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sábado, 16 de março de 2013

A Venezuela depois de Chávez

Olá alunos,

a postagem de hoje traz como temática a morte de Hugo Chávez. Apesar de todas as opiniões contrárias à sua forma de governo, não há dúvidas de que ele será lembrado como um dos grandes líderes dessa geração e por isso uma postagem acerca dos impactos de sua morte merece destaque aqui no blog. Espero que vocês gostem e participem.

Yuri Antunes Moreira
Monitor da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense. 



Com a morte do presidente carismático, seu sucessor terá de recolocar nos trilhos uma economia em dificuldade, que padece com a inflação alta e uma dívida pública em expansão. 

Os venezuelanos intuíam que o pior estava para vir, desde que o presidente Hugo Chávez anunciou, no dia 9 de dezembro do ano passado, que se afastaria do posto, apenas dois meses após sua terceira reeleição, para tratar de um câncer reincidente na região abdominal. Ao lado de seu vice, Nicolás Maduro, Chávez explicou, em cadeia nacional, que voltaria a Cuba, para mais uma operação, a quarta desde que a doença fora descoberta, há 20 meses. “Se algo acontecer, Maduro deve concluir o período de transição”, disse, na ocasião. “E, se ele for obrigado a convocar novas eleições, elejam Maduro como presidente.” Seus eleitores guardavam uma pontinha de esperança de que um milagre poderia salvar o presidente e não teriam de encarar o fim de uma era, que começou 14 anos atrás. 

as o destino seguiu seu curso, e Chávez perdeu a batalha contra o câncer. Na terça-feira 5, Maduro teve a ingrata missão de anunciar que o pior havia chegado. Aos 58 anos, o ex-militar, nascido em Sabaneta, noroeste da Venezuela, que tentou implantar o “socialismo do século 21” em seu país, saiu de cena. “Recebemos a informação mais dura e trágica que podemos transmitir ao nosso povo. Às 16h45 (18h15 em Brasília) do dia 5 de março faleceu nosso comandante Chávez”, disse, emocionado, em cadeia nacional, seu herdeiro político. “Este é um momento de profunda dor.” O impressionante cortejo de milhares de pessoas que saíram às ruas, na sequência, confirmava a dor nacional. 

Mais do que isso, a multidão reunida na praça Simón Bolívar, em Caracas, desde o anúncio da morte de Chávez, mostra que as sementes plantadas pela sua revolução bolivariana, em 1999 – que fortaleceu a renda dos menos favorecidos, melhorando diversos indicadores sociais, como a redução do analfabetismo e o aumento da expectativa de vida da população (leia quadro ao final da reportagem) – geraram uma lealdade religiosa ao ex-chefe de Estado. “Ele era grande demais para ser mortal”, desabafou o comerciante Pedro Contreras, entrevistado pela BBC, a estatal britânica de televisão, numa síntese do sentimento de perda dos milhões de seguidores de Chávez. 

No Brasil, a presidenta Dilma Rousseff cancelou a viagem que faria à Argentina, para acompanhar o velório de Chávez. “Essa morte deve encher de tristeza todos os latino-americanos”, disse a presidenta, na terça-feira 5, em Brasília. No dia seguinte, além das longas filas no velório da Academia Militar, para se despedir do chefe de Estado, outras filas se formaram, nas primeiras horas da manhã da quarta-feira 6, em caixas de supermercados da capital do país, Caracas. Muitos moradores encheram seus carrinhos de arroz, farinha de milho, massas e outros alimentos não perecíveis, “no caso de alguma coisa acontecer”, relataram precavidos caraquenhos, ao jornal venezuelano Universal. 
 
Era a imagem do paradoxo que Chávez deixa como legado a quem sucedê-lo. Ao longo de três mandatos consecutivos, Chávez ganhou o coração da maioria dos venezuelanos, reduzindo a pobreza pela metade num país que conquistou uma agenda social permanente. O encantamento popular, porém, tem atenuado o impacto de algumas decisões indigestas. Em fevereiro, por exemplo, Maduro, o presidente em exercício, promoveu uma desvalorização de 46,5% do bolívar, a moeda nacional, para aliviar as contas do setor público, cujo endividamento vem registrando um crescimento exponencial, passando de 37% do PIB em 1999, para 51% no ano passado. Dona de uma das maiores reservas petrolíferas do mundo, de quase 300 bilhões de barris, a Venezuela acomodou sua economia sobre a extração de petróleo. 
 
Os royalties do ouro negro beneficiaram os programas sociais para a população de baixa renda. Chávez estatizou, também, setores estratégicos, como siderurgia e telecomunicações, deixando de lado o desenvolvimento de uma indústria local. Atualmente, a Venezuela é dependente das importações, inclusive de alimentos essenciais, como óleo comestível e café. Dessa forma, o sucessor de Chávez assumirá o poder com dois desafios monumentais: superar o sentimento de orfandade de uma população que se embevecia com o carisma de seu líder e colocar a economia nos trilhos, antes que o fim do luto deixe nítidas algumas mazelas: altos índices de violência, a inflação superior a 20%, e a falta de produtos nos supermercados.

 Garantir a estabilidade é fundamental, ainda, para as empresas brasileiras, como Braskem, Gerdau, Eisa e Ultrapar, que operam na Venezuela, e para o Brasil, que mantém um intercâmbio comercial de US$ 6 bilhões com o país. Para José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), as relações comerciais devem mudar – não em função da morte de Chávez, mas da desvalorização cambial, que apertou ainda mais os controles do dólar. “No momento, ninguém está conseguindo exportar, a não ser para o governo, que compra alimentos e outros itens de primeira necessidade”, afirma Castro. Com a falta de divisas no país, explica o executivo, o governo venezuelano não está autorizando as empresas a comprar a moeda estrangeira para pagar as importações, o que paralisa o comércio exterior. 

 
O presidente da AEB espera uma redução significativa no volume de exportações deste ano, para US$ 4 bilhões, contra os US$ 5 bilhões de 2012. Para o embaixador Rubens Ricupero, o momento atual é delicado, mas não será eterno. “Teremos um período instável, mas não nos afetará tanto”, diz Ricupero, para quem a proximidade com a Venezuela sempre foi um grande negócio para o governo brasileiro. “Chávez era o grande fiador da abertura ao Brasil, o que nos possibilitou exportar produtos de maior valor agregado para lá.” Castro, da AEB, lembra, ainda, que várias empresas de engenharia e construção, como a Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez, estão executando obras públicas no país, o que deve ampliar a exportação de máquinas e equipamentos, que são financiados pelo BNDES.
 
Há, ainda, projetos binacionais, como o da Braskem com a PDVSA, que pretendem construir duas unidades petroquímicas. Segundo a empresa, a morte de Chávez não altera os seus planos, uma vez que grandes projetos levam cerca de cinco anos para ser construídos, e consideram um cenário de, no mínimo, 20 a 30 anos. “O compromisso da empresa é com países e não com governos”, informou a Braskem. O momento é de compasso de espera, uma vez que a Constituição do país prevê que novas eleições devem ser realizadas dentro de algumas semanas. A comoção nacional tende a favorecer o vice Nicolás Maduro, que já procura mimetizar o seu mentor. Vestido com as cores da bandeira venezuelana, o virtual candidato à Presidência caminhou com a multidão, durante o cortejo que acompanhou o caixão de Chávez.

Um pouco antes do anúncio oficial da morte de Chávez, Maduro havia insinuado que “inimigos externos” tinham estimulado o câncer do presidente, num recado aos Estados Unidos. Bater publicamente no governo americano era um dos exercícios prediletos do presidente morto, que estabeleceu vínculos estreitos com inimigos figadais dos americanos, a exemplo do cubano Fidel Castro e do presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad. Se Maduro for eleito, sua política externa deve seguir a linha desenhada por Chávez, ou seja, um jogo de cena que encanta parte dos venezuelanos, embora haja enorme dependência do comércio com os Estados Unidos, que consumiram 50% das exportações do país em 2012, totalizando US$ 38,7 bilhões. 
 
O petróleo é quase 100% desse total. A Venezuela, por sua vez, comprou US$ 17,6 bilhões em produtos dos Estados Unidos, seu principal provedor de importados. Na terça-feira, o presidente Barack Obama emitiu um comunicado deixando as portas abertas para o próximo ocupante do Palácio Miraflores, a sede do governo da Venezuela. “Neste momento desafiador, os Estados Unidos reafirmam seu apoio ao povo venezuelano e seu interesse em desenvolver uma relação construtiva”, disse Obama. Se o vencedor do próximo pleito viesse a ser o candidato da oposição, o atual governador do Estado de Miranda, Henrique Capriles, a proposta de Obama teria repercussão. Mas as chances de Capriles, que obteve 44% dos votos quando disputou a Presidência com Chávez em 2012, são pequenas e ele sabe disso, porque as manifestações dos últimos dias aumentam o sentimento pró-chavista.
 
Mesmo assim, a vida de Maduro no poder, caso a preferência pelo seu nome se confirme, não será tão fácil. Isso porque o manto do chavismo, na verdade, cobre diversos partidos de posições distintas, explica o sociólogo Flávio Mendes, autor do livro Hugo Chávez em seu Labirinto: o Movimento Bolivari­ano e a Política na Venezuela. “Maduro tentará manter esse meio de campo entre organizações divergentes”, diz Mendes. “Mas é difícil saber se conseguirá.” Ministro das Relações Exteriores, desde 2006, o presidente em exercício vai colocar seu lado diplomata à prova para governar o país. Mas precisará de muito mais do que isso para unir a Venezuela e corrigir a rota da economia. 


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