturais. Dessa maneira, terra, água e mão de obra oferecidas a preços baixos distorcem as decisões relacionadas com a produção agrícola e com a exportação de alimentos e ficam expostas nas propostas de alteração da legislação apresentada por esse setor a fim de aumentar os impactos ambientais do agronegócio exportador.
Esse aparente consenso em torno da importância do agronegócio para o país gerou uma postura um tanto passiva nas diferentes esferas do governo e fica bem marcado nos conflitos e disputas pelo acesso à água, como ocorre na Bacia do São Francisco, na atual crise hídrica do Distrito Federal.
Nosso país, em função de sua formação geográfica, ambiental e do regime de chuvas, consegue obter duas colheitas anuais em lavouras de sequeiro (não irrigadas). Isso explica por que até o presente somos o país com a menor taxa de áreas irrigadas na América Latina: apenas 16%.
Segundo o Censo Agropecuário do IBGE de 2006, o número de estabelecimentos agropecuários que irrigam seus cultivos é de 329 mil, num universo de 4,5 milhões. Esses estabelecimentos constituem 7% da área agrícola do país (4,5 milhões de hectares); seu volume representa 16% do total e gera 35% do valor comercializado pela agricultura brasileira. Entretanto, as perdas na irrigação são muito altas, não apenas no Brasil. A FAO estima que, no mundo, cerca de 70% do volume de água ofertado nos perímetros irrigados se perde por evaporação ou percolação. A redução de 10% desse volume permitiria abastecer metade da população mundial.
É importante esclarecer que a água é vital para a produção agrícola e a criação animal. A questão está na quantidade consumida. O nó é que, quanto maior a produtividade e a velocidade de desenvolvimento da planta, maior o consumo de água. Até recentemente esse tema não fazia parte da agenda daqueles que trabalham com o melhoramento das plantas.
Para ter uma ideia do que representa esse consumo, empregando-se a metodologia da pegada hídrica,4 para produzir 1 tonelada de legumes, trigo, soja e gado bovino, o consumo de água é, respectivamente, 1 milhão de litros, 1,45 milhão de litros, 1,8 milhão de litros e entre 15 milhões e 42,5 milhões de litros. Outra análise para avaliar a eficiência do consumo de água é a renda gerada em dólar por quilograma vendido – no caso dos legumes, a média é de US$ 0,50; para o trigo, US$ 0,08; e, para a carne bovina, US$ 0,005.
Quando se analisa o aumento no volume das exportações brasileiras de soja, carne e açúcar e, consequentemente, constata-se o aumento do volume de água embutido nessa produção, conclui-se que é necessário pensar sobre os possíveis impactos ambientais que a exportação de produtos primários e semimanufaturados pode estar tendo sobre nossos recursos hídricos. Entre 1997 e 2005, o volume de água empregado na produção e exportação apenas nesses três produtos saltou de 27,1 bilhões de litros para 460,1 bilhões de litros.
O avanço do desmatamento da Amazônia, a pressão agroexportadora e as mudanças climáticas colocam em risco essas vantagens comparativas naturais, já que a previsão é o aumento de períodos maiores de seca e crise hídrica para nossa população. Esse quadro elevará a demanda das águas superficiais e subterrâneas e poderá afetar a vida dos rios perenes e dos ecossistemas, já que são as águas subterrâneas que perenizam o leito dos rios e são exploradas quase sem controle pelos órgãos estaduais.
No caso do São Francisco, essa situação é preocupante, pois o aumento da captação de águas subterrâneas para irrigação de lavouras no norte de Minas (fruticultura) e no oeste baiano (soja e algodão, principalmente) tem como fonte o Aquífero Urucuia. Esse aquífero, no período das secas, é responsável por mais de 80% do volume de água do Rio São Francisco. Também é aí que ocorre a derivação de suas águas para o semiárido. Ou seja, existem diferentes tipos de uso, e é a pressão da sociedade civil que leva os órgãos gestores a agir.
Recentemente, a crise de abastecimento de água no Distrito Federal tem levantado a mesma questão sobre os diferentes tipos de uso e quem vai pagar a conta da falta de água. Em São Paulo, a crise hídrica dos anos 2013-2015 atingiu pelo menos 78 cidades do interior, cujo abastecimento de água depende dos mananciais superficiais, o que acende uma luz para os processos de uso e ocupação do solo nessas bacias hidrográficas tomadas pelas culturas do eucalipto e da cana-de-açúcar, que promovem o avanço desordenado sobre a captação de águas subterrâneas.
É importante ressaltar que, do total da chuva precipitada, 80% é perdida para a atmosfera pela evapotranspiração, 10,8% vai para os aquíferos e 9,2% escorre superficialmente. Dessa maneira, as práticas conservacionistas mostram-se extremamente relevantes para garantir o armazenamento de água para a planta, a manutenção da vazão dos rios e a promoção da recarga dos aquíferos.
Ao mesmo tempo, além do aumento considerável no consumo de água, o desmatamento da Amazônia pela expansão da soja e criação de gado bovino coloca em risco o mecanismo de formação das chuvas de interior, produto dos chamados rios voadores formados pela evapotranspiração da floresta que é levada pelos ventos para os Andes e de lá desce e precipita nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul. Esse processo terá impacto não apenas sobre a vida humana, mas também sobre os ecossistemas e toda a economia.
Por entender que a água é um bem comum, e não uma mercadoria, e para discutir processos de gestão democrática e se contrapor à apropriação privada e predadora pelos diferentes setores exportadores de commodities, entre eles o agronegócio, um conjunto de organizações da sociedade civil decidiu organizar o Fórum Alternativo Mundial da Água (Fama) 2018, a ser realizado em março, em Brasília.
*Osvaldo Aly Junior, engenheiro agrônomo, membro da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra), doutorando em Gestão de Águas Subterrâneas no IGc-USP, é pesquisador do Nupedor/Uniara-SP.

1 Não é objeto do presente artigo, mas o mesmo vale para a produção de commodities minerais.
2 Nome dado ao pacote tecnológico que envolve melhoramento genético, uso intensivo de agrotóxicos e adubação, mais a mecanização. A Revolução Verde trouxe como resultado aumento da produção e da produtividade de uma série de produtos, porém acentuou os impactos dessas atividades sobre o ambiente.
3 Para ter uma ideia da disputa pela água entre consumo urbano e rural, na Califórnia, cuja maioria do território está localizada em regiões semiáridas, do total do consumo urbano, 50% se destina à rega dos jardins.
4 Pegada hídrica é o volume total de água doce utilizado para produzir os bens e serviços consumidos pelo indivíduo, comunidade ou produzidos pelas empresas. Ele avalia seu uso de forma direta e indireta.