Olá alunos,
Direito Penal Econômico. Pouco conhecido por nós, mas algo que nos
permeia tanto. Considerado
como o conjunto de normas jurídico-penais que protegem a ordem econômica, vista
essa como a regulação jurídica da produção, distribuição e consumo de bens e
serviços, ou seja, uma forma de intervenção penal em um ramo basicamente
individual. A postagem de hoje pretende analisar melhor como este se dá e quais
reflexos em nossa sociedade.
Gostaríamos de agradecer aos alunos
da disciplina “Economia Política e Direito” da Universidade Federal Fluminense,
Ana Lucia Soares de Abreu, Caio Giusti Rolla, Igor Raposo
Santos, Luis Alekssandre Leonel Nascimento, Matheus Sampaio
e Rafael Dias, do turno noturno, pela indicação da notícia.
Esperamos que gostem e participem.
Joyce Borgatti e Palloma Borges.
Monitoras da disciplina “Economia
Política e Direito” da Universidade Federal Fluminense.
A
intervenção estatal na Economia no século XX possui, como acontecimentos
fundamentais, as duas Grandes Guerras Mundiais e a Crise de 1929. Ou, como bem
sintetizado por FRAGOSO (1982, p. 123), “corresponde o direito penal econômico
ao direito econômico que surge com a primeira guerra mundial e com o fim da
economia liberal, através da intervenção do Estado no processo econômico”.
A
esse respeito, observa Caldera (2004, p. 65) que:
“diante
da separação entre o econômico e o jurídico, faz parecer que o direito não é
necessário para regular os processos da economia, como se o ato ou os atos
econômicos existissem à margem das regras que regem a sociedade; [assim], a
restauração da relação entre o econômico e o jurídico é um aspecto fundamental
para procurar, ainda que seja, uma mínima unidade na sociedade, [sendo]
imprescindível para estabelecer regras do jogo claras, direitos e deveres
específicos e garantias necessárias entre os interlocutores e os atores da
atividade econômica.”
As
constantes modificações nas relações sociais, políticas e o dinamismo da
economia não sejam um fenômeno específico da contemporaneidade, nos tempos
atuais, elas oportunizaram, dentre outras tantas consideráveis rupturas, o
surgimento de novas formas de comportamentos danosos, que representam novos
riscos para a sociedade. Esse movimento insere-se na perspectiva moderna de
prevenção dorisco, “um termo moderno, inserido no vocabulário inglês no
século XVII, originado de uma expressão náutica espanhola que significa ‘correr
para o perigo’ ou ‘ir contra a rocha’ (GIDDENS, 1991, p. 38). Está-se, pois,
diante de uma nova realidade, a “Sociedade do Risco”, em que “risco significa a
antecipação da catástrofe” (BECK, 2008, p. 23).
Segundo
Thomas Rotsch (2001, p. 80-81):
“no
moderno direito penal, a discussão científica é caracterizada por meio de um
fenômeno que, em proporções cada vez maiores, parte não mais da reação ao
passado, senão da realização do futuro, e, portanto, o direito penal se
degenera em um instrumento de manobra e domínio dos riscos. Com isso, nós nos
vemos confrontados com a dificuldade de ter que solucionar problemas cada vez
mais complexos em um período de tempo cada vez menor. Isto tem repercussão
direta sobre a qualidade da ciência, que não mais encontra tempo para se
afirmar.”
Nessa
perspectiva, conceitua-se o Direito Penal Econômico como “o conjunto de normas
jurídico-penais que protegem a ordem econômica, vista essa como a regulação
jurídica da produção, distribuição e consumo de bens e serviços” (BAJO e BACIGALUPO,
2001, p. 13-14). No sentido amplo, “é o conjunto de normas jurídico-penais que
protegem a ordem econômica entendida como regulação da produção, distribuição e
consumo de bens e serviços” (BAJO e BACIGALUPO, 2001, p. 14).
O
que se verifica a partir do exame dessas duas acepções e, tendo como premissa a
circunstância de que a legitimidade das restrições às liberdades decorrente da
criminalização deve ser pensada, vale aqui referir, a partir de sua relação
harmonia com a ordem axiológico-jurídico constitucional, que atua como “um
quadro obrigatório de referência e, ao mesmo tempo, critério regulativo da
atividade punitiva” (FIGUEIREDO DIAS, 2007, p. 120), é que o conceito amplo de
direito penal econômico descaracteriza-o como sub-ramo do direito penal, pois
não haveria justificativa para a sua “especialidade”.
O
direito penal econômico diz respeito à intervenção penal em um campo
supraindividual, tem proporcionado questionamentos acerca de sua estruturação
em relação ao direito penal nuclear, bem como a certas características que lhe
são atribuídas, tais como maleabilidade, a mobilidade, a flexibilidade,
revisibilidade e transdisciplinaridade. Acerca da debatida autonomia entre
Direito Penal e Direito Penal Econômico, convém referir a advertência de Helena
Lobo da Costa (COSTA, 2013, p. 84-85) no sentido de que:
“parece
não haver fundamento teórico suficiente a justificar uma autonomização do
direito penal econômico; assim, argumentos no sentido de que tais princípios
devem ser relativizados para conferir maior agilidade ou efetividade a este
campo do direito configuram erros categoriais já que a metodologia do direito
penal não é orientada somente pelos vetores de eficácia e agilidade.”
O
bem jurídico tutelado pelo Direito Penal Econômico é a ordem econômica, um bem
jurídico supraindividual. A ordem econômica, em sentido amplo, pode ser
concebida como “o conjunto de normas definidoras, de forma institucional, de um
determinado modo de produção econômica” (GRAU, 2007, p. 72). No entanto,
opta-se, aqui pela proteção da ordem econômica em sentido estrito que “não é,
pois, outra coisa que a intervenção direta do Estado na relação econômica, como
um sujeito de primeira ordem, impondo, coativamente, uma série de normas ou
planificando o comportamento dos sujeitos econômicos” (MUÑOZ CONDE, 1998, p.
68).
Em
face da recorrente necessidade de questionamento acerca do espaço do Direito
Penal na contemporaneidade, ou seja, do seu espaço de legitimidade e feitas
essas primeiras observações, pequenas “pinceladas” acerca de discussões
recentes (e não encerradas) travadas no âmbito da dogmática penal, inicia-se, a
partir dessa breve coluna, o debate acerca da expansão do direito penal em
matéria de criminalidade econômica. As matérias a serem tratadas nos próximos
escritos serão as seguintes: a mitigação do princípio da legalidade, o uso
excessivo de normas penais em branco; a criação de crimes de perigo abstrato, a
adoção da teoria do bem jurídico e suas implicações e, por fim, a
responsabilização de entes coletivos.
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