Olá alunos,
A postagem de hoje expõe que, diante da morosidade da Justiça comum brasileira, surge a necessidade de
utilização de meios alternativos que proporcionem às partes uma celeridade
maior na resolução de conflitos. Nesse contexto, destacam-se a arbitragem, a
mediação e a conciliação como formas de desafogar o Judiciário e proporcionar à
empresas de grande, médio e pequeno portes, uma solução satisfatória para o
litígio que se pretende levar à Justiça. Embora ainda predomine no Brasil, um
entendimento de que a Justiça comum é a opção mais segura para resolução de
conflitos, esses meios alternativos têm adquirido cada vez mais visibilidade e
espaço em diplomas legais que entraram em vigor recentemente.
Esperamos que gostem e participem.
Joyce Borgatti e Palloma Borges.
Monitoras da disciplina “Economia Política e Direito” da Universidade
Federal Fluminense.
Um julgamento na Justiça brasileira pode demorar 10, 20 anos, a
morosidade alimentada pela possibilidade de interpor incontáveis recursos às
decisões. Uma parte das disputas específicas entre empresas é decidida,
entretanto, cinco vezes mais rapidamente, e não há aceitação de recursos. Esse
universo singular é o das câmaras de arbitragem, tribunais privados em
crescimento exponencial no País.
No acompanhamento feito pela Câmara de Arbitragem da Câmara de Comércio
Internacional, o Brasil ocupa o terceiro lugar em número de casos registrados
em 2014, atrás apenas dos Estados Unidos e da França. Na mais antiga e maior
câmara arbitral do País, o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de
Comércio Brasil-Canadá, o número de casos passou de 95, em 2014, para 112, no
ano passado, com crescimento de 18%. No início dos anos 2000, eram menos de
dez.
“É uma alternativa que cresceu muito e a morosidade da Justiça
brasileira com certeza tem tudo a ver com isso”, diz Flávia Bittar Neves,
presidente do Comitê Brasileiro de Arbitragem. “A burocracia do processo
judicial é frustrante e as empresas querem segurança jurídica.”
Nos países avançados, a explicação para o grande volume de arbitragens é
o tamanho das economias. Aqui é o congestionamento da Justiça. Segundo o Conselho
Nacional de Justiça, entidade pública de monitoramento do Poder Judiciário, o
Brasil acumulava 99,7 milhões de processos em tramitação no fim de 2014. Na
estimativa do CNJ, seriam necessários dois anos e meio de trabalho dos
magistrados para zerar o estoque atual. O volume de processos cresce 3% a 4% ao
ano e o número de casos concluídos, de 28,5 milhões no ano passado, fica sempre
abaixo daqueles abertos, de 28,9 milhões no mesmo período.
O alto número de recursos explica boa parte do congestionamento. “No
processo arbitral não há essa possibilidade, ele acaba quando a decisão é
proferida e essa é uma de suas grandes vantagens”, explica o desembargador
Sidney Rocha de Souza. Aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo, Souza é
conciliador da Concilium Câmara de Arbitragem e Mediação, criada no início de
2015, em São Paulo, por um grupo de ex-magistrados. “Nos tempos de
desembargador, eu votava 300 casos por mês. Como árbitro, trabalho com um ou
dois no mesmo período”, compara Souza.
A estruturação das câmaras contribui para a sua agilidade.
Os árbitros são escolhidos pelas partes e, ao contrário do juiz público, com
carreira na área do Direito, eles podem ser advogados ou engenheiros,
administradores, cientistas e outros profissionais.
“A duração média de resolução dos nossos casos é de 12 a 18 meses,
enquanto um processo na Justiça pode facilmente levar mais de dez anos”, diz
Letícia Abdalla, secretária-geral da Câmara de Conciliação, Mediação e
Arbitragem da Ciesp-Fiesp. Outro atrativo é o sigilo. Enquanto os casos na
Justiça comum são públicos, os das câmaras privadas são confidenciais, dando
mais segurança à estratégia e à imagem da empresa. A sentença arbitral produz,
entre os litigantes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos
órgãos do Poder Judiciário.
Uma comparação costuma ser citada como exemplo da velocidade da
arbitragem e da morosidade da Justiça. A disputa pelo espólio do fundador e
ex-presidente do Bradesco Amador Aguiar, falecido em 1991, envolveu dez ações,
50 recursos e demorou 22 anos na Justiça. A demanda entre o Pão de Açúcar,
fundado pelo empresário Abilio Diniz, e o grupo francês Casino, que adquiriu o
controle da rede brasileira em 2006, levou dois anos e meio para ser julgada em
uma câmara de arbitragem.
A arbitragem, a mediação e a conciliação são opções ao processo
judicial, visam a acordos e consensos e, quando bem-sucedidas, evitam o caminho
moroso da Justiça. O seu fortalecimento deve contribuir para desafogar os
tribunais brasileiros. “Nem todos os conflitos precisam passar pelo
Judiciário”, diz Marcelo Veiga, responsável pela Secretaria da Reforma do
Judiciário do Ministério da Justiça. “O foco é aumentar o acesso às diferentes
formas de solução de conflito, e isso resulta diretamente na diminuição do
número de processos.”
O aperfeiçoamento da regulamentação deve aumentar o volume de
disputas resolvidas fora do Poder Judiciário. Em julho, entrou em vigor a nova
Lei da Arbitragem, de número 3.129, que ampliou a aplicação da Lei nº 9.307 de
1996 e incorporou entidades do poder público. Seguiram-se a Lei da Mediação,
13.140/2015, em vigor desde dezembro, e o novo Código de Processo Civil, que
passará a valer a partir de março e fortalece também a conciliação como solução
jurídica.
Além de não envolverem um julgamento tradicional, a mediação e a
conciliação são mais baratas e acessíveis à pequena e média empresa e aos
indivíduos. “Essas alternativas podem proporcionar uma contribuição importante
para desafogar a Justiça”, diz Flávia Neves. A mediação se presta para todos os
tipos de disputas e deve servir como um filtro para que só os casos realmente
complexos cheguem à Justiça. Disputas em relação a divórcios, aluguéis,
questões de vizinhança, desentendimentos familiares, relações de consumo,
conflitos trabalhistas e mesmo crimes podem ser objeto de conciliação ou
mediação.
“A arbitragem é bem mais cara do que o Judiciário, mas muito mais rápida
e efetiva para uma empresa e a velocidade do julgamento se sobrepõe ao fator
custo”, observa Sidney Gomes, consultor do FTI Consulting, grupo mundial de
consultoria jurídica e estratégica para empresas. Um processo prolongado
prejudica o planejamento das companhias e afeta a sua imagem diante de
investidores e clientes.
Na tabela da CCBC, as taxas administrativas de um processo arbitral
variam de 50 mil reais, para os casos abaixo de 4 milhões, até 150 mil, nas
pendências com mais de 1 bilhão em jogo. Somam-se a isso os honorários de cada
árbitro, entre 75 mil e 504 mil reais. Os custos de uma reclamação relativa a
uma indenização de 200 milhões de reais podem chegar a 1 milhão, mas, na
prática, os valores são livremente fixados pelas câmaras. No processo
tradicional, as despesas recolhidas pelo serviço básico de qualquer ação, a
exemplo de uma petição inicial ou de um preparo da apelação e execução,
obedecem a um teto conforme o estado. No Tribunal de Justiça de São Paulo, o
limite é de 70,65 mil reais.
“A arbitragem é uma opção onerosa e não vale a pena para solucionar
todas as disputas”, diz Carlos Forbes, presidente da câmara da CCBC. “Só
compensa mesmo para as causas de, no mínimo, 1 milhão de reais”, calcula. É por
isso que, embora possa ser aplicada a quase qualquer problema envolvendo
patrimônio, é usada principalmente por grandes empresas. No primeiro
semestre do ano passado, o valor médio das causas abertas nas principais
câmaras arbitrais do País chegou a 45 milhões de reais. Foram 110 novos
processos, no total aproximado de 5 bilhões, segundo o levantamento Arbitragem
em Números e Valores, feito pela advogada e árbitra Selma Lemes.
“O congestionamento da Justiça e o crescimento da arbitragem denotam uma
cultura do litígio”, diz Marcelo Veiga. “Nos cursos de Direito, o ensino da
arbitragem não é obrigatório. Prevalece na sociedade a percepção de que um
problema só é resolvido se a palavra final for de um juiz.” A parte descontente
com a solução da arbitragem pode pedir a anulação da decisão. Nesse caso, a
demanda é convertida em uma nova ação e é encaminhada à Justiça comum. A
aceitação das arbitragens é elevada, entretanto, entre 70% e 80% dos
casos.
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