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sexta-feira, 17 de julho de 2015

O abalo na construção civil

            

Olá alunos,

"Marca” do primeiro mandato de Dilma Rousseff e um dos principais trunfos da campanha à reeleição, o Programa Minha Casa Minha Vida, assim como o resto dos projetos na construção civil, paga o preço dos erros recentes na condução da economia  e do agravamento da crise. A postagem de hoje pretende nos mostrar como a crise tem abalado as estruturas do setor de construção do país.

Esperamos que gostem e participem.
Joyce Borgatti e Palloma Borges. Monitoras da Disciplina “Economia Política e Direito” da Universidade Federal Fluminense.

Depois de atrasar pagamentos às construtoras e restringir o crédito, o governo reviu certas posturas e ofertou mais dinheiro ao mercado. A reação tende, porém, a demorar. Antes será preciso limpar o caminho. Presidente da maior construtora de imóveis destinados à baixa renda, a MRV Engenharia, e da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias, Rubens Menin só enxerga novas obras a partir do próximo ano. “Neste momento, o setor precisa cumprir as obras contratadas em 2014, colocar os atrasos em dia e ter uma definição do cronograma de pagamentos.” A faixa básica do programa representa 40% das unidades entregues e 30% da ocupação de mão de obra, calcula o empresário.

O abalo no Minha Casa Minha Vida é parte da crise do setor imobiliário, em queda desde o último trimestre do ano passado e fortemente afetado pelo ajuste fiscal e a política monetária. Entre os efeitos negativos, destaca-se a redução do orçamento do programa, de 18,6 bilhões para 13 bilhões de reais. Além disso, a Caixa Econômica Federal, responsável por 70% das operações do Sistema Financeiro de Habitação, aumentou as exigências para a concessão de empréstimos. Uma combinação de juros e inflação altos resultou na fuga de mais de 30 bilhões de reais da caderneta de poupança, principal fonte do crédito. Desde outubro, 290 mil postos de trabalho foram fechados no setor, mostra a Sondagem da Indústria da Construção Civil, da Confederação Nacional da Indústria.

Após uma intensa ação, em Brasília, das entidades empresariais de construção, vendas e financiamento imobiliário, o setor recebeu um novo fôlego no fim de maio. O conselho curador do FGTS aprovou um aporte de 5 bilhões de reais ao Programa Pró-Cotista, para crédito à casa própria até o valor de 400 mil, de famílias com renda acima do limite de 5 mil reais do Minha Casa Minha Vida. Além disso, o Conselho Monetário Nacional liberou 22,5 bilhões do compulsório dos bancos relativo aos saldos em poupança, e garantiu que os certificados de recebíveis serão efetivamente lastreados em imóveis com perfil do SFH.

Uma “injeção de adrenalina” para o setor imobiliário neste momento seria reajustar o valor dos imóveis subsidiados, nas faixas 1 e 2, do Minha Casa Minha Vida, de até 190 mil reais em São Paulo. “Isso é o mais urgente. Nesses segmentos há muita demanda, baixíssima inadimplência e alta geração de emprego. Pleiteamos uma atualização para cerca de 230 mil reais, abaixo da variação da inflação da construção no período, de 22%. Mesmo com margem pequena, esse ajuste tornaria os investimentos mais atraentes e viabilizaria a retomada de lançamentos”, sugere Menin.

O conjunto de medidas no fim de maio atenua uma retração brusca da dinâmica do setor. Houve uma liberação do compulsório, embora inferior ao pleiteado, além dos recursos para o Pró-Cotista. A correção das regras para os CRIs deve representar o ingresso de 15 bilhões de reais nos próximos 24 meses. Para o setor, foi importante o governo garantir a isenção das letras de crédito imobiliário, principalmente no momento em que o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo enfrenta juros altos e dificuldade de captação.

Previsibilidade é o mais importante agora para as construtoras do programa habitacional, analisa Ronaldo Cury, vice-presidente da Habitação Popular do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusCon-SP). 

“O corte no Orçamento e nas novas contratações é fato consumado. Esperamos uma reprogramação dos pagamentos, inclusive para ter base de negociação com fornecedores e prestadores de serviços.”

Na faixa 1 do Minha Casa Minha Vida, Cury aguarda uma retomada das contratações ainda no segundo semestre, com desembolso para o próximo ano. “Se adiantarmos as obras contratadas de 1,6 milhão de residências, com base no Orçamento atual, e em 2016 o total atingir os mesmos 13 bilhões de reais deste ano, haverá recursos para novos contratos. Em 2017, se esse Orçamento permanecer, caberão novas contratações.”

O diretor do SindusCon defende ainda um reajuste do teto do programa habitacional, para estimular a oferta de imóveis de médio padrão. Em 2009, construía-se um imóvel de 100 mil reais para vender a uma família com renda de 2 mil. Agora, há o teto de 190 mil, ou de 135 mil em algumas cidades, para oferecer a quem ganha até 3,2 mil, na faixa 2 do programa.

Além das medidas para minimizar a escassez de crédito, avalia Cury, o governo deve manter a interlocução com o setor, para atenuar a brusca retração dos últimos trimestres. “Nas pequenas construtoras, que atendem à faixa 1 e estão sem receber, há muito medo de investir. Mas com a normalização dos pagamentos e o lançamento da terceira etapa, o empreendedor retornará. Passamos por nove meses terríveis, mas creio que foi a pior fase.”

Flávio Amaury, presidente em exercício do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo, reforça a necessidade de se definir logo a terceira etapa do Minha Casa Minha Vida. “Encontrar terreno, contratar e vender é demorado e a descontinuidade acrescenta custos.” Em março, as vendas de imóveis em São Paulo recuaram 27,1% em relação ao mesmo período do ano anterior, enquanto os lançamentos se reduziram em 72,3%, em uma confirmação da tendência de as incorporadoras focarem na comercialização do estoque.

A dificuldade de acesso ao crédito foi um dos motivos da queda do índice de confiança da construção, que recuou 5,1% entre abril e maio, para 72,9 pontos, o menor nível da série Sondagem da Construção, realizada mensalmente pela FGV/Ibre, desde julho de 2010. “Além das famílias que sofrem com as taxas de juro, as empresas reportam, a cada levantamento, problemas para obter financiamento”, afirma Ana Maria Castelo, coordenadora de projetos da construção da FGV/Ibre. “As medidas aliviam a tensão do ponto de vista das famílias que precisam dos empréstimos para tomar posse do imóvel. Isso atenua os riscos de distratos.” Apesar das medidas do CMN, a economista avalia que a retração da oferta de recursos pelos bancos e da demanda por parte das famílias, principalmente daquelas das faixas intermediárias para cima, se manterá. As restrições nos empréstimos da Caixa Econômica Federal, a queda dos depósitos na caderneta  e a alta das taxas de juro agravaram muito uma situação que iria ocorrer.
“Há dois anos a redução da demanda apontava para um momento de ajuste dos estoques. O crescimento da oferta e o aumento dos preços caminhavam adiante da renda. A coincidência com as condições macroeconômicas criou a tempestade perfeita”, acrescenta a economista.

Os bancos privados procuram, no entanto, aproveitar a lacuna criada pela política da Caixa, de reduzir de 80% a 50% o valor financiado, para ganhar mercado, avalia Daniele Akamine, diretora da Akamine Negócios Imobiliários. Os juros do banco público estão entre 1 e 3 pontos porcentuais abaixo da média, mas instituições como Santander, Itaú e Bradesco oferecem empréstimos entre 70% e 80% do valor do imóvel. “Uma família com 200 mil reais disponíveis para a entrada tende a comprar um bem de 600 mil, pois o porcentual histórico de entradas é entre 25% e 30%.” Do lado da oferta, o Bradesco  ampliou em 20% a carteira de crédito para imóveis, o Banco do Brasil expandiu-a
em 49% e outras instituições estão dispostas a aumentar o volume de recursos.

O pior talvez tenha passado, mas o horizonte continua nebuloso para um setor decisivo na política econômica e social dos últimos anos. 

              



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