Olá
alunos,
Em
entrevista, Débora Nunes, do MST, explica porque diversos prédios do Ministério
da Fazenda estão sendo ocupados pelos Sem Terra em todo o país. A postagem de
hoje visa trazer maiores esclarecimentos sobre os acontecidos desta última
semana.
Esperamos que gostem e aproveitem.
Joyce Borgatti e Palloma Borges.
Monitoras da disciplina “Economia Política e
Direito” da Universidade Federal Fluminense.
Diversos edifícios do Ministério
da Fazenda amanheceram ocupados por milhares de Sem Terra em todo o país, na
última segunda-feira (3).
A pauta principal dos protestos,
segundo o movimento, é a denúncia ao ajuste fiscal do governo federal, que
dentre outras coisas, cortou quase 50% dos recursos da Reforma Agrária para este
ano.
Para entender melhor o que se
passa, o Brasil de Fato divulga
entrevista de Débora Nunes, da direção nacional do MST, publicada no site da
organização.
“Queremos que toda a sociedade
saiba que é no Ministério da Fazenda onde se coloca em prática a política
econômica ditada pelo capital e pela burguesia, contra o povo brasileiro”,
afirma Nunes.
Para ela, “o governo precisa ter
coragem de rever essa política e adotar medidas que resolvam os problemas
econômicos, mas cobrando de quem de fato deve pagar a conta, que são os ricos,
a burguesia e o capital. Ter coragem de taxar as grandes fortunas e fazer com
os mais ricos paguem mais impostos”.
Confira a íntegra da entrevista:
Por que estão sendo ocupados
diversos ministérios da Fazenda em todo o país pelos Sem Terra?
O Ministério da Fazenda é a casa
responsável pelos ajustes fiscais, programas e medidas que tem,
insistentemente, impossibilitado que os investimentos públicos priorizem a
educação, a saúde, a reforma agrária, dentre tantas outras políticas que são
necessárias para melhorar as condições de vida do povo.
É neste ministério que se garante
as condições para resolver os problemas no déficit das contas públicas, em nome
do equilíbrio econômico entre as receitas e as despesas. Condições que
possibilita que o capital financeiro continue ganhando muito dinheiro, através
da especulação, das altas taxas de juros e de isenção fiscal às empresas e que
retira direitos dos trabalhadores e trabalhadoras.
Queremos que toda a sociedade
saiba que é no Ministério da Fazenda onde se coloca em prática a política
econômica ditada pelo capital e pela burguesia, contra o povo brasileiro.
Como você avalia a política
econômica do atual governo?
Temos feito ano após ano a
crítica à política econômica do governo Dilma, desde o primeiro mandato. Mas
neste segundo mandado, há um endurecimento e um conservadorismo maior no que se
refere às questões econômicas, e não para resolver os problemas da sociedade.
Aquilo que o governo tem chamado
de ajuste fiscal, propondo medidas avalizadas pelo Congresso Federal, Câmara e
Senado para diminuir as despesas, têm afetado diretamente as conquistas e os
direitos dos trabalhadores.
Nossas ocupações são para
denunciar e dizer que somos contra o ajuste fiscal, que somos contrários que o
governo resolva o problema das contas públicas prejudicando a classe
trabalhadora, os pobres, como é o caso das Medidas Provisórias 664 e 665, que
reduzem o acesso ao seguro desemprego
e aos benefícios da previdência, medidas que afetam diretamente quem trabalha
nesse país. Não podemos aceitar pagar uma conta que não é nossa.
E essa é a forma que encontramos
para dizer à presidenta Dilma e ao ministro Joaquim Levy [da Fazenda] que é
preciso ouvir a sociedade.
O governo precisa ter coragem de
rever essa política e adotar medidas que resolvam os problemas econômicos, mas
cobrando de quem de fato deve pagar a conta, que são os ricos, a burguesia e o
capital. Ter coragem de taxar as grandes fortunas e fazer com os mais ricos
paguem mais impostos.
Queremos que o governo retome a
reforma agrária com medidas que garantam o assentamento de todas as famílias
acampadas e as condições necessárias nos assentamentos para que possamos viver
no campo com dignidade e cumprir nossa tarefa de produzir alimentos saudáveis
para alimentar o povo brasileiro. E isso não se faz com essa politica econômica
que está posta aí.
Quais são as consequências do
ajuste fiscal?
Arrocho para a classe
trabalhadora, retirando direitos e benefícios já conquistados. Cortando o
orçamento de ministérios que atendem diretamente os pobres, como educação,
saúde, habitação, reforma agrária. Aumento nas contas de energia, no preço da
cesta básica. Tudo isso acompanhado do aumento do desemprego.
Isso gera um clima muito ruim na
sociedade, porque todos os dias se percebe que a situação está piorando, pois
ao mesmo tempo que o povo sente as dificuldades aumentando, por outro lado
temos os “poderes” exercendo a política de resolver a vida dos seus, a exemplo
do judiciário que aprovou no Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania
(CCJ) o aumento de até 78% aos servidores do poder judiciário ou a recorrente
serventia do legislativo as empresas financiadoras de suas campanha.
As consequências são desastrosas
e a sociedade, as organizações e movimentos sociais tem a tarefa de denunciar e
lutar contra esta situação.
E onde a Reforma Agrária entra
nisso?
A Reforma Agrária entra no fato
de não ter sido prioridade. Pois além do ajuste fiscal diminuir as despesas
retirando benefícios e direitos dos trabalhadores e trabalhadoras através das
MP´s, ainda realizou muitos e grandes cortes no orçamento, em pastas que
afetam, diretamente, população.
Ou seja, nos serviços básicos de
saúde, educação, e nos programas sociais. Os cortes na reforma agrária vão na
contramão das expectativas geradas pelo próprio governo.
Dificilmente se consegue assentar
as 120 mil famílias que estão acampadas se o governo não priorizar além do
discurso político a destinação de recursos. O Ministério de Desenvolvimento
Agrário (MDA) e o Incra tiveram proporcionalmente o segundo maior corte
orçamentário da explanada, quase 50% do seu orçamento.
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Com isso dificilmente se
assentará as famílias que estão acampadas, algumas há mais de 10, 15, 18 anos
na luta. Precisamos que se leva a sério a necessidade de realização da Reforma
Agrária, garantindo infraestruturas social e produtiva nos assentamentos, para
que tenhamos um campo com gente que não quer ir às cidades ser amontoado.
Queremos construir um outro
modelo de agricultura, produzindo alimentos saudáveis, garantindo vida digna no
campo com homens, mulheres, crianças e jovens. Um campo que possibilite a
permanência da juventude com acesso à cultura, educação e ao lazer. Um modelo
que gera sete empregos a cada dez que é criado no campo.
Nesse sentindo, o ajuste fiscal,
os cortes e a não priorização por parte do governo à política de assentamentos
afeta diretamente a feforma agrária.
Como você avalia o aceno político
que o atual governo vinha dando para a reforma agrária?
O discurso do governo de que a
reforma agrária é prioridade, que é preocupação garantir a produção de
alimentos saudáveis, não vai se efetivar se esse discurso estiver descolado da
garantia das condições necessárias para que ela se efetive, a exemplo a
imediata recomposição do orçamento.
A Reforma Agrária não vai
acontecer como um passo de mágica. É preciso ter decisão política e coragem
para enfrentar o latifúndio, o agronegócio e o Congresso conservador. Um
congresso, onde a grande maioria dos senadores e deputados representam e
defendem os interesses de empresas que financiaram suas eleições.
O governo precisa convocar a
sociedade para debater estes temas e buscar alternativas que levem a mudanças
estruturais e não apenas paliativas e colocam o problema de hoje para amanhã.
Na reforma agrária além da
coragem politica para enfrentar o modelo do agronegócio, precisa ser
acompanhado de garantias orçamentárias e financeiras de estruturação dos órgãos
que tratam da Reforma Agrária, sobretudo o Incra, com a garantia de concursos
públicos para reestruturação do órgão para que de fato a política de Reforma
Agrária se efetive e consiga chegar lá na ponta, resolvendo o problema de quem
está no campo e também os problemas estruturais vivenciados por toda a
sociedade, a exemplo da falta de mobilidade urbana, o inchaço das cidades, a
alta nos preços e o envenenamento dos alimentos.
As consequências do ajuste fiscal
tem interferido diretamente questões cotidianas da população. As pessoas têm
pagado aumentos mensais na taxa de energia elétrica, o custo da cesta básica
aumenta dia a dia, e estas coisas também tem relação direta com o que acontece
no campo. Fazer a Reforma Agrária contribuirá também para a solução dos
problemas que estão nas cidades, mas que tem nascedouro medidas não realizadas
no campo.
Mas a jornada não é apenas por
terra, há as questões sobre os assentamentos também?
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Sim, e são problemas decorrentes
da ausência de uma politica séria para o campo. As dificuldades em alguns casos
são expressão da ausência do Estado na garantia de uma politica estrutural que
viabilize as condições básicas de reprodução social e produtiva na reforma
agrária.
É inadmissível que tenhamos
assentamentos com mais de 15 anos e não se tenha água potável para consumo.
Ou famílias assentadas há 10 anos
e sem a casa para morar. Assentamentos que tem energia elétrica, mas muito
distante da necessidade produtiva e econômica que o assentamento deve cumprir,
seja no uso de máquinas e equipamentos necessários à produção, seja para rodar
equipamentos agroindustriais.
Problemas de assentamentos que
ficam ilhados e isolados quando chove, pois as estradas de acesso são de
péssimas condições.
Se tratarmos do crédito que é
fundamental na produção, veremos que tem sido na maioria das vezes um problema,
ao invés de solução e impulso a organização da produção. Limitado,
burocratizado e reproduz o pacote tecnológico convencional, que envenena os
alimentos. Um crédito que endivida e inviabiliza as famílias.
Nós também entendemos que a
Reforma Agrária também passa pela garantia de condições básicas e fundamentais
aos diversos sujeitos que vivem nos assentamentos, a exemplo da saúde e
educação, em especial da juventude.
A nossa juventude entende que
para permanecer no campo é preciso que haja uma educação em todos os níveis e
trabalho, combinação perfeita para avançarmos na mudança de matriz tecnológica
para a agroecologia.
Enfim os problemas nos
assentamentos são a consequência daquilo que ainda não foi feito pelo Estado e
governos.
Para isso o MST propõe o PAC da
Reforma Agrária. O que seria isso?
O PAC da Reforma Agrária é uma
proposta apresentada ao governo na perspectiva de se ter um programa com ações
voltadas para construção das condições estruturais a organização e
desenvolvimento dos assentamentos, como água para consumo e produção, estrada
de acesso e circulação, eletrificação, agroindústrias, estruturação de cooperativas,
construção de centros comunitários que possam servir de espaço de
sociabilização dentro dos assentamentos, construção de escolas e creches
infantis e postos de saúde.
Um conjunto de ações que são
importantes e que não podem estar reféns da burocracia e das interferências
políticas ou de pessoas que não tem compromisso com a Reforma Agrária. Em
resumo, é um programa para estruturar os assentamentos, resolvendo o passivo
existente, não queremos nada demais, queremos o que o Estado deixou de fazer e
de cumprir nas áreas dos assentamentos.
A proposta deste PAC é parte de
um novo projeto para a agricultura brasileira proposta pelo MST à sociedade,
que estamos chamando de Reforma Agrária Popular, que parte da necessidade da
democratização, da preservação dos bens da natureza e de toda a biodiversidade,
produção de alimentos saudáveis a partir da agroecologia, garantia de
escolas em todos os níveis e de profundas mudanças na forma de conceber o
campo.
Essa proposta carece da decisão
política do governo e da disposição de organização e luta de toda a classe
trabalhadora, seja para a construção da reforma agrária popular e todas as
demais mudanças estruturais necessárias para a sociedade.
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