Olá alunos,
a postagem de hoje possui o condão de causar uma reflexão em qualquer um. Vivemos num mundo onde os 100 mais ricos poderiam acabar com a pobreza no mundo e essa discrepância parece só aumentar. Será que esse sistema está correto? Espero que vocês gostem e reflitam acerca dessa temática. É de autoria de José Antonio Lima e foi publicado no site da Carta Capital.
Yuri Antunes Moreira
Monitor da disciplina ''Economia Política e Direito'' da Universidade Federal Fluminense.
A renda líquida obtida em 2012 pelas 100 pessoas mais ricas do mundo,
240 bilhões de dólares, poderia acabar quatro vezes com a extrema
pobreza no planeta. A conclusão está num relatório publicado
(link em PDF, em inglês) no fim de semana pela ONG britânica Oxfam. A
entidade não entra em detalhes a respeito das contas que fez para chegar
ao dado, mas os números servem como alerta para a intensa e crescente
desigualdade social no mundo. O documento serve para chamar a atenção
para os debates do Fórum Econômico Mundial, que começa nesta terça-feira
22 em Davos, na Suíça. A desigualdade ganhou um painel próprio no
encontro, marcado para sexta-feira 25, mas tanto suas conclusões quanto
os avisos da Oxfam devem cair em ouvidos moucos. O mundo hoje está
construído para ampliar a desigualdade e não há sinais de mudança.
O relatório da Oxfam ecoa estudos e análises econômicas recentes
sobre a desigualdade. Hoje, as diferenças entre os países estão
diminuindo, mas a desigualdade entre os mais ricos e os mais pobres
dentro de cada nação está crescendo. Essa é a regra na maior parte das
nações em desenvolvimento e também nas desenvolvidas.
Nos Estados Unidos, a desigualdade social é tão grande hoje em dia que, nas palavras da revista The Economist,
supera a das últimas décadas do século XIX, a chamada “Era Dourada” do
capitalismo norte-americano. A porcentagem da renda nacional que vai
para o 1% mais rico da população dobrou desde 1980, de 10% para 20%.
Para o 0,01% mais rico, a bonança foi maior: sua renda quadruplicou.
Na União Europeia, a situação também é ruim. No livro Inequality and Instability
(Desigualdade e Instabilidade, em tradução livre), o economista James
Galbraith mostrou que, se tomada como um conjunto, a UE supera os
Estados Unidos em desigualdade. Isso se explica, em parte, pelas
diferenças entre os diversos países do bloco. Ainda assim, se tomadas
separadamente, as nações europeias também têm observado aumento da
desigualdade. Um estudo sobre o tema publicado em 2012 pela OCDE
concluiu que “desde a metade dos anos 1980″, os 10% mais ricos de cada
país “capturam uma crescente parte da renda gerada pela economia,
enquanto os 10% mais pobres estão perdendo terreno”. No Japão, onde 100
milhões de pessoas se diziam de classe média, estudos mostram, desde o
fim da década de 1990, o aumento da desigualdade a partir da metade dos
anos 1980.
A política sequestrada
Não é uma coincidência o aumento da desigualdade no mundo
desenvolvido desde os anos 1980. Foi nesta época que começaram a ter
efeito as políticas lideradas pelos governos de Ronald Reagan nos
Estados Unidos (1981-1989) e Margaret Thatcher (1979-1990) no Reino
Unido, mas adotadas em boa parte do mundo por outros governantes, como
Helmut Kohl (Alemanha), Ruud Lubbers (Holanda) e Bob Hawke (Austrália):
impostos mais baixos, desregulamentação do sistema financeiro, redução
do papel do governo e outras medidas integrantes do receituário
neoliberal. Essa política, arrimo da globalização, teve alguns efeitos
positivos, mas foi levada a extremos por quem se beneficia delas. Para
manter as políticas desejadas, que aumentavam sua riqueza (e também a
desigualdade) esses grupos de interesse se encrustaram nos círculos de
poder. Eles sequestraram a política.
Este fenômeno é analisado no livro Winner-Take-All Politics
(Política do vencedor leva tudo, em tradução livre), dos professores
Jacob S. Hacker, de Yale, e Paul Pierson, da Universidade da Califórnia.
Em artigo de capa da revista Foreign Affairs em dezembro de
2011, o jornalista George Packer resume o argumento do livro em duas
palavras: dinheiro organizado. Foi no fim dos anos 1970 e início dos
anos 1980 que as grandes corporações de diversos setores da economia
passaram a financiar as campanhas eleitorais, dando início a uma “maciça
transferência de riqueza para os americanos mais ricos”.
Este modelo de política, e de fazer política, grassou no mundo
desenvolvido e foi transplantado para os países em desenvolvimento, onde
foi emulado com maestria pelas elites econômicas locais. Não é uma
surpresa, então, que a desigualdade esteja aumentando também nesta
região. A Índia acumula diversos bilionários, mas continua sendo o país
com mais pobres no mundo. A África do Sul é mais desigual hoje do que
era no fim do regime segregacionista do Apartheid. Na China, onde não é
preciso sequestrar a política, apenas pertencer ou ter um bom
relacionamento com o Partido Comunista, a desigualdade é semelhante à
sul-africana: os 10% mais ricos ficam com 60% da renda.
A América Latina e o caso do Brasil
O único lugar do mundo onde a desigualdade está caindo de forma
sistemática é a América Latina, justamente a região mais desigual do
mundo. Isso ocorreu nos últimos anos por dois motivos. O modelo
neoliberal, e a ascensão do “dinheiro organizado”, também chegaram aos
países latino-americanos, mas em alguma medida entraram em choque com
forças políticas contrárias a uma parte importante do receituário, a
não-intervenção do Estado na economia. Assim, os governos da região,
entre eles o de Luiz Inácio Lula da Silva no Brasil, conseguiram
estabelecer a redução da desigualdade social como uma prioridade. Em
segundo lugar, os países da região, também incluindo o Brasil, foram
muito beneficiados pelo rápido crescimento econômico provocado pela
existência de um mundo faminto por commodities.
Há, entretanto, inúmeras dúvidas a respeito da sustentabilidade do
modelo latino-americano de redução da desigualdade, especialmente quando
a economia começar a desacelerar, situação em que o Brasil já se
encontra. Como notou o colunista Vladimir Safatle em edição de dezembro
de CartaCapital, o capitalismo de Estado do governo Lula
promoveu um processo de oligopolização e cartelização da economia, o que
favorece a concentração de renda nas mãos de pequenos grupos. Ao mesmo
tempo, Lula não fez, e Dilma Rousseff não dá indícios de que promoverá, a
universalização e qualificação dos sistemas públicos de educação de
saúde. Sem essas reformas, a classe média seguirá gastando metade de sua
renda com esses dois serviços básicos e os pobres continuarão com
acesso a escolas e hospitais precários. Os ricos, por sua vez, não terão
problemas. A desigualdade de renda poderá cair ainda mais, mas a
desigualdade de oportunidades vai perseverar, e a imensa maioria dos
pobres continuará pobre.
Para fazer essas reformas, e outras potencialmente capazes de reduzir
a desigualdade, como a taxação de grandes fortunas e de heranças e
reformas estruturais, o Brasil e outros países latino-americanos
enfrentarão as mesmas questões do mundo desenvolvido. Em grande medida, a
política latina foi sequestrada pelo “dinheiro organizado”.
Levantamento do repórter Piero Locatelli mostra que, em 2010, 47,8% das
doações eleitorais no Brasil foram feitas por empresas e que apenas 1%
dos doadores foram responsáveis por 73,6% do financiamento da campanha.
O resultado disso, seja nos Estados Unidos, na Europa, na Índia ou no
Brasil, é uma grave crise de representação. O cidadão não consegue
participar da vida pública e ter seus anseios ouvidos pelo governantes.
Os partidos, à esquerda e à direita, caminham cada vez mais para o
centro e, como diz o filósofo esloveno Slavoj Zizek, fica cada vez mais
difícil diferenciá-los. A esquerda, supostamente contrária aos absurdos
do liberalismo econômico, ou aderiu a ele e também tem suas campanhas
financiadas por grandes corporações ou não tem um modelo alternativo e
crível a apresentar.
Em seu relatório, a Oxfam pede aos governos para tomar medidas que,
ao menos, reduzam os níveis atuais de desigualdade social aos de 1990. É
bastante improvável que os política e economicamente poderosos resolvam
fazer isso do dia para a noite. Estão aí os brasileiros que chamam o
Bolsa Família de bolsa-esmola e o ator francês Gerard Depardieu, que
preferiu dar apoio a um ditador a correr o risco de pagar impostos de
75%, para provar isso. Talvez apenas o entendimento de que, como diz a
ONG britânica, a desigualdade social é economicamente ineficiente,
politicamente corrosiva e socialmente divisiva, provoque mudanças. Para
isso, no entanto, é preciso que os poderosos entendam os riscos da
desigualdade.
Infelizmente, o capitalismo é um modelo econômico que preza o individualismo. De fato, a parcela mais rica da sociedade, de forma alguma irá ter como objetivo pôr fim a essa desigualdade social, a menos que isso comece a afetá-los. Apesar da existência de pensamentos altruísticos, o ideal predominante na sociedade contemporânea é o egoísmo e provavelmente continuará sendo. Enfim, essa dialética existente, já dita por Marx há dois séculos atrás, com a companhia do modelo econômico vigente é a ferramenta perfeita para perpetuar as classes dominantes no poder.
ResponderExcluirUm ponto chave na desigualdade é, como apontado no texto, a política ter se tornado refém de grandes corporações. No panorama atual, qualquer candidato para ser eleito se utiliza de fontes de renda particulares em suas campanhas. E depois se torna obrigado a defender os interesses dessas empresas, se quiser o beneficiamento novamente na próxima eleição. Não há mudança nesse panorama, pois as empresas financiam ambos os lados, sabendo que o que vão receber depois é muito maior.
ResponderExcluirNos Estados Unidos, a política se tornou refém do setor agroindustrial e do setor armamentista, a tal ponto de não conseguirem mais se livrar do subsídio agrícola e dos contratos de armamentos, maiores gastos políticos atuais.
No Brasil, está se votando um projeto de lei (PL 268/2011) que, salvo me engano, irá impedir esses financiamentos particulares. Talvez a partir do momento que este projeto for aceito (se for aceito!!) nós possamos ter um combate efetivo à desigualdade.
No Brasil a desigualdade somente tem sido tratada através de paliativos, como os programas sociais desenvolvidos no governo Lula (Bolsa Família, Bolsa Escola...). Essas medidas, porém, estão ajudando a afundar a economia brasileira, pois criam déficits maiores que os ganhos do Estado com essa política. Os programas sociais estão aumentando o dinheiro em circulação e gerando um aumento na inflação. Percebe-se o imenso gasto a partir de pesquisas, que afirmam que 50,4% dos gastos do governo Dilma foram em programas sociais (claro que esses gastos não são somente com esses programas, mas tem um peso neles). O medo da inflação ainda está presente no pensamento brasileiro e não se tem indícios que o país conseguirá controlar a inflação.
De fato, interessante esse projeto de lei do senado nº 268 de 2011, mas é importante ressaltar que essas "doações" feitas tanto por pessoas jurídicas quanto físicas só não serão válidas em ano de eleição. Portanto, essa suposta lei poderia não ser tão boa quanto parece, pois alguns políticos poderiam usufruir do dinheiro público e do privado. Entretanto, é importante essa relação entre o direito e a política, afinal isso reflete em toda a sociedade.
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