Caros leitores,
A discussão sobre as mudanças climáticas assumiu papel fundamental no calendário político nos últimos anos, tendo resultado inclusive em movimentos sociais, formados especialmente por pessoas mais jovens, buscando reformular a forma como vivemos e cobrar das autoridades estatais medidas mais ativas para controlar a emissão de poluentes na atmosfera.
Nesse sentido, trazemos hoje uma notícia que debate o relatório produzido pelo IPCC, responsável por trazer fatos dramáticos acerca do aquecimento global e as possíveis consequências que surgem dessa nova realidade que se torna cada vez mais incontornável.
Esperamos que gostem e compartilhem!
Ygor Alonso é membro do Grupo de Pesquisa em Estado, Instituições e Análise Econômica do Direito (GPEIA/UFF).
O novo relatório sobre mudanças climáticas do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) mostra que estamos diante de mudanças sem precedentes no clima - algumas delas irreversíveis.
O estudo, feito por centenas de cientistas que analisam milhares de evidências coletadas ao redor do planeta, alerta para o aumento de ondas de calor, secas, alagamentos e outros eventos climáticos extremos nos próximos dez anos.
O repórter da BBC News para o meio ambiente Matt McGrath analisa algumas das principais conclusões do relatório.
As mudanças climáticas estão se intensificando rapidamente - e são resultado da ação humana Para quem vive no Ocidente, os perigos do aquecimento global não são mais algo distante, impactando pessoas em lugares distantes.
"A mudança climática não é um problema do futuro, está aqui e agora e afeta todas as regiões do mundo", diz o professor Friederike Otto, da Universidade de Oxford, um dos muitos pesquisadores do IPCC.
O que marca essa nova publicação do IPCC é o mais alto nível de confiança nas conclusões dos cientistas até agora. A frase "muito provável" aparece 42 vezes nas 40 páginas do relatório, voltado para formulação de políticas públicas. Em termos científicos, isso é equivalente a 90-100% de certeza daquele resultado.
"Acho que não há nenhuma surpresa no relatório. É a solidez abrangente dos resultados que torna este o relatório mais forte do IPCC feito até agora", diz o professor Arthur Petersen, da University College London, à BBC News.
Petersen é um ex-representante do governo holandês no IPCC e foi observador no comitê que produziu este relatório.
"Não é um relatório acusador, são apenas fatos, claros, um atrás do outro", afirma Petersen.
E uma das conclusões mais claras do novo relatório é sobre a responsabilidade da humanidade pelas mudanças climáticas que vivemos no momento. Não há mais dúvidas - a causa somos nós.
O limite de aumento de 1,5º C na média de temperatura está quase sendo ultrapassado
Quando o último relatório científico do IPCC foi publicado, em 2013, considerar o limite de aumento 1,5ºC como sendo seguro é a última alternativa. Mas nas negociações políticas que levaram ao acordo de Paris de 2015, muitos países pressionaram por esse limite, argumentando que era uma questão de sobrevivência para eles.
Um relatório extra sobre esse limite de 1,5°C mostrou que as vantagens de permanecer abaixo do limite eram enormes em comparação com um aumento de 2°C. Para isso, as emissões de carbono precisam ser reduzidas pela metade até 2030 e zeradas até 2050.
Este novo relatório reafirma esta conclusão. Em todos os cenários, esse aumento de temperatura será alcançado em 2040, ou seja, a temperatura média do planeta vai ter aumentado em 1,5°C.
Embora a situação seja muito séria, as mudanças não vão acontecer repentinamente. "O limite de 1,5° C é um limiar importante, é claro, mas de um ponto de vista climático, não é a borda de um penhasco - como se assim que esse limite 1,5°C for ultrapassado, de repente tudo se tornará muito catastrófico. Não vai ser assim repentino", explica Amanda Maycock, da Universidade de Leeds, uma das autoras do novo relatório.
"O cenário de emissões mais baixas que avaliamos neste relatório mostra que o nível de aquecimento se estabiliza em torno ou abaixo de 1,5°C mais tarde neste século. Se seguíssemos esse caminho, então os impactos seriam significativamente evitados."
A má notícia: Não importa o que façamos, o nível do mar vai continuar a aumentar
No passado, o IPCC foi criticado por ser muito conservador na análise de risco do aumento do nível do mar. A falta de dados claros fez com que relatórios anteriores excluíssem os impactos potenciais do derretimento das camadas de gelo da Groenlândia e da Antártica.
Mas no relatório atual, há dados que apontam que os oceanos podem subir até 2 metros até o fim deste séculos e até 5 metros até 2150. Embora esses números sejam improváveis, eles não podem ser descartados, já que o cenário atual continua sendo o de altas emissões de gases de efeito estufa.
Mas mesmo se controlarmos as emissões e mantivermos o aumento de temperatura em torno de 1,5°C até 2100, os oceanos continuarão a subir por muito tempo no futuro. Isso porque parte das mudanças climáticas causadas pela atividade humana até agora já são irreversíveis.
"Esses números de aumento do nível do mar a longo prazo são assustadores", diz o professor Malte Meinshausen, da Universidade de Melbourne, também um dos pesquisadores do IPCC.
"As pesquisas mostram que mesmo mantendo o aquecimento em 1,5°C, veremos um aumento do nível do mar de 2 a 3 metros no longo prazo. E nos cenários de aumento de temperatura ainda maior, o nível do mar pode subir ainda mais até 2150. Isso é assustador, porque talvez não vejamos isso em vida, mas algo é que está próximo e será um legado que vai comprometer o planeta", afirma Meinshausen.
Mesmo que a elevação do nível do mar seja relativamente branda, ela terá efeitos indiretos que não podemos evitar. "Com o aumento gradual do nível do mar, os eventos extremos que ocorreram no passado apenas uma vez por século ocorrerão com mais frequência no futuro", diz Valérie Masson-Delmotte, co-presidente do grupo de trabalho do IPCC que produziu o novo relatório.
"Eventos extremos ligados ao aumento do nível do mar devem ocorrer uma ou duas vezes por década em meados deste século. As informações que fornecemos neste relatório são extremamente importantes e devem ser levadas em consideração para que a humanidade se prepare para esses eventos."
A boa notícia: Cientistas têm mais confiança sobre o que vai funcionar
Apesar dos alertas serem cada vez mais claros e alarmantes, ainda há um fio de esperança no relatório. Os cientistas temem que o clima do planeta seja muito mais sensível à presença cada vez maior de CO2 do que se imaginava. Eles criaram uma expressão - "sensibilidade climática" - para medir quanto o clima responde a um aumento específico de temperatura.
No último relatório, de 2013, dados apontavam que a variação de temperatura caso o nível de CO2 fosse duplicado ficaria entre 1,5°C e 4,5°C, sem uma estimativa mais precisa. Desta vez, o intervalo diminuiu e os cientistas afirmam que novos dados mostram que o valor mais provável é de 3°C.
Por que isso é importante?
"Agora somos capazes de restringir isso com um bom grau de certeza e então usamos isso para realmente fazer previsões muito mais precisas", disse o professor Piers Forster, da Universidade de Leeds, e um dos autores do relatório. "Então, dessa forma, sabemos que o zero realmente vai render."
Outra grande surpresa do relatório é o papel do metano, outro gás de aquecimento. De acordo com o IPCC, cerca de 0,3ºC do 1,1ºC que o mundo já aqueceu vem do metano. Combater essas emissões, provenientes da indústria de petróleo e gás, agricultura e cultivo de arroz, pode ser uma grande vitória a curto prazo.
"O relatório anula qualquer debate remanescente sobre a necessidade urgente de reduzir a poluição do metano, especialmente de setores como petróleo e gás, onde as reduções disponíveis são mais rápidas e mais baratas", disse Fred Krupp, do Fundo de Defesa Ambiental dos Estados Unidos.
"Quando se trata de nosso planeta superaquecido, cada fração de grau é importante - e não há maneira mais rápida e viável de diminuir a taxa de aquecimento do que cortando as emissões de metano causadas pelo homem."
Justiça será acionada
O lançamento do relatório a apenas alguns meses da conferência climática COP26, que será realizada em Glasgow, significa que provavelmente ele será o alicerce das negociações. O IPCC tem histórico nesse ponto: sua avaliação anterior em 2013 e 2014 preparou o caminho para o acordo climático de Paris.
Este novo estudo é muito mais forte, mais claro e mais confiante sobre o que acontecerá se os governantes não agirem. Se eles não agirem com rapidez suficiente e a COP26 terminar de maneira insatisfatória, os tribunais podem se envolver mais.
Nos últimos anos, na Irlanda e na Holanda, ativistas ambientais foram à Justiça para forçar governos e empresas a agirem com base na ciência sobre as mudanças climáticas. "Não vamos permitir que este relatório seja arquivado por mais inação. Em vez disso, vamos levá-lo aos tribunais", disse Kaisa Kosonen, assessora política sênior do Greenpeace.
"Ao fortalecer as evidências científicas entre as emissões causadas pelos humanos e as condições climáticas extremas, o IPCC fornece novos e poderosos meios para que todos, em todos os lugares, considerem a indústria de combustíveis fósseis e os governos diretamente responsáveis pela emergência climática. Basta olhar para a recente vitória judicial conseguida pelas ONGs contra a Shell para perceber o quão poderosa a ciência do IPCC pode ser", diz Kosonen.
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