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sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Expansão do BRICS: 22 países na fila para ingressar

 


Caros Leitores,

O processo de ampliação do agrupamento BRICS, no contexto da iniciativa BRICS+, aprovou, na última cúpula ocorrida entre 22 e 24 de Agosto, a entrada de seis novos membros ao bloco: Argentina, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã.


Para discutir esse tema, trazemos nesta semana uma notícia para debater e avaliar os motivos pelos quais 22 países asiáticos, africanos e latino-americanos solicitaram formalmente adesão ao BRICS, buscando compreender quais os desdobramentos desse processo na arena internacional.


Esperamos que gostem e compartilhem! 


Alejandro Louro Ferreira é membro do Grupo de Pesquisa em Estado, Instituições e Análise Econômica do Direito.



Chega a 22 o número de países asiáticos, africanos e latino-americanos que solicitaram formalmente a adesão ao Brics. A notícia saiu no diário russo Nezavisimaya Gazeta em 1º de agosto, citando uma fonte da África do Sul. A expansão do Brics é vista como caminho rumo à desdolarização.

A lista de adesão ao Brics inclui sete países árabes: Argélia, Bahrein, Egito, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Sudão e Tunísia.

Outras nações africanas também anunciaram oficialmente sua intenção de se tornarem membros do grupo, incluindo República Democrática do Congo, Gabão, Nigéria, Senegal, União das Comores e Etiópia.

Na Ásia e nas Américas, candidatos à expansão do BRICS.

Na Ásia, Bangladesh, Indonésia e Cazaquistão também esperam se juntar ao grupo. O pedido do Irã está sendo considerado desde o ano passado, assim como a candidatura da Argentina. Nas Américas, Bolívia e Venezuela também manifestaram desejo de adesão ao Brics.


O BRICS reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Neste país africano, em Joanesburgo, será realizada, de 22 a 24 de agosto, a 15ª Cúpula do BRICS.

A ampliação do bloco é capitaneada pela China e pela Rússia. África do Sul também apoia a expansão. Brasil e Índia tinham restrições, mas agora começam a aderir à tese.

Lula defende desdolarização

Em café da manhã com correspondentes estrangeiros nesta quarta-feira (2), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, afirmou que “possivelmente, nessa reunião [Cúpula] a gente já possa decidir, por consenso, quais os países novos que poderão entrar para os Brics”.

“Eu acho extremamente importante a gente permitir que outros países que cumpram as exigências dos Brics entrarem para os Brics. Do ponto de vista mundial, eu acho que os Brics podem ter um papel, eu diria, excepcional”, continuou Lula.

O presidente brasileiro defendeu o uso de uma moda própria para fazer comércio entre os países, seguindo em seu discurso pela desdolarização.

“Por que os países que representam mais da metade da humanidade – se você imaginar Brasil, Índia, China, Indonésia, só esses já representam mais da metade da humanidade – por que a gente não pode discutir isso? Ter uma moeda para fazer negócio entre nós”, disse Lula, citando a Indonésia, que não integra o bloco.

“O Brics, na minha opinião – eu sou um país, mas tem vários outros – o Brics deve vir para ajudar a desenvolver, com financiamento adequado, sem espada na cabeça, os outros países a se desenvolver”, prosseguiu o presidente brasileiro.

“Eu espero que, se a gente conseguir formular esse novo banco [o Novo Banco de Desenvolvimento, NDB, o Banco do Brics] com essa nova mentalidade, a gente possa reeducar as instituições de Bretton Woods a se comportarem de forma diferente com o financiamento para o desenvolvimento”, defendeu Lula.

Índia já admite apoiar novos membros

O primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, já deu sinais de que poderá apoiar a expansão do Brics. A Índia resistia ao ingresso de mais países, mas começou a mudar de ideia com a ampliação da influência da China no Oriente Médio.

Nesta quinta-feira (3), a Índia qualificou de infundadas notícias de que se opõe à expansão do grupo. “Vimos algumas especulações infundadas de que a Índia tem reservas contra a expansão. Isso simplesmente não é verdade”, disse o porta-voz do Ministério de Relações Exteriores, Arindam Bagchi, em entrevista coletiva, segundo o diário indiano Economic Times.

“Conforme mandato dos líderes no ano passado, os membros do Brics estão discutindo internamente os princípios orientadores, padrões, critérios e procedimentos para o processo de expansão com base em consulta e consenso completos”, acrescentou.

Países que desejam expansão do Brics têm importante papel regional

Nailya Yakovleva, pesquisadora-chefe do Centro de Estudos Políticos do Instituto de Estudos Latino-Americanos da Academia Russa de Ciências, destacou ao Nezavisimaya Gazeta que países estão motivados a ingressar no Brics para ter melhores oportunidades de atrair investimentos estrangeiros em infraestrutura projetos.

O Novo Banco de Desenvolvimento – fundado na cúpula do Brics de 2014 em Fortaleza, e que agora é presidido por Dilma Rousseff, ex-presidente do Brasil – é visto como uma fonte ideal de financiamento de que esses países precisam.

Segundo Gustavo de Carvalho, investigador do South African Institute of International Affairs, muitos países candidatos desempenham um importante papel regional e têm economias em rápido desenvolvimento e grandes populações.

A expansão do Brics abre as portas para o uso de moedas alternativas, particularmente no comércio bilateral, tornando os países mais independentes do dólar, cada vez mais utilizado como arma geopolítica e econômica.

quarta-feira, 27 de setembro de 2023

O papel das compras públicas na proteção à indústria nacional


Caros Leitores,


O acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia é um ponto de grande importância que possui repercussão, inclusive, no âmbito das compras públicas brasileiras.


À medida que líderes políticos buscam um equilíbrio entre a abertura de mercados e a proteção de interesses locais, surgem preocupações legítimas sobre os efeitos que o acordo pode ter sobre as pequenas e médias empresas no Brasil. 


Para debater esse tema, trazemos nesta semana uma notícia apresentando os principais debates que circundam as negociações econômicas nessa seara, bem como os desdobramentos geopolíticos e seus impactos que extrapolam a esfera comercial.


Esperamos que gostem e compartilhem! 


Alejandro Louro Ferreira é membro do Grupo de Pesquisa em Estado, Instituições e Análise Econômica do Direito.


Em julho, ocorreu em Bruxelas, a terceira Cúpula da Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac) e a União Europeia. O principal objetivo do evento residia na renovação e consolidação das relações dos blocos econômicos. As discussões realizadas abrangeram tópicos concernentes ao comércio, à pesquisa e educação, à segurança e ao enfrentamento das alterações climáticas. Dentre as discussões, o acordo comercial Mercosul-UE, envolvendo compras públicas, foi um dos assuntos que causou muita controvérsia. O presidente brasileiro, afirmou que almeja a celebração de um acordo que salvaguarde a capacidade das partes envolvidas em lidar com os desafios tanto presentes quanto futuros. Tal declaração foi feita tendo em base o recebimento de uma carta lateral da União Europeia contendo disposições adicionais que não fazem parte do acordo principal. No mês anterior, Lula criticou ferrenhamente os termos encaminhados pelo bloco europeu ao processo de acordo, interpretando as adições como uma ameaça à concretização de um acordo entre as partes. 

De acordo com alguns críticos, apesar da União Europeia ter lançado em 2021 European Green Deal” [1]as demandas do bloco estariam associadas às iniciativas protecionistas, impulsionadas pela necessidade de preservar o emprego dos cidadãos europeus e sustentar um crescimento econômico que vem diminuindo, em parte devido à Guerra na Ucrânia. Dentre os países da União Europeia, há divergências quanto ao tratado, mas ele parece figurar como uma prioridade. 

A resistência mais acentuada parece vir da França: recentemente, a mídia francesa relatou que associações de produtores rurais têm exercido pressão sobre o presidente Emmanuel Macron, exigindo que ele não assine o tratado, que, na perspectiva dessas entidades, poderia comprometer a soberania alimentar do país ao implicar na eliminação substancial das tarifas alfandegárias e na abertura do mercado a produtos estrangeiros.  

Macron e o chanceler alemão,Olaf Scholz, discordam das afirmações de Lula, isto é, que a Europa esteja fazendo ameaças ao Brasil ou ao Mercosul. O presidente francês afirmou que a Françquer a abertura das economias, mas que as relações comerciais precisam estar coerentes com a agenda climática do bloco, uma vez que os regulamentos que são impostos em termos de clima e biodiversidade para os agricultores europeus devem ser respeitados para que a concorrência seja justa. 

Todavia, um estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), recomenda cautela, pois a economia brasileira pode não alcançar os benefícios esperados com o acordoA abertura do mercado para empresas estrangeiras, principalmente em condições de igualdade para empresas locais nas compras públicas, pode implicar em atraso aos planos de reindustrializaçãnacional, que é uma das prioridades do atual governo. Apesar da economia brasileira ter vantagens comparativas em agricultura e mineração, a União Europeia as possui em bens manufaturados. Logo, tratativas de livre-comércio entre os blocos tendem a salientar esse padrão de especialização das economias. O benefício para a economia nacional reside no aumento do acesso aos mercados europeus para a exportação de commodities, bem como na redução dos custos de insumos e bens de consumo industriais. No entanto, essa perspectiva positiva é contrabalançada pela possibilidade de um aprofundamento do processo de desindustrialização. 

O que prevê o acordo Mercosul-UE? 

A questão das compras governamentais desempenha um papel de extrema importância para o Brasil nas tratativas do acordo Mercosul-UE, acordado em 2019 durante o mandato do presidente Jair Bolsonaro (PL). É imprescindível enfatizar que os vinte e nove textos que compõem o acordo estão atualmente sujeitos a uma minuciosa revisão de natureza legal e formal. Consequentemente, os referidos textos não possuem validade jurídica neste estágio. 

Na seção sobre compras públicas, o acordo estipula que ao assumirem obrigações relacionadas aos mercados de compras governamentais, os blocos devem promover maior competição e acesso em licitações domésticas e garantir que os fornecedores de bens e serviços de cada lado recebam tratamento equivalente nas licitações realizadas pelo outro bloco. 

O documento também engloba a obrigação de compartilhar informações acerca da potencial ampliação do acesso recíproco aos mercados de compras públicas em benefício de micro e pequenas empresas. Entretanto, o texto não apresenta qualquer cláusula que assegure que os governos nacionais ou locais possam conceder preferência em licitações a empresas de pequeno porte ou a empresas pertencentes a minorias, tampouco estabelece a disposição de contratar residentes locais. Na verdade, a formulação proposta para os artigos 2(t) e 11 vedaria expressamente essa opção. Dentre as medidas previstas, estão novas regras para compras e serviços governamentais, que permitiriam a participação de grandes empresas em licitações com financiamento público, sem a obrigação de adquirir produtos de agricultores locais ou realizar qualquer contribuição para o desenvolvimento local.  

No contexto brasileiro, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) estabelece uma exigência de que, no mínimo, 30% dos alimentos empregados no programa sejam oriundos de agricultores familiares locais. Adicionalmente, a retomada do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), criado como parte da campanha nacional Fome Zero, visa adquirir alimentos e sementes diretamente de agricultores familiares, com o propósito de abastecer programas sociais e estabelecer estoques públicos de alimentos. Nesse âmbito, cada agricultor tem permissão para vender um valor máximo de R$ 20.000,00. Tais organizações têm relevância ímpar, dado que, no contexto do Brasil, a agricultura familiar representa uma significativa fatia de 74% dos empregos rurais e contribui com 33,2% do Produto Interno Bruto (PIB) agrícola. 

O acordo vai abrir espaço permanente para grandes empresas europeias participarem de importantes programas de compras públicas no bloco, o que pode ser um problema para políticas públicas bem-sucedidas no Brasil e no Mercosul para reduzir a fome e de criação de mercado para agricultores familiares. Fundamentalmente, esse aspecto do acordo vai considerar ilegal, (tirando as exceções previstas) cláusulas de compras públicas que beneficiem as contratações e o desenvolvimento locais. 

A importância das compras públicas 

O sistema do Painel de Compras ainda mostra que entre janeiro de 2022 e agosto de 2023, microempresa e empresa de pequeno porte representam 70,59% de todas as compras homologadas pelo governo. Além disso, as compras governamentais representam por volta de 12% a 15%do PIB, segundo o IBGE. As principais compras consistem em alimentos para refeições em instituições públicas de ensino e de itens para o SUS (Sistema Único de Saúde) e equipamentos tecnológicos.  

Tendo em vista esses números, o presidente afirmou que compras governamentais são “um instrumento de desenvolvimento interno” para pequenas e médias empresas e que o Brasil não pode abrir mão desse potencial. Certos setores são essenciais para garantir a soberania do país, como o setor de itens médicos e hospitalares. Logo, abrir mercado para fornecedores externos do ramo pode perpetuar a dependência de produtos importados e enfraquecer o surgimento de empresas locais. A demanda de itens deste segmento pelo Sistema Único de Saúde via compras públicas estimula o crescimento do setor, auxiliando o estabelecimento e a expansão de indústrias nacionais do ramo. As aquisições governamentais funcionam como engrenagens nas quais o governo pode implementar políticas públicas focando em metas de desenvolvimento e redução de desigualdades. 

Considerando o desenvolvimento de setores estratégicos, a reindustrialização e a autonomia das pequenas empresas, o presidente aproveitou o envio da contraproposta ao adendo do acordo, para rever o acesso da UE às compras governamentais, pois ela quer o cumprimento da agenda ambiental dos países do bloco sul-americano sob pena de sanções comerciais.  

Apesar dos Ministérios do Planejamento e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior serem contra a renegociação do acordo, a ala que defende alterações – composta pela assessoria internacional e a Casa Civil, além dos ministérios da Gestão e da Saúde – afirma que a Nova Lei de Licitações está subordinada aos termos do acordo. Os ministérios que são contra os reajustes do acordo alegam que, com a Reforma Tributária [2], as empresas brasileiras poderão ser mais competitivas. 

Novas tratativas por parte do Brasil 

A contraproposta brasileira pode ser resumida em três itens: “Off-sets”, cotas para pequenas e médias empresas e a exclusão da área envolvendo saúde. 

Um dos novos termos seria o desenvolvimento de uma política de contrapartidas e margens de preferência, que se estenderia tanto à UE como a outros parceiros internacionais.  A sugestão envolveria a estipulação de uma margem de até 20% no preço do bem ou serviço em benefício das empresas brasileiras, o que implicaria na possibilidade de serem selecionadas em licitações, mesmo que seus preços sejam até 20% mais altos que os das empresas europeias concorrentes.  

Esta política consiste em compensações como transferência de tecnologia ou de subcontratação de empresas nacionais para recuperação de áreas degradadas, política conhecida como “Off-sets”. Logo, o artigo 11 do acordo, deveria ser revisto, uma vez que o mesmo proíbe terminantemente qualquer tipo de compensação. 

Sobre as cotas, o governo daria protagonismo à Nova Lei de Licitações, que prevê regime diferenciado de contratação no limite de até 25% em aquisições, permitindo o desenvolvimento das pequenas e Médias Empresas. Em virtude dos fatos mencionados anteriormente, o governo deseja excluir a participação de empresas estrangeiras em licitações envolvendo a área de saúde, tendo em vista a estratégia de alcançar a soberania nacional. 

 O Acordo dificulta a priorização de empresas locais pelos governos ao adquirir produtos ou serviços, com o objetivo de incentivar o mercado interno. No Brasil, as compras públicas são consideradas um mecanismo crucial para fomentar a indústria local, tornando-se essenciais para articular investimentos em infraestrutura e sustentar a política industrial do país. Portanto, o acordo requer ajustes para garantir o desenvolvimento das empresas nacionais, especialmente as de pequeno e médio porte.  

O Brasil tem condições de mostrar que pode cumprir a agenda sustentável através do modelo de agricultura baseada em inovação e pesquisa com seus planos de agricultura de baixa emissão de carbono. A presença da figura íntegra de Marina Silva como Ministra do Meio Ambiente no governo desperta expectativas de uma conduta alinhada com a preservação do meio ambiente. Caso o acordo UE-Mercosul não seja renegociado, as atuais clausulas podem atrapalhar o desenvolvimento justo e sustentável, não apenas do Brasil, mas da América Latina como um todo. É imperativo que nenhum acordo restrinja a prerrogativa estatal de assegurar que os recursos públicos sejam alocados de modo a beneficiar as economias locais. 

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segunda-feira, 25 de setembro de 2023

O BRICS e a nova geopolítica econômica internacional 


Caros Leitores,


O agrupamento BRICS tem dinamizado novos processos no interior do bloco decorrentes da XV Cúpula ocorrida entre 22 e 24 de Agosto de 2023. Dentro desse contexto tem sido discutida a viabilidade de uma moeda alternativa ao dólar, a expansão do grupo com a iniciativa BRICS+ bem como o papel do Novo Banco de Desenvolvimento (New Development Bank) nesse processo.


Para debater esses temas, trazemos essa semana esta notícia que discute o papel do Bloco no âmbito da geopolítica econômica internacional, buscando compreender quais as possibilidades do Banco dos BRICS funcionar como uma alternativa à centralização financeira ocidental.  


Esperamos que gostem e compartilhem! 


Alejandro Louro Ferreira é membro do Grupo de Pesquisa em Estado, Instituições e Análise Econômica do Direito.


O declínio da velha ordem liderada por norte-americanos e europeus é um fato cada vez mais concreto. Estamos vivendo novos tempos. São inúmeros os exemplos: a perda de influência geopolítica, econômica e ideológica. Vamos analisar o caso do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), o “Banco do Brics”, tentando responder à seguinte questão: o NBD poderá funcionar como uma alternativa à centralização financeira ocidental? Mais especificamente: o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, manterão o controle e a imposição de receituário neoliberal na oferta de créditos internacionais?  

Gostaríamos de chamar a atenção para um detalhe sobre a maioria das análises sobre o NBD até o presente momento. A grande parte faz menção quase que exclusivamente aos impactos econômicos do banco na arquitetura financeira mundial, deixando de lado os aspectos geopolíticos que a instituição provocará no cenário internacional. Os impactos econômico-financeiros serão, sem dúvida alguma, importantes. Os geopolíticos, serão ainda maiores.

O século XXI trouxe uma série de transformações para a economia internacional e para as relações internacionais. A República Popular da China se consolidou como grande player mundial em decorrência de seu crescimento econômico a partir dos anos 1980. Com o fim da Guerra Fria, a economia capitalista apresentou uma grande expansão, ao mesmo tempo em que os EUA e a Europa iniciavam o seu processo de declínio gradual no atual Ciclo Sistêmico de Acumulação, comandado por Washington (Arrighi 1996). Este contexto propiciou uma “janela de oportunidades” para uma atuação antissistêmica por parte de vários países como China, Rússia, Índia e Brasil (Pennaforte 2021).  Cada um com seus objetivos políticos, econômicos e estratégicos, mas tendo como horizonte um mundo multipolar e multilateral. 

A criação do NBD em 2015, se constituiu na primeira iniciativa financeira (institucional) fora do eixo euro-atlântico desde 1945.  Desde o final da Segunda Guerra Mundial, norte-americanos e europeus vêm comandando o sistema financeiro internacional que, ao longo do tempo, impôs uma série de medidas econômicas para a oferta de crédito, pelo FMI, aos países em desenvolvimento que buscavam a industrialização. Tais medidas econômicas promoviam grandes impactos sobre a sociedade ao impor cortes de gastos que sempre impactavam as áreas sociais, promoviam refluxo nos investimentos e provocavam a recessão, principalmente na América Latina. 

A concepção do NBD se deu em 2014, na Cúpula do Brics de Fortaleza, com sua entrada em funcionamento em Xangai (China), no ano de 2015, com um capital autorizado de 100 bilhões de dólares. Pela primeira vez na história, os países “emergentes” ou do Sul Global iniciaram a criação de um órgão financeiro com possibilidades de oferecer créditos à comunidade internacional. Com a ajuda do NBD, inúmeros países interessados nos financiamentos poderão avançar em seus projetos de desenvolvimento sob melhores condições. 

O NBD coloca o Brics como um possível protagonista global na disputa por áreas de influência no sistema internacional e poderá se constituir em um importante mecanismo geopolítico e econômico, no atual momento de transição sistêmica para um cenário onde o eixo Washington-Bruxelas perderá a sua influência. Um novo polo de oferta de créditos trará novas perspectivas para inúmeros países que não dependerão mais necessariamente do FMI ou Banco Mundial para iniciar ou dar prosseguimento aos seus processos de desenvolvimento.  

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terça-feira, 19 de setembro de 2023

Divulgação do Livro: "Direito & Comunicação: Aspectos Teóricos de Inter-relacionamento"


Caros Leitores,

Essa semana iremos compartilhar o conteúdo do livro intitulado "Direito & Comunicação: Aspectos Teóricos de Inter-relacionamento".


A intrínseca relação entre o Direito e a comunicação no decorrer do tempo revela como se deu o processo de conquista da liberdade de pensamento, expressão e de informação ao longo dos séculos. A partir da observação dos eventos históricos nos quais a comunicação apresentou-se como decisiva para os desencadeamentos das estruturas sociais, pode-se compreender os motivos pelos quais a liberdade de imprensa representa parte integrante dos Direitos Humanos.


Com a finalidade de debater tal questão, trazemos o material que compõe o livro organizado pela Associação Brasileira de Editores Científicos (ABEC) intitulado “Direito & Comunicação: Aspectos Teóricos de Interelacionamento”.

Esperamos que gostem e compartilhem! 


Alejandro Louro Ferreira é membro do Grupo de Pesquisa em Estado, Instituições e Análise Econômica do Direito.


Acesse Aqui



terça-feira, 12 de setembro de 2023

A América Latina na cena internacional


Caros Leitores,


Tendo em vista o contexto do conflito entre Rússia e Ucrânia, a participação da América Latina em espaços internacionais de deliberação tem sido pouco expressiva nos últimos tempos, apesar das frequentes tentativas de reforço de unificação de uma agenda comum pelos países latinos bem como da contribuição regional para a pacificação de conflitos internacionais. 


Diante dessa questão, trazemos nesta semana uma notícia que examina os principais desafios regionais nos dias de hoje, bem como os aspectos limitantes da inserção da América Latina como agente de maior expressividade e relevância na arena internacional.


Esperamos que gostem e compartilhem!


Fernanda Lima é membro do Grupo de Pesquisa em Estado, Instituições e Análise Econômica do Direito.


Poucas reuniões recentes suscitaram tantas expectativas internacionais quanto a da OTAN em Vilnius, capital da Lituânia, em 11 de julho passado. Discutiram-se ali novos passos do apoio à Ucrânia em sua guerra contra a Rússia. O resultado foi resumido num extenso documento de 30 páginas e 90 parágrafos, no qual não há uma única referência à América Latina.

Isto pode parecer normal. O tratado da OTAN define o Atlântico Norte como sua área de operações, e aos seus 12 países fundadores foram juntando-se outros 19, dos quais 15 são da Europa de Leste, depois da dissolução da União Soviética. Nenhum país latino-americano pertence à região, nem é membro da instituição e, com exceção da Costa Rica, nenhum aderiu às sanções impostas à Rússia pelos países da OTAN e seus aliados.

Mas a geografia provavelmente não esgota a explicação. Nas últimas décadas, a OTAN estendeu suas filiações a toda a Europa, até as fronteiras da Rússia, e o comunicado de Vilnius indica, no primeiro parágrafo, sua aspiração de assegurar a defesa coletiva de seus membros contra todas as ameaças, numa visão de 360 graus. Em outras palavras, o mundo inteiro.

Não se trata de discutir aqui afirmações do documento como a natureza defensiva da organização, nem o reconhecimento de sua dependência das forças nucleares estratégicas dos Estados Unidos, nem sua visão sobre a origem da guerra na Ucrânia, nem os acordos adotados para apoiar o país em sua guerra contra a Rússia. Trata-se aqui de outra questão: tentar entender a reiterada ausência da América Latina em documentos recentes de potências e organizações internacionais, nos quais a região ou não é mencionada, ou é citada apenas de forma secundária. Quanto à OTAN, é completamente ignorada, como já indicamos.

O documento faz referência a vários casos sensíveis para a estabilidade da Europa, como os Balcãs Ocidentais; menciona a importância da paz entre Bósnia e Herzegovina, as relações com a Sérvia, Kosovo, Geórgia (que pretende ingressar na aliança) e Moldávia, e reconhece que o papel de seus aliados não europeus é essencial para a defesa da Europa.

Destacam a República Popular da China como uma ameaça aos interesses, à segurança e aos valores da Aliança e que os desdobramentos na região do Indo-Pacífico “podem afetar diretamente a segurança euro-atlântica”. Saúdam a contribuição de seus aliados na região – Austrália, Japão, Nova Zelândia e Coreia do Sul – e ressaltam a importância das relações da OTAN com as Nações Unidas, a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) e a União Africana. Reiteram sua determinação em impedir o Irã de desenvolver armas nucleares e condenam o programa de mísseis balísticos da Coreia do Norte.

Fazem referência aos vizinhos do sul da OTAN, particularmente o Oriente Médio, o Norte da África e o Sahel. Reafirmam a intenção de estabilizar a situação no Iraque, a importância geopolítica do Mar Negro, do Oriente Médio e de África. Mas a América Latina nem sequer aparece no parágrafo 68, no qual se afirma que a segurança energética desempenha um papel importante na segurança global, nos mesmos dias em que foi confirmada a descoberta da maior reserva de lítio do mundo na Bolívia.

Nenhum lugar para a América Latina

Talvez devêssemos procurar um lugar para a América Latina em outro local. Em outubro do ano passado, a Casa Branca publicou um documento sobre sua “National Security Strategy”. Se não devemos esperar referências especiais à América Latina num documento da OTAN, pareceria lógico encontrá-las nas definições estratégicas dos Estados Unidos, cuja longa e estreita relação com o hemisfério faz parte da história.

Na introdução do documento, Joe Biden compromete-se a continuar defendendo a democracia ao redor do mundo e celebra a renovação de uma formidável rede de alianças. Primeiro, com a União Europeia; depois, com o Quad na região do Indo-Pacífico, com a qual estabeleceu também um marco de cooperação econômica. Só em quarto lugar é citada sua iniciativa para a região, a “Parceria das Américas para a Prosperidade Econômica”, lançada em junho de 2022.

O documento de 48 páginas analisa os interesses estratégicos dos Estados Unidos por região. No que diz respeito à América Latina, em duas páginas, é abordada a promoção da democracia e de uma suposta “prosperidade compartilhada”. Entre os objetivos da Parceria está o de “restaurar a fé na democracia” na região, prometendo criar bons empregos e lidar com a desigualdade econômica. Não são objetivos menores, com países como os próprios Estados Unidos, ou o Brasil, ainda comovidos com as tentativas de subversão da ordem política e com a promoção de protestos violentos para desconhecer eleições por parte de apoiadores dos ex-presidentes Trump e Bolsonaro, para citar apenas dois casos extremos de tensões políticas renovadas, sustentadas por uma crescente disparidade econômica.

Em 27 de janeiro de 2023, a Casa Branca pretendia relançar, num evento ministerial com a participação de doze países da região, a proposta da Parceria que, apesar de tudo, definha sem qualquer perspectiva de desenvolvimento. No entanto, aqueles que, do fato que a América Latina é pouco mencionada nestes acordos, tiram a conclusão que seu papel é secundário na ordem internacional deveriam ler as duas páginas nas quais a National Security Strategy se refere à região.

O documento afirma que “nenhuma região tem um impacto mais direto no país do que o Hemisfério Ocidental”. Com um comércio anual de 1,9 trilhão de dólares, “com valores compartilhados e tradições democráticas”, a região tem contribuído decisivamente para a prosperidade e resiliência dos Estados Unidos, cuja segurança e prosperidade estão ligadas às de seus vizinhos, reconhece o documento.

Entre seus objetivos estão também “proteger-nos de interferências externas, incluindo da República Popular da China, Rússia ou Irã”, e, “em aliança com a sociedade civil e com outros governos, apoiar a autodeterminação democrática dos povos da Venezuela, Cuba e Nicarágua”. Reconhece-se, assim, a ingerência no processo político dos nossos países, a desestabilização permanente sustentada, no passado recente, por golpes civil-militares e, atualmente, por sanções econômicas unilaterais cujos efeitos devastadores, no caso de Cuba, já têm mais de 60 anos. Sanções condenadas todos os anos praticamente por unanimidade pela Assembleia Geral das Nações Unidas, sem que a Casa Branca acate nenhuma dessas resoluções.

A quinta-coluna

Sob sanções drásticas, Cuba, assim como a Venezuela e a Nicarágua, enfrentam enormes dificuldades não só para manter suas economias funcionando, mas também para desenvolver sua vida política com alguma normalidade, uma vez que a oposição conta com a deterioração econômica causada pelas sanções de Washington e com o apoio político de uma vasta rede de ONGs que a financiam com recursos, publicidade e capacitação profissional.

Muito recentemente, em 20 de julho, a subsecretária de estado para os assuntos políticos dos Estados Unidos, Victoria Nuland apelou ao Brasil, numa entrevista ao jornal O Globo, que utilizasse sua “liderança” e habilidade diplomática para influenciar as eleições na Venezuela, de modo a conseguir um jogo “livre e justo” em que “todos os candidatos possam concorrer”. O presidente Nicolás Maduro já tinha se referido a estas iniciativas norte-americanas, exigindo eleições livres das sanções econômicas impostas ao país por Washington, cuja intervenção a favor da oposição impossibilita a realização de eleições “livres e justas”.

O que gostaríamos de sugerir neste artigo é que precisamente esta “quinta-coluna”, financiada e organizada por Washington, é o que torna desnecessário, e inclusive inconveniente, fazer referência detalhada às políticas para a América Latina, num cenário em que a intervenção externa requer, na verdade, discrição.

De Vilnius à CELAC

Mas houve mudanças no papel da América Latina na cena internacional. A presença de Lula, desde que assumiu novamente a presidência do Brasil em janeiro último, é o fator mais importante dessas mudanças, facilitando o ressurgimento da Unasul, acrescentando novas propostas para lidar com o conflito entre Rússia, Ucrânia e OTAN, redefinindo os termos das relações com a União Europeia, ou retomando a atividade dos BRICS, que se reunirão em agosto na África do Sul.

Em 30 de maio, Lula reuniu-se em Brasília com chefes de Estado latino-americanos (a única ausência foi a do Peru), incluindo o presidente venezuelano Nicolás Maduro, cujo isolamento faz parte da política promovida por Washington, com o apoio de governos conservadores e aliados políticos regionais: a “quinta-coluna”. Uma “quinta-coluna” que desvincula seu projeto de qualquer projeto de desenvolvimento nacional e faz lembrar a “quinta fronteira”, a que representava para o Panamá – nas palavras do general Omar Torrijos – a Zona do Canal, então nas mãos dos Estados Unidos.

Os fatores que unem a região “estão acima das ideologias”, afirmou Lula, referindo-se a uma possível reativação da Unasul. “Nenhum país pode enfrentar as ameaças atuais de forma isolada”. Uma ideia que reiterou na reunião com o Fórum Empresarial da União Europeia, em 19 de julho: “O Brasil só crescerá de forma sustentável com a integração do nosso entorno regional”.

Diante desta realidade e das mudanças que a guerra na Europa significaram para a cena internacional, a correspondente em Bruxelas do diário catalão La Vanguardia, Beatriz Navarro, ressaltou que “depois de anos de esquecimento e desinteresse, que outros atores globais – leia-se a China – aproveitaram a fundo para expandir sua influência na região, a União Europeia voltará hoje seu olhar para a América Latina e o Caribe com a realização da primeira cúpula de chefes de estado e de governo de ambos os blocos desde o distante 2015”.

Na ocasião, o presidente brasileiro reiterou uma vez mais a necessidade de uma aliança que ponha fim a uma divisão internacional do trabalho que só tem significado pobreza para a maior parte da região, com nosso papel de fornecedores de matérias-primas e de mão de obra migrante barata. Lembrou que, em 2009, os países desenvolvidos concordaram em destinar 100 bilhões de dólares por ano aos países em desenvolvimento, um compromisso “que nunca foi cumprido”. A frase lembra-nos que esses 100 bilhões de dólares na verdade foram gastos, em alguns meses, no fornecimento de armas à Ucrânia, numa indicação das prioridades do Ocidente.

Para o diretor do La Vanguardia em Madri, Enric Juliana, a posição dos países latino-americanos sobre a guerra na Ucrânia, expressa na cúpula da CELAC com a União Europeia, explica-se pelo fato de “não quererem confrontar diplomaticamente a Rússia e a China, por razões econômicas, mas também políticas”. Juliana, tal como os líderes europeus, tem dificuldade em entender que, para Lula, é urgente reformar a governança global, como ele explicou na Europa, e que “dividir o mundo em blocos antagônicos não faz sentido”.

Com o mundo em transição, talvez valha a pena ouvir mais uma vez as palavras do acadêmico e diplomata de Cingapura Kishore Mahbubani, uma figura que precisa ser ouvida na América Latina para uma visão mais equilibrada destas mudanças. Em seu mais recente livro, The Asian 21st century (com livre acesso), reitera sua ideia de que o século de predomínio norte-americano terminou e que as tentativas de Washington para conter a China apenas acabarão isolando os Estados Unidos do resto do mundo. Os editores de seu livro esperavam cerca de 20.000 visitas ao texto, disse Mahbubani. No entanto, já ultrapassaram três milhões.

A “quinta-coluna” não nos ajuda a pensar nesse mundo no qual a América Latina ainda não encontrou seu lugar, apesar das recentes iniciativas para reforçar sua unidade e desempenhar um papel nos esforços de paz que renovem a governança global e ponham fim a uma visão de mundo baseada em blocos antagônicos.