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domingo, 27 de setembro de 2015

A arte da persuasão



Olá alunos,

O cientista social José Carlos Durand lançou recentemente o livro ‘Incômodos Best-Sellers’, onde trata da questão da publicidade na vida em sociedade. Em tempos de contenção, como é o que estamos vivenciando, a publicidade nos faz consumir produtos que, em sua maioria, não necessitamos, levando-nos ao exagero e à acumulação. A postagem de hoje pretende fazer uma análise de tal temática, visando uma reflexão mais abrangente sobre um consumo consciente. 

Esperamos que gostem e participem.
Joyce Borgatti e Palloma Borges
Monitoras da disciplina “Economia Política e Direito” da Universidade Federa Fluminense.

A história moderna da publicidade tem origem no século XIX, tendo experimentado grande expansão com a industrialização norte-americana no início do século XX. A indústria do tabaco foi pioneira da produção e do consumo em massa, ajudando a desenvolver técnicas para seduzir o contingente crescente de trabalhadores urbanos.

Na primeira metade do século XX, as propagandas eram veiculadas, principalmente, em jornais, revistas e nas paredes dos bondes. Na segunda metade do mesmo século, o rádio e a tevê ganharam espaço. Nas últimas décadas, as ferramentas de busca e as mídias sociais atingiram a primazia. Mudou a forma, permaneceu a essência.

Na superfície, alguns excessos foram aparados. As propagandas de cigarro foram praticamente banidas e há crescente restrição à veiculação de publicidade destinada a crianças. O anacronismo mantém-se: um setor criado há mais de cem anos para dinamizar a industrialização continua operando com o mesmo ideário e a mesma velocidade em um mundo que mostra sinais de esgotamento de recursos. Bom momento para repensar hábitos de consumo e práticas publicitárias.

Incômodos Best-Sellers, USA, de José Carlos Durand, lançado recentemente pela Edusp, traz uma profunda análise histórica da evolução do consumo e da publicidade, desde o fim do século XIX. Durand, professor de Estudos Culturais na USP, realizou um percurso original, identificou autores e obras de sucesso que examinaram a publicidade e o consumo com lente crítica. 

Sua lista inclui sete influentes obras: A Teoria da Classe Ociosa (1899), de Thorstein Veblen; A Tragédia do Desperdício (1925), de Stuart Case; Os Persuasores Ocultos (1957), de Vance Packard; A Sociedade Afluente (1958), de John Kenneth Galbraith; O Pacto Rompido (1975), de Robert Bellah; As Contradições Culturais do Capitalismo (1976), de Daniel Bell; e A Cultura do Narcisismo (1983), de Christopher Lasch.

Experiente cientista social, Durand foi rigoroso em sua missão. Cada época foi explorada em suas características econômicas, sociais e culturais. Cada autor recebeu uma minibiografia, que contextualiza ideias e livros. A trajetória tem início com os “anos dourados”, período que vai do término da Guerra Civil até o fim do século XIX, marcado pela acumulação de capital e pela concentração econômica. Cruza períodos de depressão e prosperidade. O epílogo traz o leitor aos dilemas e às grandes questões dos nossos dias: neoliberalismo, ordem corporativa, religião, consumo e cidadania.

A antropóloga Lívia Barbosa assina o sintético, porém notável prefácio e observa que: “A publicidade/propaganda é uma das polêmicas instituições culturais da sociedade de consumo, um dos inúmeros rótulos que utilizamos para denominar a sociedade contemporânea em que vivemos. Ele sugere que entre nós o consumo desempenha um papel que vai muito além daquele que tem ou teve nas demais sociedades. Ele nos define”. 

Segundo alguns de seus detratores, a publicidade/propaganda nos induz a desejar e adquirir bens e serviços que não necessitamos, iludem pelos símbolos e imagens, leva ao materialismo e à busca insaciável do status, afasta-nos dos valores humanos e deixa um vazio existencial. As obras exploradas por Durand permitem identificar os contextos socioculturais nos quais brotaram essas e outras concepções críticas.

De Vance Packard o autor destaca o papel da publicidade de manter a audiência atenta ao que se situa acima de seu nível de consumo: “Nos últimos anos, (os publicitários) têm estado muito ocupados tratando de descobrir coisas relacionadas com classe social e status, e aplicar suas descobertas para dar forma a seus apelos de venda”.

De Christopher Lasch, Durand ressalta um desabafo nostálgico contra o mundo do consumo: “Os obstetras encarregam-se do nascimento; os pediatras são responsáveis pelas enfermidades e curas de uma criança; o professor, por sua inteligência; o supermercado e a indústria de alimentação, por seu alimento; a televisão, por seus mitos”.

Incômodos Best-Sellers contém múltiplas narrativas, sobre a sedução pela publicidade, sobre a corrupção dos valores e, mais recentemente, sobre a apropriação do consumo pelo consumidor, como ato de teor político. O poder que os primeiros críticos viam na publicidade surge ao final da leitura contextualizado e relativizado. 



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