Olá alunos.
A notícia de hoje traz uma análise sobre a nova política que se incide sobre a economia brasileira, principalmente no que toca o salário mínimo.
Gostaríamos de agradecer a colaboração do Grupo 1 Noturno - Bruna, Bruno Henrique, Carol, Douglas, Karina Moraes - pela contribuição da notícia.
Gostaríamos de agradecer a colaboração do Grupo 1 Noturno - Bruna, Bruno Henrique, Carol, Douglas, Karina Moraes - pela contribuição da notícia.
Esperamos que gostem e participem,
Ramon Reis e Lauro Monteiro, monitores da disciplina "Economia Política e Direito" da Universidade Federal Fluminense.
Na França dos anos 50, as campanhas eleitorais foram marcadas pela discussão sobre a pobreza da classe trabalhadora, da existência de “duas Franças”, de um lado uma França moderna, fruto do esforço de reconstrução do país, de outro, a França mergulhada na pobreza, herdada em grande medida do entre-guerras. É nesse cenário de discussão que são criados e/ou fortalecidos diversos fundos sociais, de amparo ao desemprego, de aposentadoria, de solidariedade, que passam a compor a crescente malha de proteção social naquele país, e ademais, é também nesse momento, em fevereiro de 1950, que é estabelecido o Salário Mínimo Interprofissional (SMI). A fixação do SMI resultou da necessidade do estabelecimento de um limite mínimo de remuneração que garantisse aos assalariados um padrão de vida digno. O estabelecimento desse padrão de remuneração mínima, tão evidentemente necessário às pretensões de combate à desigualdade, resultou basicamente de duas propostas, cujas denominações são exemplares para identificar a importância da fixação de um padrão salarial mínimo: uma proposta feita pelos sindicatos, denominada “salário mínimo vital para a civilização” e uma proposta patronal, de um “salário mínimo de garantia física do indivíduo”. A partir do estabelecimento do SMI, a pressão política para a adoção de uma política de promoção dos salários de base por meio de reajustes reais permanentes do salário mínimo foi uma bandeira dos movimentos sociais franceses. Em 1970, institui-se o Salário Mínimo Interprofissional de Crescimento (SMIC), outra etapa dessa política, que previa uma elevação real obrigatória a cada ano, que não poderia ser inferior à metade do crescimento da renda nacional. O objetivo aqui era claro para os franceses, qual seja, diminuir a distância entre a média salarial e o valor do SMIC.
Na Inglaterra, a aprovação no Parlamento do Wages Councils Act em 1945, fundou a moderna política salarial instituída no pós-guerra. Tal instituição assumiu não só papel relevante na política salarial inglesa, mas na definição de outros itens da cesta de remunerações e proteção social, como férias e horas-extras, entre outros. Ao contrário da França, não se institucionalizou o salário mínimo, sendo que o suporte de um padrão mínimo de rendimentos na Inglaterra foi consolidado através de um conjunto de mecanismos de garantia de renda, com especial atenção para os trabalhadores de base. O estímulo aos acordos coletivos foi outra maneira que a política governamental inglesa encontrou para determinar um padrão salarial mais homogêneo. A responsabilidade estatal para a consolidação de uma estrutura de salários mais homogênea convergiu para a proteção e promoção dos salários dos trabalhadores de mais baixa qualificação e fraca organização sindical por meio dos acordos coletivos de trabalho, conjuntamente, conforme destaca Lord Beveridge, a ampliação dos mecanismos de proteção social e de garantia de renda.
A experiência italiana de promoção dos salários de base, sem contar com o estatuto do salário mínimo, foi amparada num complexo sistema de intervenção sindical e estatal no mercado de trabalho. Seus principais instrumentos foram as garantias constitucionais que estabelecem proteção básica aos assalariados por meio de políticas sociais, um poderoso sistema de contratação coletiva centralizada, que fixa valores mínimos de remuneração por categorias, a indexação salarial, além da institucionalização do “mínimo social de desocupação”.
Na verdade, o que observamos não somente nesses países, mas em outras experiências nacionais bem-sucedidas de redução das desigualdades entre os rendimentos e de maior homogeneização da estrutura salarial, é que as políticas de proteção e promoção dos salários de base, em suas diversas variantes nacionais, cumpriram historicamente, e ainda cumprem, um papel central na construção de sociedades mais igualitárias. É inequívoca sua importância nesses países na redução das diferenças no interior da estrutura salarial e na promoção de maior justiça social.
No Brasil, a ideia da fixação de uma política de salário mínimo remonta à década de 1930, no primeiro governo de Getúlio Vargas. No escopo da política trabalhista de Vargas, afirmava-se categoricamente que a fixação do salário mínimo tinha por objetivo essencial, corrigir as injustiças promovidas pelo desenvolvimento industrial numa sociedade com as características da sociedade brasileira. Essa fixação era vista como uma forma de proteger os trabalhadores de base dos limites da pauperização, independentemente das condições desfavoráveis imposta pela dinâmica econômica e do mercado de trabalho nacional.
Desde lá, a fixação do salário mínimo no Brasil foi capitaneada pelo princípio norteador de um salário mínimo “tipo suficiência”, que possibilitasse o atendimento das necessidades básicas dos trabalhadores. Em torno dele, criou-se a “Comissão do Salário Mínimo”, tripartite, com representantes do governo, dos trabalhadores e do empresariado, responsável pela fixação do valor do mínimo e de seus reajustes. Numa primeira fase histórica da política do salário mínimo no Brasil, seus princípios fundantes foram predominantes. Sob o reformismo conservador posterior ao Golpe Militar de 1964, foram abandonados tais princípios, e o que se assistiu foram progressivas contestações quanto a efetividade deste tipo de política no Brasil, em meio a adoção de políticas salariais restritivas.
O resultado dessa reconversão foi uma grande deterioração do valor real do salário mínimo a partir do início dos anos 60. Ao longo do “Milagre” e durante a década de 1970, com forte crescimento econômico e extraordinário dinamismo do mercado de trabalho, ganham importância as teses que descaracterizam a importância do salário mínimo como elemento de estruturação dos níveis de remuneração dos trabalhadores com baixa qualificação, a partir da observação de que os salários de base haviam descolados do valor do salário mínimo. Se por um lado, a importância do salário mínimo é questionada alegando-se o descolamento da base salarial do valor definido como mínimo nos anos 60 e 70, outros argumentos contrários a uma política ativa de salário mínimo se somam no decorrer dessas décadas e que ainda hoje permanecem presentes nas discussões sobre o tema.
Um desses argumentos diz respeito à possibilidade de que uma política altista de salário mínimo pode produzir inflação, o que transformaria os aumentos concedidos apenas em aumentos nominais. Com efeito, outro argumento recorrente aponta que tal política poderia conduzir também a um aumento da informalidade, na medida em que, principalmente os setores menos organizados da economia, teriam enormes dificuldades em acompanhar o comportamento do salário mínimo.
O complemento desses argumentos afirma um certo apego ideológico que superestima a capacidade do salário mínimo como uma política de amparo as classes de baixa renda e de combate à pobreza. Aqui, os pressupostos são de que os salários são determinados pela oferta e demanda de mão-de-obra no interior do mercado de trabalho e de que a renda média do setor informal, e não a política governamental, determina a taxa de salários das atividades “formais” capitalistas.
Posições contrárias a essas hipóteses, onde destacamos o importante trabalho do Prof. Paulo Renato Costa Souza, “A determinação dos salários e do emprego nas economias atrasadas”, afirmam que o salário mínimo é uma referência, “um farol”, importante tanto para as grandes empresas como para os trabalhadores autônomos, pouco ou nada qualificados. Por um lado, observa-se que, em geral, as grandes empresas que formam o núcleo capitalista organizado, cumprem o salário mínimo vigente estabelecido pelo governo, enquanto que para os trabalhadores autônomos é uma referência na fixação dos preços de seus serviços. O que está colocado de forma subjacente, é que a determinação da taxa de salários nas economias capitalistas é dada pelos setores mais organizados, assim como a dinâmica econômica mais geral de determinação do emprego e da renda.
Partindo dessas ideias, podemos compreender como o processo de abertura do leque salarial a partir de 1964 é uma marca do mercado de trabalho no Brasil. Diante da passividade da política de salário mínimo, de sua diminuição em termos reais, alteramos para baixo os salários de base nos setores mais organizados e sinalizamos aos autônomos esse mesmo sentido. Não obstante, tendo o salário mínimo em queda, em muitos momentos, em particular nos períodos de crescimento mais acelerado no final dos anos 60 e durante os anos 70, os salários médios subiram. Esse é outro argumento quanto à perda de importância do salário mínimo na determinação da estrutura salarial, já que se afirma, novamente, o descolamento dos salários de base do salário mínimo. Contrariamente a essa posição, algumas reflexões sobre esse fenômeno, e aqui novamente destacamos as reflexões do Prof. Paulo Renato, afirmam que esse processo demonstra um dramático quadro de crescimento das desigualdades entre os rendimentos, já que se os salários de base caem em termos reais, o crescimento da média salarial ocorre puxado pelos salários médios e mais elevados, caracterizando um quadro evidente de abertura do leque salarial.
A partir do Plano Real, há um claro movimento de recuperação do poder de compra do salário mínimo no Brasil, mesmo com a economia brasileira crescendo lentamente durante os dois mandatos do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Num período de crescimento econômico mais robusto e de forte dinamismo do mercado de trabalho, essa recuperação acelerou-se sobremaneira ao longo dos mandados do Presidente Lula e depois da Presidente Dilma Roussef, com a definição clara de uma política de valorização do salário mínimo.
Uma melhora importante do salário mínimo neste período, mas o que significa tal valorização num país como o Brasil? Os dados do Relatório Global sobre Salários da OIT, ainda para o biênio 2010-2011 permitem termos ideia. Em 2011, em dólar, em paridade de poder de compra, tínhamos um salário mínimo no Brasil de 286 dólares. Isto significa dizer que tínhamos um salário mínimo que era 50% do salário mínimo paraguaio, 40% do venezuelano, 31% do argentino, 1/3 do espanhol e 22% do norte-americano. Significa dizer que com toda valorização do salário mínimo no Brasil desde 1995, ele entra pela segunda década dos anos 2000 ainda muito baixo. Melhorou, mas o que permanece como característica fundamental é que temos um mercado de trabalho estruturado em cima de baixos salários, onde o salário mínimo é a sua grande representação.
Diante de tais condições, o Governo do Presidente Michel Temer rompeu com a política de valorização do salário mínimo. Tomado pela desorientação do fundamentalismo fiscal expresso na abstrata tese da “austeridade”, o governo Federal determinou que o valor do reajuste do salário mínimo para 2017 ficará R$ 10 abaixo do previsto (R$ 979) pela Lei das Diretrizes orçamentárias – sancionada pelo próprio Presidente Temer .
Com essa decisão, se abandona uma valiosa oportunidade para perseguir a implementação de uma política pública que se mostrou eficaz desde meados dos anos 1990: a elevação do salário mínimo. Se perde, ademais, a chance de transferir mais recursos monetários a uma camada da população que possui graves carências materiais e alta propensão ao consumo: a massa trabalhadora desqualificada. Na presente catástrofe econômica, em que as empresas não estão dispostas a investir, desempregados se veem impossibilitados de consumir e as exportações estão longe de deslanchar, os estímulos ao crescimento econômico se encontram ausentes.
Em situações de profundo desalento econômico, como o cenário hodierno, o gasto público e a própria sustentação dos salários de base funcionam como estabilizadores automáticos da renda. Com efeito, o salário mínimo, delimita o piso remuneratório, apoiado em critérios de justiça social, retirando do espaço da concorrência empresarial a determinação de um valor mínimo para o trabalho.
Importa ter presente que o salário mínimo é uma intervenção pública deliberada no mercado de trabalho, cujo objetivo repousa em assegurar a todo trabalhador brasileiro um limite mínimo de renda. Trata-se de fixar um patamar para as negociações de compra e venda da força de trabalho no Brasil: um método eficaz para contrabalancear a profunda assimetria de poder existente no mercado de trabalho.
O gráfico abaixo, sobre a evolução do salário mínimo real e a taxa de desemprego nas regiões metropolitanas, demonstra o movimento de valorização que pôde ser observado nos anos 2000, até os dias atuais.
Observa-se que uma valorização significativa do salário mínimo nos anos 2000 ocorreu em concomitância com uma queda vigorosa da taxa de desemprego. Assim, é obrigatório salientar que não há, ao contrário do que alguns economistas sugerem, uma incompatibilidade entre a elevação do salário mínimo e baixos índices de desemprego. Em verdade, os dados e a literatura recente indicam justamente o contrário: a elevação do salário mínimo tem efeito sobre o nível de demanda por bens e serviços, o que representa um estímulo ao investimento e à geração de emprego. Ao mesmo tempo, o salário mínimo é um pilar da política social no Brasil, atuando também por esse lado, como estabilizador automático da renda e mecanismo de proteção social.
Por certo, uma política mais vigorosa de promoção dos salários de base e particularmente do salário mínimo, somente será sustentada com a retomada do crescimento econômico. Isso não depende do mercado de trabalho, tampouco do comportamento do salário mínimo. Portanto, reformas sobre o mercado de trabalho ou a contenção do salário mínimo em prol de um abstrato e inexequível “ajuste fiscal” por meio de corte de gastos, não trará o crescimento de volta, apenas aumentará o sofrimento dos brasileiros.
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