Olá alunos,
Um dos principais temas relacionados a copa diz respeito aos possíveis benefícios, para economia e a infraestrutura do país, que ela traria. A postagem de hoje expõe pesquisas e pontos de vista que divergem em relação ao proveito, ou não, desse legado.
Esperamos que gostem e participem.
Fellype Fagundes e Carlos Araújo
Monitores da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense
Fellype Fagundes e Carlos Araújo
Monitores da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense
Desde que o Brasil foi escolhido para sediar a Copa, em
2007, autoridades de Brasília têm exaltado o potencial do torneio para gerar
empregos, acelerar investimentos em infraestrutura e atrair turistas com os
bolsos recheados de dólares.
"O Mundial é uma oportunidade histórica para
promovermos desenvolvimento socioeconômico no âmbito local e nacional",
disse à BBC Brasil Joel Benin, assessor para Grandes Eventos do Ministério dos
Esportes.
"Ele gerará 3,6 milhões de empregos, movimentará R$ 65 bilhões (este ano) e deixará um legado importante na área econômica".
Nas últimas semanas, porém, alguns analistas têm advertido
que o torneio pode decepcionar aqueles que esperam um efeito econômico significativo
– seja no curto ou no longo prazo.
Dois relatórios recentes, da agência Moody's e da
consultoria Capital Economics, por exemplo, chamam a atenção para o pequeno
peso em relação ao PIB dos gastos potenciais dos turistas e investimentos em
infraestrutura ligados ao evento.
"Nem o impacto econômico imediato da Copa nem seu
legado devem ser expressivos", acredita Neil Shearing, economista-chefe da
Capital Economics para Mercados Emergentes.
"Mesmo os aportes em aeroportos, redes de transporte e
infraestrutura urbana não chegam a 0,5% do PIB. Depois de décadas de escasso
investimento nessas áreas, não é isso que vai aliviar os gargalos estruturais
da economia brasileira."
Acadêmicos como Pedro Trengrouse, consultor da ONU para o
Mundial e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e Wolfgang Maennig,
especialista em economia do esporte da Universidade de Hamburgo, concordam com
essa avaliação.
"O governo resolveu apresentar a Copa como solução para
questões estruturais do país", diz Trengrouse.
"A Copa é, basicamente, uma grande festa. Foi um erro
associar o torneio a obras de infraestrutura que deveriam ter sido feitas há
muito tempo para o Brasil continuar crescendo. Ao final, criou-se uma
expectativa econômica que não pode ser atendida", completa, referindo-se
ao fato de obras de mobilidade urbana e a ampliação de aeroportos terem sido
incluídas na chamada Matriz de Responsabilidades da Copa - documento reunindo
todos os projetos relacionados ao torneio.
Diante dessas críticas, fica a dúvida: afinal, o impacto
econômico do Mundial pode mesmo decepcionar os que esperavam que ele
funcionasse como um catalisador da expansão dos investimentos, renda e emprego
no país? O evento terá ou não um impacto "significativo" na economia,
como promete o governo?
Estudos contraditórios
A resposta depende, primeiro, do que se define pelo termo
"significativo". Segundo, de uma série de cálculos que só poderão ser
concluídos depois do Mundial.
Embora nos últimos anos tenham sido feitos diversos estudos
para estimar os possíveis efeitos da Copa na economia, seus resultados
divergem.
De um lado, estão as pesquisas mais otimistas, citadas pelo
governo.
Em 2010, um levantamento encomendado pelo Ministério dos
Esportes à consultoria Consórcio Copa 2014 estimou que os "impactos econômicos
potenciais" do torneio chegariam a R$ 183,2 bilhões até 2019 - sendo R$
47,5 bilhões de "efeitos diretos" (como investimentos em
infraestrutura e serviços ou gastos de turistas) e R$ 135,7 bilhões de efeitos
indiretos (que incluem, por exemplo, os ganhos dos fornecedores das
construtoras responsáveis pelos estádios).
No mesmo ano, outro estudo, feito pela Ernst & Young em
parceria com a FGV estimou um impacto econômico semelhante: R$ 142 bilhões
movimentados até 2014 e a geração de impressionantes 3,6 milhões postos de
trabalho.
"A Copa vai produzir um efeito cascata surpreendente
nos investimentos no País", dizia o estudo. "A economia deslanchará
como uma bola de neve, sendo capaz de quintuplicar o total de aportes aplicados
diretamente na concretização do evento e impactar diversos setores."
É com os cenários desses dois relatórios que o governo
trabalha ainda hoje. "Não houve exagero - as nossas previsões ainda são
essas", diz Benin.
"Essas estimativas iniciais foram confirmadas por um
terceiro levantamento, da FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas),
que mostrou que a Copa das Confederações (evento-teste para o Mundial)
movimentou R$ 20,7 bilhões em 2013. Foi com base nesse cálculo que estimamos um
mínimo de R$ 65 bilhões a serem movimentados pelo Mundial (este ano)."
Ceticismo
Do outro lado, porém, outros estudos sustentam que essas
previsões são superestimadas.
Entre eles, está um trabalho de 2012 do professor de
economia da Unicamp Marcelo Proni, para quem os cenários iniciais não consideraram
o desaquecimento econômico dos últimos anos - que teria inibido investimentos
em áreas como hotelaria.
Outro levantamento, da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG), também tem cifras bem mais modestas. "Pela nossa estimativa, o
total de empregos gerados pelo torneio seria de apenas 158 mil",
exemplifica Edson Paulo Domingues, um de seus autores.
Maennig, da Universidade de Hamburgo - que vem estudando há
anos os efeitos econômicos da realização de Copas do Mundo e Olimpíadas - é
bastante cético sobre o impacto dessas competições.
"Estimativas infladas de geração de emprego e renda são
comuns em eventos desse tipo porque os governos precisam justificar seus gastos
com estádios e instalações esportivas", diz Maennig, campeão olímpico de
remo pela Alemanha Ocidental.
Ele explica que seus estudos não captaram nenhum efeito
econômico significativo analisando a realização de Copas e Olimpíadas em
diversos países.
"Com uma Copa temos um ganho concreto no bem estar da
população. As pessoas ficam mais felizes - mas é só", diz.
"Os empregos criados costumam ser temporários e é
difícil prever se não teríamos mais benefícios econômicos investindo o dinheiro
dos estádios em outro lugar."
Mas quais estimativas estão corretas?
"A verdade é que só poderemos começar a colocar os
números à prova em 2015 ou 2016, quando tivermos disponíveis todos os dados
relativos aos PIBs regionais e municipais, emprego, turismo e etc.", explica
Domingues.
Falta de euforia
De acordo com Trengrouse, até as estimativas da FGV já
precisariam ser atualizadas.
Primeiro porque foram feitas mudanças na lista de projetos
ligados ao evento (a Matriz de Responsabilidades da Copa). Alguns não saíram do
papel. Outros foram incluídos de última hora.
Depois porque em 2010 "se esperava que a Copa geraria
um clima de euforia entre a população que, ao menos até agora, não se
materializou" – o que, segundo Trengrouse, acabaria se refletindo em um
nível de consumo mais baixo durante o Mundial.
"Quando a pesquisa foi publicada, cerca de 80% da
população, ou mais, apoiava a realização dos jogos no Brasil", lembra ele.
Nesse meio tempo foram organizados os protestos em que
ganharam força slogans anti-Copa.
Hoje, 55% dos brasileiros acreditam que o Mundial trará mais
prejuízo que benefícios para o país segundo uma pesquisa Datafolha.
"Quanto mais animadas, mais as pessoas tendem a
consumir, decorar suas casas, comprar camisetas e adereços, então precisamos
esperar para entender até que ponto essa falta de euforia será revertida até o
início dos jogos - e, se for o caso, computar seus efeitos econômicos",
diz o professor da FGV.
Interpretações dissonantes
Além da divergência sobre os dados econômicos também há
interpretações dissonantes sobre o que os números significam.
As avaliações da Moody's e da Capital Economics, por
exemplo, não contestam as estimativas do governo. Apenas notam que todos esses
bilhões de reais movimentados ao longo de quatro anos nas preparações para o
evento não representam muita coisa em uma economia de R$ 4,8 trilhões como a
brasileira.
Ou seja, segundo tais avaliações, os efeitos da Copa não
seriam "significativos" para a economia como um todo.
Além disso, os consultores lembram que, como se referem a
investimentos feitos no período 2010 – 2014, a essa altura, a maior parte do
impacto desses recursos já deveria ter sido sentida.
A Capital Economics, ressalta, por exemplo, que as
estimativas iniciais do governo (que acabaram sendo revistas) previam
investimentos diretos em estádios e infraestrutura de R$ 23 bilhões até 2014 –
menos de 1% do PIB.
No caso dos turistas, os consultores calculam que se os 600
mil visitantes esperados pelo governo de fato desembarcarem nos aeroportos
brasileiros, devem gastar um total de US$ 3 bilhões (R$ 6,7 bilhões) – apenas
entre 0,1% e 0,2% do PIB.
É claro que mesmo que os analistas céticos estejam certos –
e o impacto na economia como um todo não seja importante, a Copa ainda pode ter
um efeito expressivo em alguns lugares e para alguns setores em especial.
Quem ganha
Domingues acredita que em certas cidades, como Cuiabá, por
exemplo, o aumento do fluxo de visitantes durante o torneio e as melhorias de
infraestrutura de fato podem representar um impulso importante para a economia
local.
Maennig lembra que na Alemanha a indústria do futebol
recebeu novo fôlego com o Mundial – o que poderia ocorrer também no Brasil.
Entre os setores mais beneficiados pelo evento estão a
construção civil e o turismo. No varejo, as vendas de televisão podem crescer
nas próximas semanas segundo o economista Christian Travassos, da
Fecomercio-RJ.
Por outro lado, no curto prazo, muitas empresas também devem
computar perdas com os feriados decretados por conta do torneio.
"Algumas empresas vão ganhar e outras vão perder.
Nossas estimativas são positivas, mas ainda é difícil prever o saldo do evento
para os próximos meses", afirma Bruno Fernandes, economista da
Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).
Para ele, no longo prazo, o legado econômico do Mundial
dependerá da imagem que o Brasil projetará internacionalmente.
Benin, assessor do Ministério dos Esportes, diz que a
infraestrutura da Copa fará o Brasil ganhar espaço na agenda de torneios
esportivos globais. E o ministro Aldo Rabelo tem repetido que o torneio ajudará
a atrair investimentos e turistas - embora seja difícil estimar o impacto dos
atrasos e acidentes em obras do Mundial nas percepções de empresários
estrangeiros.
"Tentamos ser otimistas, mas se a Copa for um fiasco em
termos de segurança e transportes será mais complicado atrair visitantes e
investidores daqui em diante", diz Fernandes.
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