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sexta-feira, 28 de setembro de 2012

O papel do Direito na Economia

Olá alunos,

Segue hoje um pequeno, porém, excelente artigo a respeito novamente das interseções e relações entre as disciplinas Economia e Direito. Seria interessante que vocês lessem e participassem para a ocorrência de debates posteriores acerca desse assunto. O artigo tem autoria de Fábio Portela, um jurista, que entende e reconhece a importância da Economia para o exercício da sua profissão.


Yuri Antunes Moreira
Monitor da disciplina ''Economia Política e Direito'' da Universidade Federal Fluminense


As instituições legais estruturam o mundo econômico: elas dizem que determinadas estruturas são permitidas pelo sistema jurídico e quais são proibidas. Elas aumentam ou diminuem os custos de determinadas atividades, incentivando ou retirando o interesse de alguém praticá-la. Uma das maneiras pelas quais o direito regula a economia é por meio da tributação: o aumento ou a diminuição dos impostos leva a uma alteração no custo das atividades, incentivando ou desincentivando determinadas práticas. Nos últimos anos, por exemplo, o governo tem aumentado paulatinamente os impostos sobre cigarros, com o objetivo de desincentivar o tabagismo. Recentemente, a implementação do IOF de 2% para os investimentos estrangeiros em ações do Bovespa, teve o objetivo de incentivar a entrada de recursos de longo prazo no país, evitando as instabilidades de investidores que buscam apenas o lucro rápido. São os chamados efeitos “extrafiscais” dos tributos.

Mas há outras maneiras pelas quais o direito afeta a economia. O direito do trabalho e o direito previdenciário, por exemplo, ao atribuirem ao empregado determinados direitos, aumentam os custos para o empregador. Sem os direitos trabalhistas, provavelmente os empregados teriam salários menores – e os economistas argumentam que a taxa de desemprego seria menor, porque os empregadores teriam recursos para contratar mais empregados.

Nesse ponto, juristas e economistas divergem. 

Alguns economistas (como o já citado Peter Schiff) argumentam que no longo prazo os salários até aumentariam, porque o aumento da massa trabalhadora empregada levaria a um aumento no consumo, que por sua vez levaria a um aumento na produção, que exigiria cada vez mais trabalhadores, até um momento em que a demanda por empregados seria maior que sua oferta – elevando o salário dos trabalhadores.

Os juristas, por outro lado, afirmam que a garantia dos direitos trabalhistas é importante, porque somente com ela os salários foram de fato elevados, respeitando-se a dignidade do trabalhador. Argumentam com a história: antes dos movimentos trabalhistas do século XIX e do início do século XX, a condição de vida das massas trabalhadoras era péssima, justamente porque havia uma desigualdade de poderes entre empregados e empregadores: como os trabalhadores precisavam do emprego, aceitavam se sujeitar às condições de vida mais degradantes – o que era melhor do que ficar desempregado. Somente com os sindicatos e a negociação de direitos dos trabalhadores em melhor condição de barganha, além de uma legislação trabalhista que assegura direitos mínimos para os empregados, é que se tornou possível uma melhoria efetiva nas suas vidas.

Os dois lados têm bons argumentos, e acredito que a solução ideal pressupõe que ambos recuem um pouco suas posições clássicas: os economistas devem levar em consideração que, em países civilizados, os trabalhadores devem ter direitos mínimos assegurados; e os juristas devem levar em consideração os custos da regulação para as empresas. Sem que esses custos sejam levados em consideração, o sistema econômico encontrará alternativas externas à regulamentação jurídica. É por isso que muitas pessoas não pagam o INSS, empregadores contratam funcionários “sem carteira assinada” e muitos direitos trabalhistas não são respeitados.

Para evitar que isso aconteça, é preciso que a fiscalização do cumprimento das determinações legais seja mais eficiente, o que requer ainda mais recursos; e que a punição pelo descumprimento seja cada vez maior. Mas o próprio cumprimento das imposições legais pode gerar efeitos colaterais: os custos podem se tornar tão elevados que as empresas podem ter que reduzir o quadro de empregados para poder arcar com todos os custos inerentes à contratação.

As instituições também podem ser formuladas de modo a possibilitar que as pessoas ajam de maneira mais racional. Cass Sunstein , por exemplo, reconhece que os seres humanos têm limitações cognitivas que os fazem escolher opções “erradas” quando analisadas objetivamente. Por isso, ele propõe que as instituições devem ser desenhadas para que essas limitações não atrapalhem o processo de tomada de decisão: as instituições devem ser compreendidos como uma “arquitetura de escolhas”, que limitam as possibilidades de escolha para que as pessoas escolham opções boas.

Um exemplo do que ele sugere: uma das limitações cognitivas mais conhecidas dos seres humanos é o fato de as pessoas sobrevalorizarem o presente em relação ao futuro. Vários e vários testes mostram como as pessoas preferem receber R$ 10,00 hoje a R$ 15,00 daqui a 30 dias, mesmo com uma taxa de juros ganhos de 50%, maior do que os juros pagos no cheque especial. Alguns estudos mostram as origens evolutivas desse viés de nossa racionalidade. E é por isso que muita gente não consegue poupar uma parte do salário para usufruir no futuro, assegurando uma aposentadoria decente: as pessoas até querem poupar, mas esse viés é tão forte que faz com que elas não enxerguem qualquer racionalidade em poupar R$ 100 ou R$ 200 hoje para usufruir daqui a 30 anos. E R$ 200,00 mensais acumulados em 30 anos a uma taxa de 10% ao ano, com inflação anual de 4%, produziriam um valor acumulado de mais de R$ 200.000,00, o suficiente para gerar uma renda mensal real de R$ 2.000, já descontada a inflação (ou seja, seria o equivalente a R$ 2.000,00 hoje) – parece pouco, mas uma pessoa que ganhe R$ 1500,00 hoje e consiga fazer esse milagre de economizar R$ 200,00 mensais teria um acréscimo interessante em sua renda.

Sunstein sugere, então, que ao invés de sugerirmos à pessoa que poupe o dinheiro, estruturemos a sua escolha de tal maneira que, assim que o salário entre em sua conta, os R$ 100 ou R$ 200 sejam automaticamente aplicados em um investimento previamente definido. Algumas instituições nos EUA têm feito isso com sucesso: os investidores raramente têm sacado algum montante desse dinheiro (que é deixado à disponibilidade deles), deixando que os juros compostos façam o trabalho duro. Ou seja: uma pequeníssima mudança estrutural pode alterar a taxa de poupança das pessoas, tornando-as capazes de tomar decisões melhores, que não tomariam por conta de uma série de vieses que afetam nossa racionalidade.

Dessa forma, o direito pode ser utilizado como instrumento para que pessoas tomem decisões econômicas melhores, elevando o nível de eficiência do sistema econômico. É importante que os políticos tomem consciência dessas relações de reciprocidade entre economia e direito no momento de elaboração das políticas públicas.

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