Olá
alunos,
Por meio da estrutura monopolista de sua economia,
o Brasil inventou o capitalismo sem concorrência. Em um ano onde o medo tomou
conta das estruturas econômicas brasileiras, a postagem de hoje pretende decifrar
um ambiente melhor para futuros investimentos.
Esperamos que
gostem e participem.
Joyce Borgatti
e Palloma Borges. Monitoras da Disciplina “Economia Política e Direito” da
Universidade Federal Fluminense.
A economia
é um campo de saberes peculiar. Desde que as discussões sobre economia política
e formação socioeconômica saíram paulatinamente de circulação, desde a troca de
Celso Furtado por Gary Becker, a economia procura nos levar a acreditar que ela
não seria exatamente uma ciência humana, mas algo próximo de uma ciência
matemática. Sendo assim, os sujeitos que aparecem como agentes econômicos não
parecem mais ser portadores de crenças, desejos e afetos. Antes, eles seriam
agentes maximizadores de benefícios. Seus sistemas de interesses poderiam ser
descritos a partir de uma pretensa racionalidade fundada em cálculos de custos
e ganhos passíveis de mensuração e quantificação.
Com essa ilusão epistêmica a respeito de seus objetos,
a economia procura ignorar sua dimensão normativa e levar a sociedade a
partilhar tal ilusão. Enquanto campo de saber que visa legitimar políticas de
intervenção social, ela tem uma característica partilhada por toda e qualquer
ciência humana, a saber, sua performatividade. Contrariamente às ciências
exatas e naturais, os objetos das ciências humanas apreendem reflexivamente os
modelos de explicação sobre si mesmos e produzem novos efeitos e comportamentos
a partir da internalização de descrições. As descrições em ciências humanas não
são meramente constatativas, elas não simplesmente constatam o que já estava lá
à espera de ser descoberto. Elas são performativas, ou seja, elas produzem
novas realidades a partir do momento que os objetos aceitam reflexivamente as
descrições a eles imputadas. Por exemplo, uma sociedade que, a partir de certo
momento, compreende seus conflitos sociais através do conceito de “luta de
classes” começa a criar fenômenos antes não produzidos e abre uma nova série de
efeitos. Um sujeito que, a partir de certo momento, vê-se como portador de
“depressão” (sim, a psicologia também é uma ciência humana) produz uma série de
efeitos por unificar sintomas dispersos no interior de um quadro compreensivo
unitário.
Vale a pena fazer tal digressão epistemológica para
falar sobre a atual crise econômica brasileira.
Uma crise também, a seu modo, peculiar. Normalmente, crises de economia
nacionais são expressas, entre outros índices, por um porcentual elevado na
relação entre PIB e dívida, como no caso da Itália, com sua relação em 128%.
Mas não é o caso do Brasil, onde os níveis dessa relação são absolutamente
normais. No entanto, é fato que o País conhece há muito processos de retração
de investimentos. Nada estranho para uma economia montada para ser uma
plataforma de valorização do capital financeiro e dos rendimentos de rentistas
através de taxas de juros substantivas. Por sinal, o Brasil é um país onde
a economia é declarada em crise enquanto seus principais bancos aparecem
periodicamente com recordes de lucro líquido. Isso talvez explique por que o
Brasil deve ser a única nação no mundo no qual o presidente da federação das indústrias
mais importante do país, localizada no estado de São Paulo, não é há muito um
industrial, mas um investidor.
Mas é fato
vermos em manchetes superlativas que o medo (um conceito psicológico) se
instalou e provocou a paralisia da economia. Agora, é necessário “criar um
ambiente melhor para os investimentos”. O que significa, no senso comum atual,
abrir as portas para um processo sem freios de intensificação do trabalho e
redução dos salários. Isso poderia significar também lutar contra o caráter monopolista
do capitalismo brasileiro, com sua oligopolização extensiva da economia patrocinada
com dinheiro público. Afinal, quem investe quando já tem a segurança de
controlar seu mercado e suas margens de lucro mesmo sem necessidade de
investimento. O Brasil, através da estrutura monopolista de sua economia,
inventou o capitalismo sem concorrência.
Assim, com suas descrições repetidas como mantra encantatório pela
imprensa e com seus arautos pagos por consultorias do sistema financeiro para
sair em cruzada contra todos os que subam a voz diante dessas leituras
interessadas (vide a polêmica recente envolvendo a economista Leda Paulani), o
discurso econômico nacional produz uma crise com causas próprias e em causa
própria. Não é difícil saber a quem tudo isto beneficia.
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