Olá alunos,
Hoje trazemos uma notícia a respeito da irresponsabilidade das mineradoras brasileiras que, para atender uma maior demanda do mercado, terminam por realizar obras e empreendimentos precários e inseguros que resultam em desastres como o que aconteceu recentemente em Brumadinho (MG).
Esperamos que gostem e participem.
Lucas Pessoa é monitor da disciplina "Economia Política e Direito" na Universidade Federal Fluminense.
As grandes corporações, como a Vale, promoveram uma corrida para suprir principalmente a expectativa de demanda por minério de ferro da China, maior importadora mundial, para sustentar o crescimento espetacular do país na última década. “A China tem um papel fundamental nessa expansão, que acontece em dois níveis: na economia real e na economia especulativa. Ambas, juntas, estimulam a expansão mineral no Brasil. À medida que existe a expectativa de preços, que nas commodities são voláteis, as empresas têm grande pressa em expandir as suas minas ou abrir minas novas para aproveitar o período de bonança”, explica o pesquisador Bruno Milanez, especialista da Universidade Federal de Juiz de Fora na interação entre a mineração, a economia e o ambiente. “Muitas obras são feitas a toque de caixa e aumenta muito a pressão sobre os órgãos reguladores. Consequentemente, o que se espera é que as obras construídas durante essa etapa tendem a ter mais falhas.”
Modelo ineficaz
Além disso, nessa corrida contra o tempo, muitas mineradoras contraíram dívidas abissais e, quando os preços do minério caíam, os primeiros setores a sofrer cortes eram os de manutenção e segurança. Milanez ressalta que esse descuido foi “claramente” o que levou à tragédia na barragem de Fundão, em Bento Rodrigues, há três anos.
“Pela experiência latino-americana, é um modelo que não funciona, do ponto de vista de segurança, de desenvolvimento e até de crescimento econômico de longo prazo”, resume Milanez. “Há pesquisadores que trabalham com a hipótese de sairmos desse extrativismo irresponsável e irmos para o extrativismo do necessário. Seria buscarmos trabalhar em escalas menores, voltadas para as necessidades do consumo nacional e regional. Isso já diminuiria consideravelmente os impactos e riscos que estão associados à mineração.”
Enquanto o modelo de extrativismo intensivo permanecer, Milanez avalia que é “ingenuidade” esperar que as companhias adotarão procedimentos mais seguros, afinal são mais custosos. Cabe ao Estado fortalecer o licenciamento e a fiscalização para evitar novas tragédias.
Peso econômico da mineração
O x da questão é que, até hoje, governo após governo, o peso econômico sempre enterrou as preocupações socioambientais – a mineração representa 4% do PIB brasileiro e concentra 180 mil empregos diretos e 2,2 milhões indiretos. O setor fornece insumos para a metalurgia, petroquímica, fertilizantes e siderúrgicas e responde por 11% das exportações brasileiras.
É por isso que, na prática, o poder das mineradoras parece se sobrepor ao do Estado. O licenciamento acaba saindo antes da avaliação dos riscos, que é feita por contratados pela própria mineradora. A fiscalização é claramente insuficiente: um relatório de novembro da Agência Nacional de Águas indicou que, das mais de 24 mil barragens do país, 790 servem para a contenção de rejeitos da mineração, e apenas 3% tiveram uma vistoria adequada.
Impacto nos mercados
O impacto financeiro de tragédias como a de Brumadinho é relativo. Nos mercados, as ações da Vale despencaram, mas podem não tardar a se recuperar. André Perfeito, a economista-chefe da Necton Investimentos, avalia que o tamanho do prejuízo será proporcional à resposta do governo à tragédia: se houver rigor, a “punição” será maior.
“Se pegamos o exemplo da própria Vale, a ação chegou a cair mais de 50% depois de Mariana. E desde lá até quinta-feira, já tinha subido mais de 500%. Por isso, fica muito evidente que é mais uma questão de regulação, de multas, da atuação do Ibama. Ou seja, depende muito do governo”, afirma o analista. “Eu confesso que estou bastante curioso para ver como o governo Bolsonaro vai reagir a isso, já que eles se mostraram bastante indiferentes com a questão ambiental.”
Gestão de resíduos
No exterior, a tendência é encontrar soluções rentáveis para lidar com o problema dos resíduos da produção mineral, uma alternativa para limitar a necessidade de barragens. A redução ou a reciclagem dos rejeitos ainda é pouco utilizada no Brasil, apesar do potencial na construção, como para a fabricação de tijolos ou a pavimentação de estradas e calçadas.
A consultora em sustentabilidade estratégica e economia circular Beatriz Luz, fundadora da Exchange4Change Brasil, ressalta que a última tragédia obriga todo o setor a se repensar. “Tem um caso de uma mineradora canadense, a Teck, que virou a maior recicladora de resíduos eletroeletrônicos do país. Era a maior mineradora do Canadá e se tornou a maior recicladora”, conta a consultora. “Isso é uma mudança sistêmica: refletir sobre as suas matérias-primas, aplicar as suas habilidades em outro contexto e continuar crescendo de uma forma diferente.”
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